Opinião

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PT

Construindo o novo Brasil

Este texto era a base para uma tese da corrente Construindo um Novo Brasil. Ele estava sendo debatido quando o partido foi surpreendido pela crise de 2005. Os acontecimentos que se seguiram impediram que aquele debate fosse concluído. Sua publicação agora é em função da atualidade das questões que ele levanta e que poderão ser aproveitadas nas discussões que antecederão o PED de 2009.

Apresentação

O Campo Majoritário apresenta a sua Tese sobre “Estratégia e Programa do Partido”, visando contribuir para o debate no PED e no Encontro Nacional. Os temas e as abordagens aqui incluídos são escolhas políticas resultantes da busca de solução para os principais obstáculos ao desenvolvimento nacional e às necessidades de mudanças do país. Este texto, orientado pelos princípios e valores do PT, busca refletir e incorporar as principais lições extraídas da experiência maior de governar o Brasil nos dois primeiros anos de governo Lula e discutir os nossos objetivos estratégicos. A tese aborda também, as propostas de construção do partido com o objetivo de fortalecer a nossa constituição partidária e a organização da nossa base militante.

São Paulo, maio de 2005.

Desafios

O trabalho essencial de ajuste da economia brasileira que o governo Lula empreendeu, criou as bases para um novo padrão de desenvolvimento, que é a característica marcante e diferenciadora do governo de nosso partido em relação ao governo anterior e, de modo geral, aos governos pós-redemocratização. O novo modelo de desenvolvimento que adotamos se assenta sobre os seguintes pressupostos: crescimento econômico com geração de emprego, distribuição de renda e sustentabilidade ambiental; papel ativo do Estado na construção de um projeto estratégico de desenvolvimento do país; incremento dos setores produtivos intensivos em tecnologia, inovação e conhecimento; expansão e melhoria da qualidade de ensino; política externa e de comércio internacional ativas, visando expandir e consolidar a presença do Brasil no mundo globalizado; investimentos nos setores estratégicos da infra-estrutura e logística; destinação de crédito para os setores produtivos, principalmente para os pequenos e médios empreendimentos e para a agricultura familiar; busca de um novo marco regulatório submetido a mecanismos de controle social; e estabilidade econômica, com a busca do equilíbrio fiscal e da redução da dependência financeira do país, especialmente da redução da relação dívida/PIB. Implica novas relações de Estado com a sociedade e a inclusão econômica e social, com políticas e ações voltadas para atender as necessidades básicas do nosso povo e responder aos desafios da época de incertezas em que vivemos marcados por grandes desequilíbrios, fortes ameaças e, também, oportunidades de expansão do comércio e das relações econômicas internacionais.

O governo Lula foi eleito para viabilizar o desenvolvimento com geração de emprego e distribuição de renda, combinando estabilidade e crescimento. Foi eleito para combater a pobreza, diminuir as desigualdades e promover a inclusão social. Este é o sentido unificador das ações de governo nas diversas áreas de atuação e que o PT deve consolidar em seu programa partidário. O governo Lula está cumprindo o seu mandato, promovendo a inclusão, retomando o crescimento e realizando as diretrizes que determinaram sua vitória nas eleições. O sentido do governo Lula é a revolução pela cidadania, pela emancipação social, pela participação, pelos direitos e pela dignidade daqueles que não tiveram voz e vez na história do Brasil. É esta revolução social pacífica, fundada no ativismo e na participação, que está fazendo o Brasil mais justo, o povo mais forte, a economia sustentável e a nação mais solidária e soberana. Por isto, devemos defender as realizações do governo Lula de forma resoluta e convicta, conscientes das dificuldades e dos desafios, mas certos de que os objetivos do governo e do PT e seus aliados expressam as melhores potencialidades de desenvolvimento do nosso país, com justiça e equidade e bem-estar social para o nosso povo.

É preciso, agora, avançar com ousadia e responsabilidade. O processo de inclusão social e distribuição de renda – através do emprego, educação e políticas de geração de atividade e renda – não é um processo que deriva automaticamente do patamar já alcançar até agora. Este processo deve ser construído em conjunto com o processo de estabilização, com políticas que consolidem e façam avançar o novo modelo de desenvolvimento. Caso contrário, podem se cristalizar as relações atuais de poder, fortemente marcadas pela falta de coesão, estratificação social e concentração de renda, que poderão bloquear as conquistas sociais e o crescimento alcançado. Um processo de crescimento com emprego e renda também deriva de uma aliança clara com forças sociais e produtivas que tenham interesse no novo modelo, que certamente o capital financeiro não tem, já que ele ainda é um dos principais beneficiários das atuais circunstâncias. O novo modelo de desenvolvimento que precisamos consolidar deve ser capaz de superar o “apartheid” social e a estrutura de sociedade dividida em blocos sociais antagônicos de incluídos e excluídos, originários de um longo processo de crescimento excludente, de endividamento e decomposição das funções públicas do Estado.

Para cumprirmos a tarefa de avançar na formulação de um projeto de desenvolvimento temos de vencer os seguintes desafios: 1) aprofundar a compreensão da realidade brasileira, das potencialidades e limites que o país possui para se desenvolver; 2) melhorar o preparo de nossos quadros partidários e a qualidade das nossas propostas de políticas públicas, unificando a militância e a base partidária em torno de nosso projeto; 3) reafirmar os princípios e valores petistas construídos ao longo destes 25 anos, levando em conta nossos novos desafios de ser governo; 4) garantir a continuidade do processo de mudanças do Brasil para torná-lo um país desenvolvido, próspero e justo, seja por meio das ações de governo, seja por meio das lutas sociais e democráticas.

Se os desequilíbrios mundiais que apenas começam a agravar-se persistirem em seu curso, os próximos anos serão marcados por turbulências e incertezas ainda maiores que as de hoje. Existem, no presente, dois movimentos principais que estimulam as turbulências e incertezas: de um lado as ameaças à paz mundial, ao sistema de segurança coletiva e aos princípios do multilateralismo e do direito internacional, derivadas da nova configuração do poder mundial, com o domínio unipolar e sem contrapeso da potência hegemônica e o agravamento dos conflitos regionais, o conservadorismo de direita, a violência e o crime organizado em várias partes do mundo, a escalada das ações terroristas em nível mundial e as dificuldades de alternativas de esquerda; de outro, a ampliação e aprofundamento do processo de financeirização da economia mundial com a desregulamentação crescente dos processos e relações econômicas e a crise latente do dólar, a instabilidade dos mercados de petróleo, a elevação do preço das commodities, a forte oscilação do dólar, do euro e das demais moedas – fatores que atingem diretamente o Brasil – assim como a insegurança quanto à duração do desempenho da economia mundial, por causa de todos os desequilíbrios financeiros existentes e pelas alterações profundas no cenário internacional.

Em dez anos, cerca de 40% das exportações de produtos manufaturados deverão se originar de países em desenvolvimento. Atualmente, a china já exporta mais do que a França, Itália e Inglaterra. Da Ásia, parte praticamente o mesmo volume de exportações que da Europa. China e Índia investem pesado nas ciências aplicadas, educação e na formação de sua força-de-trabalho.

A hierarquia mundial sofre cada vez mais enorme impacto dos avanços da ciência e da tecnologia, que estão alterando padrões de produção, de comércio e de consumo e padrões sociais, institucionais e culturais. Estas rápidas mudanças estão exigindo agilidade nas decisões dos países que não quiserem ficar para trás.

Até que ponto o Brasil está preparado para encontrar respostas para essas questões? Até que ponto o PT está preparado para iniciar o debate sobre esses problemas, que já preocupam o nosso país e orientam escolhas futuras?

Com 25 anos de idade, ampla experiência no setor público e após dois anos no comando do governo federal, o partido está sendo convocado a desenvolver mais intensamente suas capacidades de governar e melhorar a qualidade de sua contribuição ao país. Só assim estará apto a congregar um sólido conjunto de forças, em torno de um projeto para o Brasil, para processar as mudanças que a sociedade espera. Só assim conseguirá opor-se de forma qualificada aos seus adversários políticos, que combatem o PT com intensidade redobrada. A complexidade dos desafios do Brasil, e dos nossos próprios, e a contundência da luta política nos obrigam a um maior preparo e a definições de estratégias na disputa por nossos objetivos para o país, que se projetem além das propostas de curto prazo ou soluções marcadas pelo calendário eleitoral.

O PT já consolidou bandeiras históricas que são marcas do partido, com destaque para as seguintes:

- direitos de cidadania, direitos humanos, políticas de gênero e de igualdade racial;

- ética na política;

- universalização da saúde, da educação e da seguridade social;

- reforma agrária, apoio à agricultura familiar e seguro agrícola;

- garantia dos direitos trabalhistas básicos, como férias, décimo terceiro salário, repouso semanal, fundo de garantia e licença maternidade; etc.

- liberdade e autonomia sindical, direito de greve, fim do imposto sindical, organização por local de trabalho e substituto processual nas relações de trabalho;

- defesa do substituto processual nas relações de trabalho;

- segurança pública e políticas especiais inclusivas;

- moradia popular, saneamento urbano, qualidade de vida nas cidades e preservação ambiental;

- programas de transferência de renda

- segurança alimentar e políticas distributivas de renda.

- defesa da democracia, da soberania e de um estado republicano;

- participação popular nas nossas administrações;

O grande desafio consiste, agora, em consolidar um projeto de desenvolvimento econômico social para o Brasil, capaz de integrar os vários aspectos e as várias frentes de atuação. Somos um partido da transformação!

PT: um partido democrático de esquerda e socialista

1.Ao completar 25 anos, o PT reafirma sua tradição de partido democrático de esquerda, que luta por um processo contínuo de reformas sociais e políticas, visando reduzir as desigualdades históricas que marcam a sociedade brasileira.  O principal compromisso do PT é democratizar o trabalho, a renda e a riqueza, o acesso a terra, o exercício do poder, o conhecimento, a informação e as oportunidades. O PT é produto de uma conjunção singular de lutas sociais e políticas dos trabalhadores por melhores condições de vida e liberdade sindical, pelas reivindicações dos movimentos sociais urbanos, pela reforma agrária, pelos direitos das mulheres e dos jovens, do movimento estudantil, pela afirmação de direitos das minorias, na resistência ao regime militar, na luta pela redemocratização do país, pela anistia, pelas diretas, pela Constituinte e pelo Impeachment. As convergências de movimentos sociais, de correntes de esquerda e de grupos religiosos ensejaram a consciência da necessidade de criação de um partido que expressasse a autonomia política dos trabalhadores e dos movimentos sociais.

O PT nasceu como partido democrático de esquerda, não só por lutar contra as desigualdades, mas também por definir o seu lado e a sua posição na defesa dos mais fracos, dos mais necessitados e dos trabalhadores.

