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Entrevista ao jornal A Tribuna de Santos

Cometi erros políticos, não crimes

Entrevista para THIAGO MACEDO


O deputado federal José Genoíno visitou a Cidade na sexta-feira para o lançamento de sua biografia José Genoino - Escolhas Políticas,escrita pela professora da Universidade Federal de Brasília (UnB) Maria Francisca Ribeiro Coelho. O parlamentar concedeu entrevista exclusiva para A Tribuna, na Realejo Livros, onde falou sobre o tempo em que era guerrilheiro, sobre a acusação de envolvimento no escândalo do mensalão e o tratamento dado pelos grandes veículos de comunicação ao PT. Genoíno afirmou que a atitude da oposição em barrar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) foi ``uma irresponsabilidade''.

O senhor afirma que o partido (PT) sofre um massacre da imprensa. O que quer dizer com isso?

Acho que a liberdade de imprensa é fundamental. É um valor essencial da democracia. Agora, na cobertura que se fez e faz do PT e do Governo Lula, eu acho que a grande imprensa faz a cobertura na forma de campanha. Não é na forma de informação. Uma campanha para quem? Uma campanha contra o PT. Por exemplo, todo mundo viu nas matérias que o PT iria se acabar. Que o PT não seria o mais votado. Primeiro, o PT não se acabou. Segundo, foi o mais votado na Câmara dos Deputados (nas últimas eleições). Quando tem uma notícia que envolve um político do PT, a manchete é o PT. Quando é um político de outro partido, a sigla (do partido) nem aparece.

O que o senhor acha que explica tudo isso?

Acho que é uma cobertura de campanha. Eu acredito que alguns grandes - não toda a imprensa... Alguns veículos têm uma posição política, ideológica. Também porque as previsões que tinham em relação ao PT e ao Governo Lula foram derrotadas. Segundo, uma parte dos jornalistas sofreu decepções e frustrações com erros e falhas do PT. E, numa outra parte, tem a ver com uma coisa que hoje é dominante, que é o espetáculo. A política vira um grande espetáculo. Você demoniza e endeusa com a maior facilidade. Eu falo isso porque vivi os dois lados. Fui unanimidade e estrela. Depois fui condenado e mandado para o ostracismo.

O senhor guarda alguma mágoa de tudo isso?

Não, mágoa e ódio não tenho. Eu aprendi na vida, desde a minha experiência na tortura, que o ser humano não pode guardar ódio nem mágoas. Você tem experiências que acumula, que vive, mas mágoa e ódio não tenho. Esses sentimentos fazem mal. Você tem que ter lições. Aprender.

O que o senhor aprendeu com tudo isso?

Ser mais experiente. Ser mais criterioso. Eu fiz escolhas políticas sempre no limite. Nunca pensei muito nas escolhas que eu realizei. A minha vida sempre foi assim. Eu não tenho nada na minha vida. Eu estou há 21 anos no parlamento e o meu patrimônio é o mesmo há 24 anos. Eu moro em uma casa no mesmo lugar, na mesma rua. Por exemplo, quando a imprensa teve acesso ao meu patrimônio fiscal e bancário. Se tivesse subido seria manchete, mas como não subiu só saiu no jornal O Globo uma notinha lá no canto que o meu patrimônio tinha diminuído. São essas coisas que a gente viveu.

O senhor acha que as alianças que o PT fez valeram a pena?

Olha, primeiro que a gente não ganha eleição, nem governa sem fazer alianças.

Mas as escolhas foram certas?

Depende. Algumas foram certas, outras não. Por exemplo, acho que com o PMDB a gente já deveria ter feito a aliança desde 2003. A coalizão com o PMDB é fundamental. É um grande partido, tem história, tem força social, força eleitoral. Agora, se a aliança é feita com diferentes, tem problemas. Eu digo que, na minha experiência como presidente do PT, eu nunca vi, nem conheci, ninguém nunca discutiu comigo mensalão, compra de voto. O que houve foi o financiamento da campanha de 2004. Isso era feito nas cidades que o PT tinha alianças. Houve um aliado - que virou adversário - que cunhou a palavra mensalão. E aí o establishment midiático comprou essa palavra e bateu duro.

O senhor fala que era julgado pelo que era e não pelo que fez...

É porque eu não fiz nada de ilegal. Os empréstimos que eu avalizei são legais, estão na contabilidade do PT, estão com registros no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e o PT está pagando os empréstimos. Eu não repassei dinheiro para ninguém, nem recebi um centavo. As alianças foram eleitorais para 2004, o que é legítimo e democrático. Algumas foram bem sucedidas, outras não. Eu cometi erros políticos, não crimes.

Quem errou no PT?

Foi o PT. Porque as escolhas que nós fizemos foram decididas pelo diretório nacional, pela executiva: fazer alianças, ganhar as eleições de 2004.

Qual a aliança que o senhor acredita que o PT não deveria ter feito?

Eu não vou citar uma ou outra, eu prefiro falar no genérico. Agora critério para fazer aliança, eu sou aliancista, a gente tem que ter critério. Ao negociar alianças tem sempre que saber qual é o lado que a gente senta. O PT não pagou pra ninguém, o PT não comprou voto de ninguém e ninguém do PT se enriqueceu.

Há trinta anos o senhor não propunha aliança.

Não. Eu fui da geração da luta armada. Eu não acreditava nem em eleição. No meu primeiro voto eu tinha 36 anos. Porque eu pregava voto nulo antes e fiquei oito anos na clandestinidade. Meu primeiro voto foi quando fui candidato. Quando o PT foi fundado, o PT era contra aliança. Era: um, dois, três, o resto é burguês.

O PT amadureceu?

Sim. Acho que o PT amadureceu com a campanha do Lula de 89, de 94, com a de 98. Nós tínhamos uma concepção política de mudar o Brasil quebrando a ordem, mas nós tivemos que mudar. Mudar o Brasil por dentro da ordem. E quando você