2.Em conseqüência da sua origem e da história que o conformou, o PT compreende-se a si mesmo como um partido das lutas e dos movimentos sociais e democráticos, que, concomitantemente, define propostas para governar e reformar o Estado. O PT entende que o processo de aprofundamento da democracia comporta um duplo movimento: por um lado, a luta social e democrática da sociedade, instituidora de direitos, constitutiva da cidadania e organizadora do corpo social e político; por outro, a ação política no Estado, no sentido de garantir o bom governo, compreendida como o direcionamento dos recursos e das políticas públicas para atender as necessidades e prioridades sociais. E, ainda, como implementação de reformas que alarguem o caráter democrático das instituições e seu nível de transparência e as submetam ao controle público. A democracia, as reformas e as mudanças só avançam quando contam com a luta e a mobilização da sociedade civil. A relação do PT com as entidades e movimentos deve fundar-se no respeito mútuo da autonomia, no diálogo e na busca da construção de consensos progressivos, fundados em pautas e agendas de fins e objetivos comuns, capazes de recuperar a capacidade de mobilização da sociedade civil e dos movimentos sociais. Mas, ao buscar o poder como instrumento de governo e de transformação política e social, as ações do PT confluem também para aprimorar o caráter republicano e democrático do Estado.

3. Como associação voluntária de indivíduos que é, o PT se define como um ente coletivo. O ingresso no partido implica uma adesão aos estatutos, que expressam as normas, os direitos e os deveres, conformando as condições da conduta ética interna. Implica também uma adesão ao programa político do partido, do qual emanam as definições orientadas da atuação política prática dos filiados. Com isso, em termos de conduta partidária, o PT reafirma a primazia do coletivo sobre os indivíduos e as lideranças, sem que isto signifique a não existência de liberdade de pensamento e de opinião individuais. A unidade de ação e a disciplina partidárias, no entanto, são condições imprescindíveis para a existência do PT como instituição partidária efetiva.

4.Pelas condições de sua origem e pela consciência que o conformou, o PT nasceu, é e deverá continuar sendo um partido democrático e pluralista em termos doutrinários e de consciência, refutando o dogmatismo do pensamento único, afirmando a diversidade de opinião e a liberdade de escolhas individuais nos mais diversos âmbitos da vida. Ao postular-se como um partido de esquerda que luta por mais igualdade, o PT se declara herdeiro das melhores tradições do socialismo democrático. Reafirma suas resoluções históricas sobre o socialismo petista entendido, não como um ponto de chegada a uma sociedade determinada, mas como uma luta permanente por valores e pela construção de um novo tipo de relações sociais e econômicas, fundadas na solidariedade, na igualdade de oportunidades e na distribuição equitativa dos benefícios do progresso técnico. Ao sustentar os princípios da liberdade, da democracia e da igualdade como fins da sociedade, o PT se declara herdeiro também das melhores tradições do republicanismo.

5. Ao defender o republicanismo, o PT se propõe a estimular a participação dos indivíduos no processo de construção da sociedade buscando estabelecer uma ordem institucional mais democrática e transparente, aumentando o controle dos cidadãos e das cidadãs sobre os mecanismos decisórios da representação. Ao defender a ética na política, o PT se declara um partido que combate a corrupção de forma intransigente, pois identifica nela uma das fontes da degradação social, de injustiça e fator de violência. O PT entende que os princípios éticos e republicanos se traduzem em atitudes e condutas na vida pública que comportam:

• O dever de denunciar práticas corruptas na esfera pública;

• Transparência de práticas, atos e decisões no exercício do poder público e instituição de normas para garanti-la;

• Prestação de contas do uso de bens e recursos públicos e instituição de normas para garanti-la;

• Uso responsável de bens e recursos públicos, o que inclui, além de aspectos relativos ao equilíbrio fiscal, o atendimento eficiente das demandas sociais, principalmente dos segmentos menos favorecidos e a democratização da distribuição dos fundos públicos, impedindo sua apropriação particularista;

• Combate aos privilégios, inclusive pecuniários, agregados aos cargos políticos e administrativos em todos os poderes da República e luta pela instituição de regras claras de combate ao nepotismo.

• O PT entende, ainda, que o cultivo da democracia e do republicanismo implica a pressuposição de que servir ao bem público expressa um dever, o diálogo democrático com os agentes políticos, com os aliados e com a sociedade, gerando um ambiente de interlocução e de valorização da diversidade e o respeito para com os adversários,

• O controle social do Estado, aspecto fundamental do republicanismo, requer a formação de meios institucionais – pelo governo – para a intervenção organizada da sociedade, na produção do orçamento público. Este processo, no plano nacional, deve se dar de forma planejada.

II – O PT, As Reformas Democráticas e a Política de Alianças

6. O PT desempenhou um papel singular na história recente do Brasil ao participar das lutas democráticas, o que o habilita a exercer uma função de liderança nas tarefas de radicalizar a democracia através de reformas políticas e institucionais. O êxito deste processo, no entanto, depende do compartilhamento destas tarefas e funções com outras forças políticas e sociais. A representação política no Congresso Nacional deve estar sujeita a regras claras e estáveis, que fortaleçam as agremiações partidárias, evitando o desrespeito à vontade soberano do eleitorado, que fixa a força proporcional de cada partido. O PT deve negociar com as demais forças políticas um compromisso explícito de fortalecimento dos partidos e da representação parlamentar, expresso em exigências de fidelidade partidária, de financiamento público das campanhas eleitorais e de proporcionalidade na representação do eleitorado na Câmara e compromissos com programas e plataformas partidárias.

7. O PT reafirma suas bandeiras históricas relativas à necessidade de recuperação das prerrogativas legislativas do parlamento brasileiro, estabelecendo um verdadeiro equilíbrio republicano dos poderes. A modernização regimental das casas legislativas, com vistas a buscar maior eficácia no processo legislativo, o fim do instituto das convocações extraordinárias do Congresso e a redução do tempo de recesso parlamentar, são reformas modernizadoras e moralizadoras exigidas pela opinião pública, que o PT deve encaminhá-las e lutar para que sejam aprovadas.

8. A reforma política deve estar orientada para atender a dois objetivos: por um lado, fazer com que o sistema político ganhe em representatividade e legitimidade, expressando melhor os interesses e escolhas da população; de outro, reduzir drasticamente os custos das campanhas eleitorais e dificultar a corrupção política, combatendo o fisiologismo e práticas clientelistas e patrimonialistas que deformam o processo eleitoral e o funcionamento das instituições políticas.

9. O PT entende que faz parte também do rol de reformas democráticas o devido equacionamento e ajuste da questão dos cargos comissionados e de livre provimento em todos os níveis de poder. Um número excessivo destes cargos produz ineficiência e práticas fisiológicas no setor público e se traduz num impedimento da efetiva profissionalização dos servidores públicos. As diversas possibilidades de controle das funções públicas do Estado pela sociedade civil devem ser testadas imediatamente. Isso pode ser feito com a utilização progressiva de mecanismos de “consulta” em regiões definidas e limitadas e para as funções mais simples, bem como para avaliação permanente pela sociedade, do funcionamento e da qualidade do serviço dos “três poderes”.  Com isso, o governo poderá orientar as suas decisões que incidem na defesa do interesse público. Trata-se de pensar a reforma do Estado a partir da superação das barreiras burocráticas que separam o cidadão mais comum das questões do Estado e do governo.

10. As alianças e coalizões político-partidárias são processos normais que ocorrem em qualquer democracia. É preciso, no entanto, estabelecer uma compreensão dos diferentes níveis das alianças e coalizões. Antes de tudo, note-se que o caráter inorgânico dos partidos políticos brasileiros não favorece a formação de campos políticos definidos, fato que incide nas alianças, tornando-as muitas vezes incoerentes e incompreensíveis para a opinião pública. Nos seus diferentes níveis, as alianças partidárias podem articular-se em torno de vários objetivos como vencer eleições, governar e compartilhar um processo de construção de um projeto para o país. Em todos estes níveis o PT deve levar em conta critérios para formalizar alianças considerando o compromisso democrático e a conduta ética dos atores envolvidos.

11. O PT não será sujeito exclusivo na construção de projetos para as cidades, regiões e para o País. O PT só aperfeiçoará sua capacidade de dirigir processos se souber compartilhar, de forma democrática e pluralista, respeitando as diferenças de interlocutores e aliados, as tarefas de elaborar e as tarefas de governar. O sentido das alianças e coligações do PT deve orientar-se para a constituição de um bloco programático de forças democráticas e populares, da esquerda ao centro, com vistas a construir projetos comuns. Estas alianças devem pautar-se por objetivos de governo e pelos interesses legítimos dos atores envolvidos. Há que se reconhecer que, no Brasil, as alianças vêm se processando mais em torno de interesses e espaços do que em torno de projetos e programas. Na formalização de sua política de alianças, o PT deve evitar enfraquecer-se, por um lado, e isolar-se, por outro. O fator orientador da política de alianças para 2006 deverá consistir na criação das condições necessárias para garantir a reeleição do presidente Lula. Este processo deverá servir para consolidar uma maioria mais sólida melhorando as condições de governabilidade.

12. Como partido que defende incondicionalmente a diversidade da vida social e as liberdades civis, o PT luta pela abertura total dos arquivos da nossa história, em especial do período do regime militar, respeitando o dispositivo constitucional que coíbe a desclassificação dos poucos documentos sigilosos cuja divulgação possa comprometer a segurança da sociedade e do Estado. O PT entende que a defesa incondicional da democracia, do Estado de Direito e das liberdades individuais dá consistência à sua idéia-força de buscar o desenvolvimento nacional em todas as suas dimensões.

III O PT no governo federal: lições e perspectivas

13. A vitória de Lula em 2002 representou uma inflexão histórica no Brasil e no PT. Inflexão que modificou a agenda nacional de desenvolvimento e teve repercussões para além das nossas fronteiras. A questão social passou a fazer parte das prioridades do governo e a integrar a estratégia de desenvolvimento, após anos de prioridades quase que exclusivamente restritas à estabilização da economia. A agenda do desenvolvimento colocou-se no centro das preocupações e das ações do governo depois de anos de dificuldades e desencontros nesta área, que condenaram o Brasil a longos anos de baixo crescimento. O mundo passou a olhar com novos olhos para o Brasil, por conta da liderança do presidente Lula, do governo liderado pelo PT e de sua disposição de afirmar o combate mundial contra a fome e a pobreza, de dinamizar a cooperação Sul-Sul e de lutar por uma ordem mundial mais simétrica e inclusiva. O governo brasileiro passou a servir de fonte de inspiração para governos, partidos e movimentos simpatizantes em todo o mundo, redimensionando as referências para a reflexão da esquerda democrática mundial.

14. A vitória de 2002 ampliou muito as responsabilidades do PT. E, para atender a essas expectativas, o partido continuará a exercer seus compromissos e responsabilidades no governo e a dar total apoio ao presidente Lula no seu esforço de sustentar uma dinâmica duradoura de desenvolvimento econômico e social. Mas o PT deve ter sua esfera própria de debate, elaborações e afirmação de posições, que vai além do âmbito de um governo e de suas alianças. Equilibrar a autonomia do partido com as responsabilidades de direção de governo é um grande desafio, que vem sendo enfrentado com erros e acertos, mas com um sentido geral correto. Para sustentar a luta pelas reformas estruturais necessárias para diminuir as desigualdades e desenvolver o país, o PT buscará o apoio de todas as forças democráticas, receptivas e dispostas a participar da construção do projeto de Brasil que venceu as eleições de 2002.

15. No processo de aperfeiçoamento institucional que vem se processando no Brasil, que mescla continuidade e mudança, é inquestionável a marca do PT. Da primeira prefeitura em Diadema, em 1983, passando pelas demais administrações municipais, governos estaduais e casas legislativas, até chegar à Presidência da República em 2002, o PT mudou muito, sem abrir mão dos seus princípios e de seu compromisso com a defesa dos interesses populares e nacionais. Mas, como o Brasil, após dois anos e quatro meses de governo Lula, o PT mudou para melhor. No seu duro aprendizado, o PT compreendeu que precisa aprofundar sua cultura de governo e que um governo forte e eficaz requer unidade de comando e de propósitos e solidariedade interministerial. Um governo forte e eficaz requer uma orientação programática definida, traduzida em prioridades e agendas de ação, definidoras de um rumo claro para o país.

16. O PT cresceu e amadureceu com sua experiência político-administrativa. Por orientação partidária, a busca de rigor e responsabilidade no trato dos recursos públicos sempre foi marca registrada dos governos do PT. Idêntico comportamento pautou o governo Lula, mesmo sabendo que, na maior parte das vezes, há um alto custo político associado a essas escolhas. O partido soube aprender que o descontrole da economia e das finanças públicas é sempre mias cruel com os pobres. Uma das principais lições tiradas de nossas experiências à frente do setor público refere-se à compreensão de que uma economia estável, sólida e dinâmica é condição essencial para que o Brasil invista fortemente em qualificação e capacitação de seu povo e na ampliação de seus direitos e na universalização de políticas sociais, como forma de combater a pobreza e as desigualdades.

17. Ao longo dos últimos 25 anos o PT inspirou-se na idéia-força da transformação da sociedade brasileira retirando disto seu aprendizado e sua própria transformação. O PT sempre deixou claro que está em movimento, não parou no tempo e não tem medo de mudar, nem de reconhecer seus erros, pois nunca concebeu o seu programa como cláusula pétrea. O PT deve mudar sem mudar de lado.

IV – O PT e a economia

18. Para construir um modelo de desenvolvimento sustentável capaz de diminuir as desigualdades sociais, objetivo central do governo do PT, é preciso viabilizar uma economia sólida, capaz de sustentar uma sociedade progressivamente mais justa para todos. Falar em solidez econômica significa orientar, sem falsas oposições, nossa produção para a exportação e para o mercado interno, integrar e desenvolver nossa base produtiva e nossa capacidade tecnológica, superar os gargalos e vulnerabilidades estruturais da economia, ampliar e qualificar o mercado de trabalho e estabelecer um novo padrão de inclusão econômica e social. Este conceito de solidez econômica supera os limites que aprisionam o Brasil sob o governo anterior. A experiência de enfrentar e superar a crise econômica no primeiro semestre de 2003 foi decisiva para abrir a discussão quanto ao caminho a trilhar. O sentido geral das decisões tomadas, no fundamental, foi correto e seus efeitos foram sentidos em 2004. Nos anos 80 e no início dos anos 90, as restrições ao financiamento externo da economia agravaram a crise fiscal, com a concomitante aceleração e posterior descontrole do processo inflacionário. O imposto inflacionário mostrou sua face cruel com os mais pobres, estabelecendo decorrências regressivas que pioraram a já péssima distribuição de renda, desorganizando a atividade econômica, produzindo resultados negativos sobre os investimentos e sobre o crescimento de longo prazo. As políticas de abertura, privatização e desregulamentação da economia, implementadas durante os anos 90 não modificaram esse quadro.

Com efeito, durante oito anos no comando do país, contando com uma esmagadora maioria no Congresso e a cumplicidade do capital financeiro nacional e internacional, o governo Fernando Henrique Cardoso, com exceção da relativa estabilidade de preços – ainda assim sujeita a freqüentes sobressaltos -, não só não contribuiu ao progresso social como aprofundou as debilidades estruturais e restrições ao nosso desenvolvimento. Ao final de seus dois mandatos, o país tornou-se muito mais vulnerável e dependente do capital externo, com acentuada perda de autonomia na formulação e manejo de sua política econômica; nosso endividamento interno e externo se expandiu espetacularmente, sem nenhuma contrapartida relevante em termos de expansão da base produtiva nacional ou da criação de condições materiais para alavancar nosso crescimento futuro; o sistema produtivo regrediu em termos da integração e complementação de suas cadeias setoriais e intersetoriais e de sua capacidade de geração de empregos; a formação bruta de capital e, em particular, o investimento público reduziram-se significativamente, com o que se acumularam atrasos notáveis na infraestrutura energética e logística; muitas empresas privadas sofreram sérios desequilíbrios patrimoniais, decorrentes do aumento do seu endividamento no exterior e da instabilidade inerente ao mercado financeiro desregulado e globalizado; o Estado foi financeira e institucionalmente desestruturado, limitando-se extraordinariamente sua capacidade de exercer sua autoridade político-institucional e coordenar e articular os interesses dos diversos setores da sociedade; a privatização de grande parte do patrimônio público não significou, na maioria dos casos, melhoramento dos serviços ou da capacidade instalada e, junto com a aquisição de um número significativo de empresas privadas nacionais por parte de grupos estrangeiros, aprofundou o processo de desnacionalização da economia brasileira. O equilíbrio dos preços internos foi obtido à custa da criação de fortes tensões inflacionárias em outras dimensões da economia, particularmente nos seus equilíbrios externo e interno.

19. No centro desse processo está a dependência e subordinação que se estabelece entre os mercados financeiros – daqui e de fora - e a estabilidade econômica, que é um conceito mais abrangente que a estabilidade dos preços internos, expressa nos índices de inflação. A capacidade dos agentes financeiros de desestabilizar a economia – dada sua vulnerabilidade e a liberdade irrestrita de movimentação do capital – pende permanentemente, como uma espada de Dâmocles, sobre o país, condicionando as decisões de política econômica em suas diversas esferas.

20. Foi dentro desse quadro de crise estrutural, de ameaça de desagregação da economia e de enormes restrições externas e financeiras que o presidente Lula assumiu a administração do país. Embora com um raio de manobra reduzido, o novo governo, paralelamente à implantação de um padrão de política cambial e fiscal voltado para o restabelecimento dos equilíbrios macroeconômicos, elevou notavelmente as exportações – 59,7% acumulados em 2003/4, o melhor resultado desde o triênio 1972/74 – obtendo superávits comerciais recordes e revertendo o déficit das transações correntes do balanço de pagamentos (em 2004 o superávit dessa rubrica foi de US$ 11,7 bilhões). A política macroeconômica adotada permitiu estabilizar em 2003 e reduzir em 2004 a relação dívida/PIB (de 55,5% em dezembro de 2002 para 51,8% em dezembro de 2004), aumentou para US$27,5 bilhões as reservas líquidas e diminuiu o peso dos títulos cambiais na dívida pública, hoje, incluindo os swaps, em torno a 9,3% do total, contra 33,5% em dezembro de 2002. A inflação estabilizou-se (a média anual do IPCA caiu de 12,3% em 2002 para 7,6% em 2004) e, após um período recessivo inicial, a economia retornou o crescimento – 5,2% em 2004 – apoiada no dinamismo das exportações, nos efeitos internos do aumento da renda agrícola e do crédito popular e na expansão dos setores de bens de consumo durável e de capital. A indústria teve um crescimento de 8,3%, o maior desde o Plano Cruzado, em 1986. O desemprego aberto caiu abaixo de dois dígitos, fechando 2004 em 9,6% (a taxa média de 2002 foi superior a 12%), cresceu o emprego formal, com a criação de 2,1 milhões de novos postos de trabalho no biênio, e o rendimento dos trabalhadores aumentou, interrompendo uma tendência que vinha se acentuando desde fins de 1997. O sistema de financiamento interno foi fortalecido, com a recuperação do BNDES como banco de desenvolvimento e a ampliação do acesso ao crédito mediante diversos mecanismos (micro-crédito, crédito aos aposentados, à agricultura familiar etc).

21. Um ponto a ser realçado nessa experiência é que o crescimento econômico e a busca gradual do equilíbrio fiscal são peças complementares e estratégicas para arrumar uma economia altamente endividada como a brasileira. A busca do crescimento sustentado, com recuperação do emprego e distribuição de renda, objetivo central do programa do partido, não é incompatível e excludente com a busca do equilíbrio fiscal. Pelo contrário, no governo petista, o crescimento econômico pode e deve potencializar o equilíbrio fiscal. A gestão do equilíbrio fiscal e a execução orçamentária devem ser criativos e competentes para viabilizar as propriedades de governo.

22. Nosso governo teve de realizar um forte ajuste das contas públicas e adotou uma política eficaz de controle da inflação. Além disso, o governo desenvolveu uma política de crédito inclusiva, que também ajuda a explicar os excelentes números da economia em 2004. Não há paralelo, no passado, às seguintes medidas e resultados colhidos:

• O crédito consignado, com desconto de prestações em folha de salários, carreou R$ 12 bilhões para a economia em 2004. Isso possibilitou que trabalhadores e aposentados passassem a pagar metade dos juros que pagavam havia dois anos e 40% menos do que as taxas do crédito pessoal;

• O microcrédito, com juros limitados a 2% ao mês, possibilitou a realização de 4,4 milhões de operações, com empréstimos de R$1,6 bilhão a milhões de brasileiros entre agosto de 2003 e fevereiro de 2004;

• A inclusão, até 28 de fevereiro de 2005, de 5,1 milhões de brasileiros nos serviços bancários, com a abertura de contas simplificadas, particularmente nos bancos públicos, num movimento de bancarização que ajuda a defender milhões de brasileiros da agiotagem;

• Os recursos destinados ao Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf) aumentaram 100% em 2003 e outros 100% em 2004, contribuindo para a manutenção do pequeno agricultor no campo, ao dispor de financiamento e melhores condições de assistência técnica. Pela primeira vez o Brasil tem uma política de Seguro Agrícola para os pequenos produtores e para a agricultura familiar. Os recursos nos assentamentos aumentaram de R$ 7,7 mil por família, em 2003, para R$ 16 mil em 2004, melhorando a qualidade e as condições de vida para os assentados. Cerca de 70% do total de assentados foram atendidos com serviços de assistência técnica e extensão rural.

23. Devemos fazer, com serenidade, espírito crítico e argumentos, a defesa das políticas do nosso governo, que seguem em linha com os termos da Carta ao Povo Brasileiro e do Programa de Governo. O partido deve dialogar com o conjunto do nosso governo e com a sociedade no sentido de realçar a visão de que o desenvolvimento e o bem-estar social implicam mais do que apenas crescimento econômico. O desenvolvimento implica um conjunto ordenado de políticas afirmativas nos campos da macro e microeconomia; da estruturação de um Estado regulador e forte; e de políticas sociais eficientes e universais e garantia de investimentos em infra-estrutura e nos projetos de desenvolvimento regional. É sob esta ótica que devemos olhar em detalhe o ordenamento do gasto público, ante os que apontam gastança no governo. Pois,

• uma parte foi aplicada em contratações indispensáveis para a melhor e mais eficiente atuação do Estado. A visão do PT é a de um Estado planejador, regulador e indutor da economia, para o que é indispensável dispor de capacidade técnica. Parte dos gastos se explicam pelos investimentos feitos no reaparelhamento de ministérios e órgãos que estavam deteriorados. Contra o Estado terceirizado/privatizado do governo anterior, o governo do PT restaurou o Estado público, republicano, fundado no concurso do mérito e da impessoalidade;

• outra parte dos gastos reflete a opção política do governo Lula de enfatizar as políticas sociais, por meio do Programa Bolsa Família. A visão que o partido deve ajudar o governo a desenvolver, nesse terreno, é que esta política social é fator indispensável para a inclusão econômica, constituindo-se num elemento indutor da capacidade das famílias pobres de gerarem a sua própria renda;

• uma terceira parte do gasto, expressa em custeio da máquina, aumentos e contratações, pode e deve ser objeto de análise permanente da administração federal, com vista a evitar desperdícios, sobreposições de funções e perda de eficiências. Este é um problema administrativo constante que precisa e pode ser equacionado com a melhoria dos sistemas de gestão, já iniciada do governo federal. O avanço que o governo Lula já consignou neste terreno desmente categoricamente os adversários do PT. No período de 2001 e 2002, o gasto com terceirização foi de 0,13% do PIB. Já no período de 2003 e 2004 foi de 0,12 % do PIB. Tomados os dois períodos e comparados os dois governos, a despesa total atualizada pela inflação foi de 1,91% menor sob o governo Lula. Os gastos com funcionalismo nos mesmos períodos, sob o governo FHC, foram de cerca de R$ 96 bilhões e sob o governo Lula foram de cerca de R$ 74,1 bilhões.

24. A bem-sucedida recuperação econômica empreendida pelo Governo Lula evitou que o país quebrasse, como na crise cambial de 1999, ou praticamente parasse, como na crise energética de 2001. Também foi chave para a retomada do crescimento, o retorno dos empregos e o início da recuperação da renda dos trabalhadores. Sem um comando resoluto do presidente da República, a condução da economia, mais uma vez, não teria resistido às adversidades e conflitos. Nesses dois anos de governo, o presidente Lula deixou patente que a sua liderança, mais do que um ativo partidário, tornou-se um fator de agregação nacional. Para evitar estrangulamentos futuros, cabe agora, no entanto, garantir os investimentos necessários à modernização e ampliação da infra-estrutura, viabilizando os projetos de Parceria Público Privada (PPPs) que, inclusive contam agora com recursos em um fundo legal. É preciso garantir também a execução dos projetos especiais como a transposição do Rio São Francisco, a Transnordestina, o PAS (Projeto Amazônia Sustentável) e as iniciativas de investimento da Petrobrás.

25. Para o PT, a responsabilidade com o dinheiro público não atende a critérios de moralidade no trato desses recursos, mas também à lógica do equilíbrio orçamentário e fiscal e do balanço de pagamentos que, com a redução paulatina do endividamento externo e interno, alicerça a existência de uma moeda nacional com um mínimo de credibilidade, protegida da erosão inflacionária. A atitude responsável para com as contas públicas é condição indispensável para a qualificação, a sustentabilidade e a continuidade dos investimentos do governo. Sem a garantia da estabilidade como pressuposto, dificilmente conseguiremos financiar nosso desenvolvimento, atrair investimentos que complementem o esforço interno de expansão da capacidade produtiva e concentrar energias para revolucionar nossa educação, avançar na saúde e nos programas orientados para a redução da pobreza e das desigualdades sociais. Por outro lado, o crescimento econômico é indispensável para que a estabilidade monetária e o equilíbrio nas contas públicas possam se manter, no longo prazo. Por isto, é necessário que o regime de metas de inflação leve em conta os impactos externos e para funcionar de modo estratégico, visando a dosagem correta entre incremento da atividade econômica e equilíbrio fiscal e monetário, e não de forma apenas tática, visando a estabilidade monetária de curto prazo.

26. O país precisa persistir no rumo do saneamento da economia, garantir a sustentabilidade do crescimento, a geração de empregos, a recuperação e a distribuição da renda, aumentar a competitividade das nossas empresas, melhorar nossos sistemas de regulação e todo o ambiente de negócios. Uma plataforma desse tipo permitirá ao país superar os espasmos de crescimento, distanciar-se das recessões e reduzir sua vulnerabilidade externa. Evidentemente, intenções futuras são condicionadas também pela administração econômica de curto prazo. Assim, o partido deve observar ao governo que, a par da administração fiscal consistente, deve-se buscar o caminho progressivo do alívio da política monetária, ampliando todos os espaços possíveis ao impulso da economia. Mesmo que não haja receitas prontas nesse terreno, deve-se sempre buscar um equilíbrio adequado entre os instrumentos fiscal e monetário, de modo que todo o potencial de crescimento da economia brasileira se realize. Afinal de contas, a experiência tem demonstrado que não apenas a estabilidade, mas que o próprio crescimento é um fator fundamental de atração de novos investimentos. Para garantir o crescimento é indispensável, porém, que haja, no governo e no partido, uma referência comum consistente, para orientar a implementação das políticas. Está claro, por exemplo, que cabe ao governo recuperar progressivamente a capacidade de investimento público. A retomada da capacidade de investimento público, junto com a busca de um ordenamento tributário total sobre a sociedade, são fundamentais para a dinamização do desenvolvimento do país. A redução do endividamento público é essencial – assim como a redução da taxa de juros – de modo que o investimento privado se intensifique, acelerando a expansão da economia.

27. Desequilíbrios econômicos se acumularam ao longo do tempo e as dificuldades de sua resolução têm levado sucessivos governos a não enfrentá-los com a coragem necessária. O resultado é que, a cada adiamento, a conta a ser paga pela população, tanto financeira quanto política, aumenta. Os desequilíbrios atuais nas contas do sistema previdenciário, por exemplo, obedecem a alguns fatores que fazem da ossatura da sociedade, dentre os quais se destacam: elevada informalidade; regras de aposentadoria que não observam o fenômeno do aumento da expectativa de vida, e problemas de gestão e controle. O governo deu um primeiro passo importante ao promover a reforma da Previdência, que combateu privilégios e patrocinou inclusão. Agora a questão central consiste na execução de medidas de combate às fraudes e sonegação, a adoção de mecanismos que produzam uma crescente formalização do trabalho e o aperfeiçoamento da gestão, inclusive com a diminuição das filas do INSS. A sociedade, por sua vez, deve, legitimamente, decidir sobre o sistema de proteção que deseja e pode sustentar.

28. Em grande parte, a disposição da sociedade sobre o grau de proteção que deseja estabelecer está ligada à dimensão que quer e pode dar ao prosseguimento da reforma tributária. É certo que sem uma repactuação entre os entes federativos não haverá reforma tributária de peso no país. Mas também é verdade que o Governo não será capaz de dar conta da nova dinâmica da economia que toma forma no Brasil sem incentivar a produção e reduzir a carga total para níveis mais aceitáveis. A forma de atingir esse objetivo é designar metas de redução de carga correspondentes a medidas de controle e racionalização de gastos e do êxito no combate à sonegação. Nosso governo se comprometeu e vem cumprindo o compromisso de não elevar a carga tributária acima do que a registrada em 2002. Mas, além disso, deve buscar a redução da mesma ante o nível de 2002, uma vez aprovada a PEC da reforma tributária no Congresso Nacional. A solução de parte dos problemas ligados ao financiamento da Previdência e da necessidade de redução da carga tributária exige, também, a redução do alto grau de informalidade de empresas e de relações de trabalho.

V – O papel do Estado no desenvolvimento

29. Historicamente, no Brasil, o Estado esteve a serviço da acumulação das elites, escolhendo, nem sempre com critérios democráticos, os setores que deveriam ser privilegiados com subsídios e incentivos. Por isso, em vários períodos, gerou-se crescimento sem distribuição de renda e sem redução da pobreza. O grande desafio, nos marcos do novo modelo de desenvolvimento, consiste em definir a capacidade do Estado de orientar a realização do crescimento sustentado, com distribuição de renda, geração de emprego e democratização da riqueza. O Estado neoliberal criou várias áreas de ingovernabilidade. As mudanças dos processos produtivos, as novas tecnologias e as novas dinâmicas sociais exigem a redefinição do papel do Estado em suas várias frentes de atuação, inclusive no desenvolvimento. Mas o Estado mantém ainda o papel de agente econômico direto nos setores em que participam empresas estatais. Em várias outras áreas e funções, o Estado precisa compartilhar ações e decisões com outros atores. O Estado não pode mais ser visto como redentor, nem como o vilão que deve ser afastado de qualquer atividade relevante na economia. As mudanças estruturais do país e do mundo não nos permitem mais acreditar que as imensas e abundantes falhas de mercado só podem ser sanadas por meio de um retorno às praticas excessivamente intervencionistas que marcaram a atuação do Estado nos anos 50, 60 e 70. Por outro lado, na esteira das desilusões dos anos 90, proporcionadas pelo neoliberalismo, estão o baixo crescimento da economia, a contração dos empregos, o agravamento da dependência e da vulnerabilidade externa e o tolhimento e a corrosão da capacidade estruturante do Estado.  Temos de reconhecer que o Brasil precisa incentivar e valorizar o investimento privado, facilitar e regular o funcionamento dos mercados, apoiar e promover a presença de empresas e produtos brasileiros nos mercados externos e buscar a garantia de oportunidades para todos. Porém, para que os agentes privados trabalhem nos marcos dados pelos valores e aspirações da própria sociedade, sua ação deve estar enraizada em um terreno preparado por uma atuação estratégica do Estado. A democratização e a defesa dos direitos de propriedade, sua função social, as reformas microeconômicas para melhorar a capacidade produtiva, o combate a violência e ao crime organizado, a geração de empregos, a melhoria do ambiente de negócios, a ampliação e o fortalecimento de um sistema de proteção do trabalho e a estabilidade macroeconômica precisam equilibrar-se através de ações orientadas por uma forte regulação estatal, a partir de uma estrutura institucional capaz de normatizar e garantir a vida democrática da sociedade.

30.  As escolhas feitas pelos governos anteriores pela desestatização, além de fortes desajustes, falharam em produzir o dinamismo necessário para colocar o país nos trilhos do crescimento duradouro. O desafio para o PT é teórico e prático, e diz respeito ao estabelecimento de um processo de construção de uma nova e virtuosa sinergia entre Estado e sociedade na construção de um novo projeto de desenvolvimento para o país. É preciso perceber que na democracia a construção de um projeto de desenvolvimento é processual e implica um aperfeiçoamento continuado das instituições do país e uma nova combinação entre forças de mercado e o Estado. O debate sobre as agências reguladoras, nesse sentido, é exemplar dessa discussão.

31. Por serem entes públicos, as agências devem ser autônomas, mas não independentes o que significa que precisam ser submetidas ao controle público. A atribuição de autonomia está ligada a uma perspectiva de longo prazo do Estado, que delega às agências a tarefa de garantir o desenvolvimento e os investimentos necessários para a expansão dos bens e serviços. Para evitar que setores chave da economia sejam desequilibrados por decisões imediatistas ou por pressões eleitorais, geralmente alheias ao interesse público, a experiência tem mostrado a adequação de dotar de autonomia um corpo de dirigentes com mandato capaz de garantir a execução dos objetivos de longo prazo fixados pelo governo e de zelar pelos contratos assinados entre o setor público e os agentes privados. O conceito de autonomia, no entanto, tal como está equacionado no projeto do governo que redefine o papel das agências reguladoras, não isenta os dirigentes das agências de responderem ao controle público pelos seus atos. Essa é a engenharia das instituições públicas que mescla o poder governamental de fixar metas com a existência de um corpo de especialistas voltado para perseguir esses objetivos públicos e zelar pelo cumprimento dos contratos, submetidos a um regime de responsabilidade e de controle público. Ao dotar as agências reguladoras de autonomia, o Governo sinaliza claramente para a estabilidade das regras econômicas, fundamental para o desenvolvimento do país e garantia dos direitos dos consumidores e usuários de serviços essenciais. O PT, contudo, deve aprimorar sua visão sobre a função reguladora do Estado, já que muitos dos seus aspectos carecem ainda de suporte jurídico. As empresas estatais, por exemplo, devem ter um maior controle da sociedade na sua gestão. Na política de regulação, o PT deve apoiar-se em dois princípios: defesa do interesse público e regulação com controle social.

32. Quanto ao papel de indutor do desenvolvimento, o principal desafio do Estado brasileiro consiste em viabilizar uma eficaz Política Nacional de desenvolvimento Regional, cujos pressupostos básicos estão no programa da candidatura Lula à Presidência. A superação das desigualdades regionais e interregionais requer a definição deu um modelo de desenvolvimento capaz de integrar as especificidades locais e regionais com um projeto nacional, estabelecendo: 1) complementaridade de ações, otimização de capacidades produtivas locais, apoio à articulação de cadeias produtivas locais e regionais e a estruturação de novas cadeias produtivas; 2) interligação dos mercados regionais e intensificação dos seus intercâmbios comerciais e de fluxos de turismo, feiras e negócios; 3) interligação dos municípios e das regiões com logística e infra-estrutura como transportes, energia, comunicações, políticas ambientais, de saneamento e de gestão de recursos híbridos; 4) interligação de municípios e regiões nas suas estruturas de serviços como rede hospitalar, sistema de ensino, políticas de segurança, transporte público etc. A estratégia de desenvolvimento local e regional deve fazer interagir as três esferas da federação – União, Estados e Municípios – buscando a auto-sustentabilidade, a maximização do conteúdo local da produção, o estímulo ao empreendedorismo e a diversificação e a competição cooperativa. Essa estratégia nacional de desenvolvimento local e regional deve buscar a integração das regiões, principalmente aquelas com níveis baixos de desenvolvimento, ao âmbito da economia nacional e ao mundo globalizado. Para isto, o governo deve reforçar e traduzir em resultados o trabalho do Conselho de Políticas Regionais e criar uma nova institucionalidade capaz de dar conta dos desafios da estratégia da política nacional de desenvolvimento regional. Torna-se necessário também remover os bloqueios dessa estratégia, tais como a guerra fiscal, a concentração do acesso à ciência e a tecnologia, a concentração dos recursos públicos destinados ao investimento e à infra-estrutura e de outros fundos públicos.

VI - O Brasil, o desenvolvimento tecnológico e a sociedade de conhecimento

33. O conhecimento, as novas tecnologias e a inovação produtiva constituem o principal fator de produção de riqueza, renda e prosperidade das sociedades contemporâneas. O governo Lula reconhece a importância estratégia deste fator, agindo em três frentes: a aprovação das diretrizes para uma Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), a aprovação da lei de inovação e a reforma da educação. Estas três frentes constituem vértices estratégicos do novo modelo de desenvolvimento que está sendo implementado pelo governo petista. A aprovação da PITCE foi um primeiro e importante passo para qualificar ainda mais nossa capacidade produtiva, diferenciar nossas exportações e ampliar a malha de países para os quais exportamos. A PITCE representou a construção de uma política contemporânea, orientada para uma colaboração estratégica entre o setor privado e o Estado, na busca de oportunidades que levem a superar obstáculos ao desenvolvimento da produção. Foi com esse espírito que o governo inovou e propôs a constituição do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial, voltado para a discussão das estratégias industriais entre governo, empresários e trabalhadores, e da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, destinada a articular a execução da política industrial.

34. O forte desta política reside na ênfase nos processos de inovação, de modo a favorecer a consolidação de uma nova cultura, mais adequada a um novo empresariado. Nas condições brasileiras, para sustentar um ciclo longo de crescimento, será preciso que a inovação se espalhe por todo o sistema produtivo, ajudando a empurrar a estrutura salarial para cima.

35. O Brasil só abrirá efetivamente os caminhos para o ingresso pleno na sociedade de conhecimento se, junto com a política industrial, tecnologia e de inovação, for capaz de processar uma revolução na educação que vá muito além da mera expansão de vagas nas escolas. O governo do PT deve apoiar, impulsionar e defender as políticas públicas orientadas para as atividades e processos intensivos em conhecimento e expansivos do ponto de vista da abrangência dos diversos grupos sociais. O investimento na educação e na qualificação das pessoas é chave para o futuro do país, tanto para a requalificação do nosso sistema produtivo como para a diminuição de desigualdades e capacitação dos cidadãos e cidadãs para aproveitar as oportunidades. O investimento em educação é praticamente uma unanimidade. Porém, para desenvolvê-los na dimensão que necessitamos, seria oportuno deflagrar um processo de mobilização social, envolvendo tanto os educadores, em todos os níveis, quanto à sociedade e suas representações, bem como os governos estaduais e municipais, em busca do país que queremos e podemos construir.

36. Educação de qualidade é muito mais do que salário, recurso essencial. Significa também destacar as questões de mérito nos processo de avaliação, realçando a aprendizagem, a capacitação de professores e o envolvimento de pais e das comunidades, com todas as atenções voltadas para o aluno. Os currículos de nossas escolas precisam ser repensados e concentrados nas disciplinas-guia do século XXI: as matemáticas, ciências, português, línguas estrangeiras (com destaque para o inglês e o espanhol) e história. Na atual fase do desenvolvimento nacional, a ênfase primordial no ensino fundamental e médio é chave para que o Brasil não desperdice a inteligência de nossas crianças e adolescentes, criando uma alternativa real para que se distanciem do caminho da violência e das drogas, que os afeta especialmente nas periferias das maiores cidades. Neste contexto, é importante que se viabilize a proposta de instituição do FUNDEB, elaborada pelo MEC. A ênfase no ensino fundamental e médio, no entanto, não exime o governo da responsabilidade de qualificar e ampliar o ensino superior, a exemplo do que vem fazendo com o projeto de Reforma Universitária, que é inclusiva e democratiza o acesso à universidade, como o Programa Universidade Para todos, a contratação de seis mil professores até o final de 2006, a criação de quatorze novos campi, campi avançados e Universidades Públicas, o que pode significar cerca de quarenta mil novas vagas na Universidade Pública até o final de 2006.

37. No mesmo impulso, as políticas de estímulo à Ciência, Tecnologia e Inovação só ganharão efetivamente se o país tiver coragem de promover uma verdadeira reviravolta cultural, tanto em suas empresas quanto nas universidades e centros de pesquisa. A atividade científica básica no Brasil, construída em décadas, é motivo de orgulho. Porém, sua relação com os processos tecnológicos e a transformação do conhecimento acumulado em novos produtos continua sendo nossa fraqueza histórica. O Brasil precisa investir pelo menos 2% do PIB ao ano em Ciência, Tecnologia e Inovação, nos próximos dez anos. Serão necessários, para tanto, recursos públicos e privados orientados para fazer do Brasil um centro de excelência tecnológica de padrão mundial, pelo menos naquelas áreas em que o país dispõe de vantagens comparativas naturais e naquelas que renovam a base de conhecimento e de negócios. Indispensável será para tanto, um equilíbrio mais adequado entre recursos públicos e privados empregados no sistema de CT&I. Do mesmo modo, precisam ser repensados os critérios de destinação dos recursos públicos, sob a forma de investimento ou de incentivo, para os campos da ciência básica e da tecnologia, para as universidades e para as empresas.

VII – Consolidar as políticas sociais como instrumentos de redução das desigualdades e de combate à pobreza

38. O Brasil não dará passos consistentes rumo ao desenvolvimento sustentado se este processo não tiver como um de seus eixos constitutivos o combate à desigualdade social, com politicas sociais adequadas e eficazes. O governo Lula está avançando muito nesta área, mas a gravidade do drama social brasileiro indica que os desafios ainda são enormes. O objetivo central das nossas políticas sociais deve consistir na emancipação dos cidadãos e cidadãs e das comunidades das condições de dependência. Deve consistir em que os indivíduos sejam integrados à economia, à sociedade, ao consumo e à cultura. Por isto, a nossa política social, além de ser solidária e distributiva, precisa ser qualificadora, estruturadora das capacidades das pessoas e das comunidades.

Ampliar e conferir mais qualidade e eficácia às políticas sociais universais como saúde e educação e às políticas distributivas, orientadas para grupos sociais específicos, a exemplo do programa Bolsa Família e do LOAS, é uma condicionante do desenvolvimento econômico e social do país. Foi importante trabalhar a unificação dos programas sociais no programa Bolsa Família. Isto representou uma mudança quantitativa e qualitativa importante. Qualitativa porque inaugura o fim das disputas entre ministérios e entre governos estaduais e municipais pela paternidade de programas sociais, dá inédita transparência à lista de beneficiados, e abre o cadastro para uso de planejamento de políticas públicas aos estados e municípios quebrando, a cláusula de sigilo contratual firmada pelo governo FHC com a CAIXA. Quantitativa porque aumenta o benefício médio da faixa dos R$ 20,00 para faixa dos R$ 70,00.

Os programas que representaram na média dos anos FHC 0,03% do PIB representam, na média do governo Lula, 0,26% do PIB um crescimento de 8,6 vezes em relação ao PIB. No ano de 2004, o Bolso Família já representava 0,31% do PIB atendendo 5,5 milhões de famílias. O compromisso o governo é atingir até 2006 todas as famílias que possuem renda per capita menor do que R$ 100,00, número atualmente estimado em 11 milhões de famílias. Em termos mais imediatos, cabe ao PT, também, defender a inclusão da linha relativa de pobreza no debate sobre as linhas oficiais de pobreza.

As oportunidades para a redução da pobreza e da fome estão intimamente ligadas à elevação da efetividade da política social brasileira. Apesar de todos os nossos problemas, o Brasil é um país de renda média, que está situado entre os 30% dos países mais ricos do mundo. O Brasil, no entanto, precisa fazer com que a infra-estrutura social e os programas sejam mais efetivos na redução da pobreza. A maior dificuldade no combate à pobreza e à fome tem sido o baixo crescimento da economia nos últimos 25 anos. Entretanto, mesmo sabendo que a pobreza brasileira vem resistindo a um enorme número de políticas, é importante registrar que ela diminuiu ao longo desse mesmo período, embora num ritmo frustrante.

A enorme desigualdade provoca um grande impacto sobre o crescimento econômico, reduzindo sua eficácia como instrumento de diminuição da pobreza. A questão da desigualdade, portanto, situa-se no centro de toda reflexão sobre desenvolvimento, uma vez que esta tem se mostrado resistente tanto às políticas sociais quanto ao crescimento da economia.

39.  A pobreza é um problema universal que afeta com intensidades distintas todas as regiões do país e do planeta. Se as iniciativas e os programas podem e devem ser gerais, o enfrentamento da pobreza, entretanto, deve ser travado também em escala local e de forma descentralizada. Assim, um dos grandes desafios para o governo federal é o de como desenhar a sua política social de forma flexível o suficiente para acomodar as especificidades locais. Para isso, a política social terá de se basear num alto grau de descentralização que envolva não apenas a operacionalização, mas também a definição de parâmetros e uma significativa participação das comunidades. O PT estimulará o debate sobre a criação de instrumentos voltados para garantir um atendimento personalizado as famílias pobres, de modo a aumenta a efetividade dos gastos sociais, quer adaptando melhor os programas as necessidades das famílias, quer explorando sinergias entre as ações do setor público. Desta forma, o PT enfrentará os preconceitos contra os pobres, pois, da mesma forma que se reconhece e se aceita investimentos para criar condições adequadas para os negócios, há que se reconhecer e aceitar investimentos para criar condições adequadas para a vida e a dignidade das pessoas.

40. É fundamental que o governo ponha em funcionamento um sistema de avaliação de programas sociais, necessário à aferição do impacto desses programas. A política social defendida pelo PT busca dar uma oportunidade para os pobres superarem sua condição de pobreza e, portanto, saírem dos programas sociais. Caso a eficácia relativa dos diversos programas fosse mapeada, seria possível rediscutir a alocação dos recursos disponíveis nos programas de maior impacto e, com isso aumentar a efetividade da política social. Além disso, ao identificar como o impacto varia de acordo com a natureza do benefício e do beneficiário, o governo pode reconhecer os programa, assim como precisar os beneficiários, de modo a otimizar sua eficácia.

41.  Melhorar a coordenação entre os três níveis de governo e com o setor privado e chave para o sucesso dos programas sociais, a começar pelo aprimoramento da coordenação entre programas federais, estaduais e municipais. A falta de coordenação entre as políticas dos três níveis de governo acaba por gerar sobreposições, concorrências e paralelismos que se traduzem em ineficiências e má distribuição dos recursos. Nesse sentido, o PT estimulará o debate para reavalizar os mecanismos de transferência de recursos da União para os estados e municípios. Essas transferências devem ser proporcionais aos graus de carência.

42. O programa Bolsa família constitui um dos principais instrumentos colocados em prática pelo governo Lula para o objetivo de erradicar a fome e a pobreza absoluta. Tem se expandido rapidamente e deverá alcançar 11,2 milhões de famílias em 2006, cerca de 45 milhões de pessoas – um quarto da população brasileira pertencente a famílias com renda mensal per capita de até R$ 100. O programa Bolsa Família se constitui no primeiro passo na direção da Renda Básica de Cidadania, que consistirá no direito de todas as pessoas no Brasil, independentemente da origem, praça, sexo, idade, condição civil ou sócio-econômica de participarem da riqueza da nação por meio de uma modesta renda, na medida do possível suficiente para atender às necessidades de cada um. Segundo a Lei 10.835, sancionada pelo presidente Lula, a Renda Básica de Cidadania será instituída gradualmente, a critério do Poder Executivo, priorizando os mais necessitados – como acontece com o Bolsa Família – até que todas as pessoas venham a receber. Será um dos maiores programas redistributivos, agregando as vantagens da redução da burocracia relacionada à viabilização dos programas redistributivos, agregando as vantagens da redução da burocracia relacionada à viabilização dos programas sociais.

43. A política econômica e as políticas sociais devem ser concebidas como fatores interdependentes de um mesmo projeto estratégico de desenvolvimento do país. Se é verdade que programas distributivos como o Bolsa Família tem dimensão compensatória por incidirem sobre as carências imediatas das pessoas pobres, tem também uma dimensão estruturante inegável, á medida em que estimulam a atividade econômica local, inclusive com a criação de empregos, e projetam nas crianças que vão a escola um futuro melhor que o da vida dos seus pais.

A superação da dependência, no entanto, será certamente menos provável num ambiente de violência e insegurança. O ambiente de violência não é propício à atividade econômica legal e regular. Por isso é necessário associar, aos programas sociais, políticas públicas de segurança, com a atuação eficiente da policia e o funcionamento dos tribunais, garantindo a aplicação da Lei, fazendo interagir de forma produtiva a inclusão econômica e a inclusão social. Neste contexto, é necessário implementar as diretrizes do Programa de Segurança da campanha de Lula à Presidência, que concebia um funcionamento adequado das instituições e a vigência efetiva do Estado de Direito. Na estratégia de viabilização do desenvolvimento sustentado, o PT deve conceber a política econômica orientada para finalidades sociais e deve conferir um sentido econômico às políticas sociais.

44. O governo Lula vem criando condições para que as políticas sociais sejam desenvolvidas com a participação da sociedade, visando construir estrategicamente sistemas nacionais de políticas públicas. A antecipação da 12ª Conferência Nacional de Saúde, que aconteceu em 2003 e deliberou realizar Conferências Temáticas de Saúde do Trabalhador, Gestão do Trabalho, Saúde Bucal e Ciência e Tecnologia em Saúde; a realização da Conferência Nacional de Assistência Social, visando a implantação do Sistema Único de Assistência Social no Brasil (SUAS); da conferência das Cidades, com a criação do primeiro Conselho Nacional das Cidades no país; da Conferência de Políticas para as Mulheres, com a aprovação dos principais eixos e diretrizes políticas que permitiram ao governo a elaboração do Plano Nacional de políticas para as Mulheres; a aprovação na Câmara dos Deputados do Sistema Nacional de Habitação de interesse Popular, projeto de iniciativa popular subscrito por mais de 1 milhão de cidadãs e cidadãos brasileiros, que tramitava há mais de 10 anos e agora está no Senado Federal; a realização de conferências nacionais de Cultura, Meio Ambiente e Segurança Alimentar e as discussões com vistas ao Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) – uma política nacional de segurança pública que inclui desde Exército, Polícias Federal, Civil e Militar até Guardas Metropolitanas – são exemplos desse caminho.

VIII – O PT, o Brasil e a globalização

45. Não há como não reconhecer que, nas últimas décadas, aumentaram as interações econômicas, políticas e culturais entre povos e Estados ensejando o surgimento de fenômenos mais intensamente mundializados. Esse contexto globalizado interage com crescente incidência sobre as economias nacionais, Estados e culturas, proporcionando riscos e oportunidades distribuídos de forma desigual entre países e povos. Riscos e oportunidades são, com efeito, a marca registrada dos processos atuais de integração dos mercados e de redefinição das relações comerciais e institucionais entre os países do mundo global.

46.  No governo anterior, maximizaram-se os riscos e negligenciaram-se muitas oportunidades. De fato, na gestão passada criou-se um círculo vicioso entre uma política econômica que fez explodir as dívidas externa e uma política de comércio exterior tímida, que resultou em vultosos déficits comerciais. Evidentemente, a soma do aumento da vulnerabilidade externa, dos déficits comerciais e de uma política externa pouco ativa e de baixa consistência estratégica resultou na fragilização da projeção dos interesses nacionais no cenário mundial. Assim, a política externa tucana, que buscava a propalada “autonomia pela integração”, em contraste com a suposta autarquização dos governos desenvolvimentistas, não resultou nem em mais integração e, muito menos, em maior autonomia.

47. Em contrapartida, o governo do PT vem maximizando as oportunidades e reduzindo os riscos inerentes à integração ao processo de globalização, através de uma política externa exemplarmente ativa, que resulta em vultosos superávits comerciais e num maior protagonismo internacional do país. Criou-se, de fato, um círculo virtuoso entre a política econômica, que reduz a vulnerabilidade externa, e a política externa e de comércio exterior ousada e de alta densidade estratégica, que gera novos espaços de cooperação econômica, comercial e diplomática.

48. Os princípios que orientam a nossa ação, nesta esfera, são marcados pela busca do equilíbrio entre as nações, pela diminuição das distâncias econômicas, tecnológicas e sociais entre os povos, pela defesa do meio-ambiente, pelo combate à pobreza no mundo, pela solução pacífica dos conflitos, pelo fortalecimento do sistema de segurança coletiva e pela defesa do multilateralismo e dos princípios do Direito Internacional Público. A característica mais preocupante do mundo atual é a inexistência de ordem internacional efetivamente baseada nos princípios do Direito Internacional Público e no multilateralismo, o que gera insegurança e eclosão de conflitos político-diplomáticos, além de impossibilitar a necessária luta conjunta por um meio ambiente equilibrado e por regulação do processo de globalização, concentrador e excludente por natureza. Com efeito, a tendência mais perversa da globalização desregulada é a abertura de um fosso crescente entre as sociedades avançadas, baseadas no domínio da tecnologia e do conhecimento, e a maioria de nações de renda média e renda baixa. A competição entre os Estados capitalistas avançados cumpre um papel central no aumento da desigualdade entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento. Em todos os fóruns internacionais, constata-se a distância entre a intenção e a realização de progressos concretos contra o atraso, a fome e as endemias que vitimam os países de menor renda. As próprias Metas do Milênio fixadas pelas Nações Unidas encontram-se globalmente, mais distantes de serem alcançadas. Nos últimos dois anos, o Brasil desempenhou um papel ativo para que a agenda social entrasse efetivamente na pauta dos debates dos fóruns globais. Para contrabalançar os efeitos assimétricos da atual globalização hegemônica e as incidências negativas que ela produz sobre as soberanias dos países em desenvolvimento é preciso implementar iniciativas orientadas em duas direções: a) capacitar os países pobres ao desenvolvimento, promovendo a superação da pobreza, democratizando a renda e a riqueza internas, ampliando e qualificando os sistemas educacionais e aumentando a presença e participação desses países no comércio e na riqueza globais; b) articular um bloco de países e de forças, com capacidade de disputa hegemônica, com vistas a propor e influenciar um novo ordenamento político, jurídico e comercial internacional.

49. O Brasil buscará, com outros países em desenvolvimento, um processo de diálogo internacional, de negociações e de formação de forças em torno de um novo programa de reforma nas relações econômicas internacionais, com vistas a incluir, de modo mais atuante e significativo, os países em desenvolvimento no atual processo de globalização, reorientando o seu sentido. Esse processo de coordenação busca organizar o debate sobre as políticas de abertura aos investimentos diretos estrangeiros e às trocas globais de bens e serviços, no pressuposto de que os países mais avançados devem mudar substancialmente suas políticas protecionistas e subvencionistas e de que os países em desenvolvimento tem direito a um tratamento diferenciado no âmbito dos acordos econômicos internacionais. Um compromisso desse tipo viabilizaria um processo de globalização inclusiva, que beneficiaria tanto os países em desenvolvimento quanto os industrializados, contribuindo para realizar uma intervenção afirmativa em todos os fóruns internacionais.

50. O comércio internacional pode oferecer oportunidades para que essas distâncias econômicas e sociais entre os povos diminuam. Até agora, o crescimento do fluxo de comércio e a geração de riqueza a ele associada tem se dado de forma muito concentrada nos países desenvolvidos e em algumas poucas nações em desenvolvimento. Portanto, fazem-se necessárias a criação de regras mais justas e a redução dos subsídios, para se estabelecer um marco mais favorável para trocas internacionais eqüitativas. Apelos morais, entretanto, não são suficientes. O comércio internacional é uma arena de disputa muito dura e de alta sofisticação. Requer também a articulação de forças políticas com capacidade de barganhar e reorientar os parâmetros das regras atuais do comércio internacional. O governo, em parceria com o setor privado, deve investir para a organização de uma infra-estrutura jurídica, de assessoria e de suporte de conhecimento e planejamento estratégico orientada para apoiar o incremento das nossas exportações, a presença de produtos e serviços brasileiros em novos mercados internacionais e a multinacionalização de empresas brasileiras.

51.  A Organização Mundial de Comércio oferece, com a Rodada de Doha, o quadro necessário para que comércio internacional e a integração entre os mercados avancem. Embora a OMC tenha criado um espaço em que todos os países-membros têm voz e voto nas difíceis discussões sobre o comércio internacional, ela precisa ainda avançar muito para se converter numa instituição efetivamente multilateral, capaz de cristalizar regras mais transparentes e simétricas. Portanto, é necessária, agora, uma articulação firme com blocos de países que tenham interesses comuns em reduzir o protecionismo e o poderoso sistema de subsídios oferecidos à agricultura pelos países ricos. Sob o governo Lula, a nossa competente diplomacia conseguiu a articulação do G 20, com a co-liderança da Índia e da China, que converteu-se num instrumento importante para que avancem, em bases mais justas, as negociações da Rodada de Doha. Essas bases situam-se tanto na esfera do agronegócio como no âmbito das regras para investimentos, serviços, antidumping e propriedade intelectual. O pragmatismo realista deve continuar sendo a tônica da intervenção do Brasil com vistas a se obter um acordo global equilibrado. A Rodada de Doha deve ser, essencialmente, uma “rodada do desenvolvimento”, na qual os anseios dos países em desenvolvimento seja devidamente contemplados. Dessa maneira, poderíamos ter, ao final das negociações, um marco jurídico-comercial menos assimétrico.

52. Ao Brasil interessa que haja um marco internacional eficaz de proteção dos direitos de propriedade, mas este não deve se constituir numa arma de discriminação contras as nações pobres e em desenvolvimento. A propriedade intelectual é uma condição efetiva do mundo dos negócios, essencial para o bom funcionamento dos mercados, embora seja necessário assinalar que muitos países hoje desenvolvidos tenham recorrido, com êxito, ao recurso da cópia tecnológica no passado. As regras que protegem os demais países são as mesmas que nos vão proteger e, por isso, precisam ser equilibradas e contemplar diferentes estágios do desenvolvimento tecnológico. Da mesma forma que os países protegem os avanços tecnológicos de suas empresas, o Brasil e os demais devem ter o direito de proteger os recursos originários da sua biodiversidade e o conhecimento popular de plantas e substâncias com potencial para gerar princípios ativos e bens de interesse econômico.

53.   As chamadas barreiras técnicas vão concentrar, cada vez mais, um fator de clivagem no comércio internacional e para isso temos de estar preparados técnica, política e diplomaticamente. Não bastará aqui a defesa de princípios e interesses gerais. Será indispensável dispor de uma grande capacitação científica, capaz de produzir resultados técnicos consistentes e inquestionáveis, aprimorando a qualidade produtiva. O Brasil já é protagonista em algumas áreas nesta questão e aqui também um comportamento pragmático deve orientar o posicionamento do país, na medida em que a formação de blocos de defesas de posições nos organismos setoriais internacionais, que estabelecem as regras técnicas para os diversos setores industriais, não se restringe à formação maniqueísta de grupos de países pobres contra países ricos. Importam aqui duas coisas: capacitação técnica, que pode e deve ser compartilhada com outros países, até porque os custos dessa atividade são altos, e poder de gestão e negociação nos fóruns internacionais.

54. No que tange às regras para investimentos, é necessário um marco legal que não privilegie o direito dos investidores em detrimento da capacidade dos Estados nacionais de regulamentar os fluxos de capital, especialmente dos capitais especulativos, de acordo com o interesse público e com os parâmetros estabelecidos por políticas de desenvolvimento, industriais e de progresso científico-tecnológico. No que se refere aos serviços, é necessário enfatizar que o Brasil tem interesses defensivos claros no tema e que, portanto, deve-se evitar novas concessões em áreas estratégicas, como serviços financeiros e de telecomunicações, por exemplo. Ademais, é preciso evitar a abertura em áreas não devidamente regulamentadas, com a de audiovisual. Em relação a certos temas novos, como o de compras governamentais, por exemplo, a diretriz essencial deve ser a de se evitar o impedimento do uso de mecanismos de incentivos à produção local. Não se pode exigir, agora, que os países em desenvolvimento renunciem a esses mecanismos úteis para o seu progresso, “chutando a escada” da sua ascensão no cenário mundial.

55. Se a conclusão da Rodada de Doha, em termos da correção das assimetrias presentes no marco jurídico-comercial da OMC, é uma das prioridades para o país, isso não deve significar o abandono das esferas de negociação regional. Por todos os percalços que se tenha de enfrentar, a consolidação do Mercosul é do interesse estratégico do Brasil, que deve fazer esforços de cooperação no terreno normal das negociações.

56. A política externa de nosso governo projetou, com o aval decidido do presidente Lula, a busca estratégica da Comunidade Sul-Americana de Nações nos próximos anos, e esta é uma decorrência natural dos esforços do país para a consolidação do Mercosul. É fundamental trabalhar para uma integração efetiva dos países da região, quaisquer que sejam as orientações político ideológicas dos governos nacionais. Prevalece uma política voltada para agregar e reunir a Comunidade sob um mesmo marco econômico, político e diplomático.

57.  O Brasil deve continuar a ser um protagonista ativo nas definições das condições para o estabelecimento da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) e da área de livre comércio entre o Mercosul e a União Européia. Essa ação deverá ter como objetivo criar as bases para garantir um equilíbrio justo entre nações tão diferentes. A ação firme do governo Lula conseguiu alterar o cronograma e a agenda a ALCA, que, no seu formato original, atendia quase que exclusivamente aos interesses dos Estados Unidos. Por mais que o quadro prioritário de acordos amplos passe pela negociação multilateral da Rodada de Doha, avanços importantes foram feitos nessas duas negociações, em especial nos entendimentos entre Mercosul e União Européia. Saliente-se que, no governo Lula, o Brasil apresentou a sua proposta de uma ALCA flexível e realista, a qual dita as bases para a abertura comercial simétrica no hemisfério.

58.  Acordos localizados, nascentes em muitos casos no terreno das negociações multilaterais, devem ser impulsionados com Índia, China, Rússia e África do Sul, economias que se expandem rapidamente e que compõem, com o Brasil, uma nova realidade no quadro econômico mundial. No longo prazo, esse grupo de países constitui uma importante ferramenta para vocalizar os interesses das nações em desenvolvimento junto ao seleto grupo de países ricos, agrupados no G-7, bem como nas negociações da OMC. Da mesma forma, o Brasil deve buscar aliados para expressar, nos organismos financeiros multilaterais, com o Fundo Monetário Internacional, a defesa de mecanismos preventivos de crises, em lugar de mecanismos curativos que, em muitos casos, Nem estimulam os países a serem recompensados por seus próprios esforços na busca do equilíbrio fiscal, nem curam efetivamente, por agravarem em muitos aspectos os desequilíbrios anteriores.

59.  Os riscos cada vez mais reais de catástrofes causadas pelos desequilíbrios climáticos trazidos pelo efeito estufa redobram as responsabilidades de todos os países na busca da implantação de instrumentos preventivos, como o Protocolo de Quioto. Entretanto, será necessário ao longo dos próximos anos, desenvolver esforços para ir além da prevenção e estimular a busca do investimento em indústrias limpas. O Brasil já desempenha esforços relevantes na área dos biocombustíveis, a exemplo do programa do biodisel, e deve estar permanentemente atento aos esforços dos países para a geração de políticas industriais que tenham como fundamento a produção não poluente.

60.  A paz e o equilíbrio entre as nações, com a diminuição do ódio religioso e étnico e da intolerância política, devem ser também um objetivo permanente do Brasil no cenário mundial. Apesar do excepcional avanço da tensão mundial por conta desses fatores, esforços devem ser feitos pela distensão destes conflitos, o que impõe a revalorização das Nações Unidas, com ampliação dos marcos de deliberação em seu Conselho de Segurança. A forma de buscar um maior equilíbrio mundial é dar vazão à diversidade, à expressão democrática, evitando-se a volta a alinhamentos automáticos entre nações. A diversidade é um bem superior da humanidade e a preservação da paz, uma garantia para dias de maior equilíbrio entre os povos.  O PT, ao mesmo tempo em que condena o terrorismo como uma prática inaceitável, condena também a guerra preventiva, conduzida à margem do sistema de segurança coletiva, como uma reação que não se legitima no direito internacional. O Brasil deve estimular o diálogo entre culturas e civilizações, enfatizando os valores éticos e morais que povos, etnias e religiões têm em comum.

61. No contexto da globalização em que as interações mundiais crescem em todas as atividades, o PT precisa avançar suas definições estratégicas de relações internacionais. No desenho dessa estratégia deve-se considerar que as mudanças políticas na América do Sul (com governos progressistas na Argentina, no Chile, no Uruguai e na Venezuela) configuram um cenário inédito para o desenvolvimento de relações entre os partidos políticos, os movimentos sociais e os governos da região. As articulações internacionais do PT devem priorizar e desenvolver propostas conjuntas visando os objetivos comuns dos governos de esquerda da região. A presença mais expressiva da esquerda nos governos da região sinaliza para o PT a prioridade da agenda da integração regional (Mercosul e Comunidade Sul-americana de Nações). O PT, além de desenvolver seu campo próprio de relações internacionais, pode e deve reforçar as dinâmicas governamentais que caminham no mesmo sentido dos objetivos do partido. Nas atividades específicas do PT destacam-se as iniciativas de coordenação de partidos políticos progressistas e das centrais sindicais dos países do Mercosul que desenvolvem importante trabalho de intercâmbio e de busca de consenso em torno da construção de um projeto de integração regional. Na América Latina e no Caribe, o PT mantem uma relação estreita com os partidos progressistas e de esquerda que participam de diversas instâncias de intercâmbio e coordenação, como o Foro de São Paulo, a Coordinación Socialista Latinoamericana e a Conferência Permanente de Partidos Políticos de América Latina (COPPAL). O PT deve continuar trabalhando para que o Foro de São Paulo se consolide como uma instância de confraternização, de diálogo e de intercâmbio de experiências, assim como expressão da pluralidade política e a diversidade cultural latino-americana e caribenha.

IX – Revitalizar as Estruturas de Base do PT

Um partido em constante evolução

62.  O PT sempre foi uma instituição inovadora. Desde sua fundação adotou critérios próprios para a sua organização e funcionamento, rejeitando o engessamento da Lei Orgânica dos Partidos. Buscou novos métodos para normatizar a sua vida interna, tendo como princípios a democracia, a pluralidade de opinião, a liberdade de organização dos seus filiados e a unidade da ação política em torno das decisões tomadas em processos democráticos de discussão e deliberação.

O PT inovou também na organização de base. Decidiu pela criação dos núcleos, organizados por local de moradia, categoria profissional, de trabalho, de segmento social e de grupos de opinião. Promoveu a organização dos setoriais, para a defesa e a participação de diversos segmentos sociais (mulheres, negros, índios, portadores de deficiência, etc) e ampliou essa representação para segmentos e campos temáticos da maior importância para a luta popular no Brasil (juventude, trabalhadores rurais, meio-ambiente, segurança pública, educação, saúde e outros).

A nossa tradição é sempre de radicalizar a democracia e ampliar os espaços de opinião, debate e participação. O PT tem se mostrado, ao longo destes 25 anos, um partido em constante evolução, tendo suas propostas programáticas adaptadas à conjuntura de cada momento histórico.

Nas eleições nacionais de 2002 o PT se consolida como um partido nacional. Vencemos a disputa pela Presidência da República, elegemos as maiores bancadas de deputados federais e estaduais e a 3ª maior no Senado Federal. O PT passa a ser um dos quatro maiores partidos brasileiros e lidera um governo nacional numa ampla coligação de esquerda, que inclui partidos do centro político.

A organização do PT precisa chegar a todos os municípios

63. O PT atualmente está organizado em 5.345 municípios (2.882 diretórios e 4.753 municípios (lançamos 1.951 candidatos a prefeito e apoiamos outros 2.802 candidatos a prefeitos de outros partidos, indicando 894 candidatos a vice-prefeito do PT). Nas eleições proporcionais lançamos 34.684 candidatos a vereador espalhados em 5.071 municípios. Nos próximos 4 anos estaremos participando em 1.660 governos municipais, pois elegemos 411 prefeitos e 312 vice-prefeitos e apoiamos 937 chapas majoritárias vencedoras, onde teremos alguma forma de participação na gestão. Elegemos 3.679 vereadores, que estão distribuídos em 2.345 municípios.

Os números mostram que o PT realmente chegou à maioria dos municípios brasileiros. Nosso desafio para os próximos 3 anos é aumentar o grau de organização do PT nestes municípios e criar espaços para reflexão e atuação de nossos filiados. Em muitos deles o PT só tem maior atividade em períodos eleitorais. Precisamos priorizar a revitalização de nossas estruturas de base, não somente os Núcleos de Base, mas os próprios diretórios municipais, que, principalmente nos pequenos e médios municípios, não conseguem produzir uma ação coletiva permanente que integre o PT à comunidade local.

Principais Eixos de Construção Partidária

Fortalecimento dos Diretórios Estaduais e Municipais

64. Os recursos financeiros disponíveis atualmente às instâncias estaduais e municipais são insuficientes para a profissionalização de dirigentes, contratação de assessores qualificados, aquisição de mobiliário e equipamentos adequados, etc. A contribuição financeira dos filiados, na maioria das vezes, não é cobrada adequadamente. É preciso um esforço de todo o partido para incluir os filiados no SACE (Sistema de Arrecadação de Contribuições Estatutárias), automatizando a cobrança e os repasses, para melhorarmos a relação financeira entre o Diretório Nacional e os diretórios estaduais e destes com os diretórios municipais, viabilizando assim uma redistribuição mais adequada dos recursos. O Diretório Nacional deverá também estabelecer novos critérios de repasse de recursos do Fundo Partidário, de forma a aumentar os valores recebidos pelos Diretórios Estaduais, vinculando-os ao atendimento de metas em projetos específicos, tais como aumento de receita própria, filiação, curso de vereadores, informatização, etc.

Coordenações Microrregionais

65. A estruturação das Coordenações Microrregionais, garantidas as condições financeiras e um projeto de implantação coordenado com as direções estaduais possibilitará o crescimento sustentado do partido em todo o país. É por meio destas estruturas que poderemos avançar na informatização, na comunicação, no acompanhamento das administrações e dos vereadores, na formação política, no apoio aos DMs, no acompanhamento das filiações e na organização para as eleições de 2006. É mais de trezentas Coordenações Microrregionais em todo o país, uma verdadeira rede logística de organização partidária, próximas das realidades locais. As microrregiões são estruturas de apoio na execução das políticas do PT, vinculadas às direções estaduais.

Informatização

66. Implantar a Rede PT Brasil, a “intranet” do PT, que interligará os diretórios nacional, estaduais, municipais e zonais, com a ferramenta informatizada do PED e um sistema de controle de documentação. Ainda em 2005 serão agregados novos sistemas, tais como o SACE e o Cadastro Nacional, que já funcionam em nível nacional, mas passarão a ser compartilhados com todas as instâncias. Vamos realizar um amplo programa de capacitação, a partir da formação de multiplicadores em cada Diretório Estadual, envolvendo os representantes das Microrregiões até atingir todos os diretórios municipais.

Fortalecimento dos núcleos setoriais

67. Desde o Congresso de 1999 que se apontava a necessidade de revitalização dos Núcleos de Base do PT. O fato é que, na prática, os núcleos têm pequena atuação. A melhor forma de organizar a base, de trazer os filiados para a atuação conjunta e de envolvê-los na luta social seria através de um esforço de multiplicação dos setoriais nos municípios, por meio da criação de núcleos. O PT local deve trabalhar no sentido de ter um diagnóstico constante dos problemas em seu município e deve buscar envolver os filiados em movimentos sociais. Nos 1.660 municípios onde temos alguma participação no governo municipal, devemos buscar combinar a ação institucional dos governos com a participação dos filiados. Não somente no Orçamento Participativo, mas também nos Conselhos Municipais de Saúde, Educação e Ação Social, no ConselhoTutelar, e em outros tantos instrumentos que nossas administrações viabilizarem. E onde somos oposição, os núcleos setoriais devem também elaborar e envolver a sociedade na busca de soluções para os problemas locais. Da mesma forma, a próxima direção deverá fortalecer os canais de diálogo com os movimentos sociais, dotando os setoriais estaduais e nacionais e as secretarias de movimentos populares de organicidade objetivando aprofundar o diálogo do PT com os movimentos sociais e, por outro lado, fazer um acompanhamento político constante das ações de suas instâncias, determinando maior sintonia no conjunto do partido. Com este objetivo, o PT realizará atividades que evidencie essa disposição, devendo patrocinar encontros com a Conferência dos Movimentos Sociais de maio.

Conferência PT e movimentos sociais

68. Para dar concretude à disposição do PT de ampliar e aprofundar o seu relacionamento com os movimentos sociais e dar equilíbrio às nossas ações institucionais e de base, propomos que o partido realize a conferência do PT com Movimentos Sociais, assim como mantenha a realização de diversas atividades que evidenciem a disposição do partido debater os temas propostos pelos Movimentos Sociais.

Formação Política

69. Precisamos promover um “choque” de atualização de nosso projeto com o conjunto da militância petista. Precisamos unificar os atuais dirigentes e militantes em torno de nosso projeto de transformação do país, preparando uma nova geração para enfrentar tanto os desafios políticos quanto os de gestão pública. Propomos a criação da Escola Nacional de Quadros do PT, que se dedicaria à formação político-cultural, à capacitação de gestores públicos e à especialização dos dirigentes petistas. O processo de criação desta escola passaria por convênios e iniciativas associadas à Fundação Perseu Abramo, até que as condições materiais e pedagógicas permitam a centralização destas atividades em uma só instituição.

Comunicação

70. Constituir uma equipe de intersecretarias, encarregada de elaborar uma estratégia de comunicação partidária, tanto interna ao Partido (filiados, direções, bancadas, executivos) quanto com a sociedade em geral. Esta estratégia deve incluir a reavaliação dos instrumentos existentes bem como a fundação de novas mídias partidárias.

Apoio político e técnico às administrações municipais

71. Dar continuidade ao projeto de acompanhamento institucional das prefeituras e dos vereadores do PT, que possibilita uma maior integração entre nossas prefeituras, governos estaduais e governos federais. Ampliar o acompanhamento das pequenas e médias prefeituras utilizando o suporte das Microrregiões e dos Diretórios Estaduais, monitorando um conjunto de indicadores de gestão e de relação política.

Política Internacional

72. Dotar a Secretaria de Relações Internacionais de melhor estrutura operacional, de forma a dinamizar as atividades de política internacional do PT. Efetivar convênios de formação e intercâmbio com os partidos parceiros internacionais. Incrementar a implantação de núcleos no exterior, realizando um encontro dos núcleos existentes para avaliação da experiência e debate sobre suas funções, estrutura, funcionamento, etc.

16 de Setembro de 2009

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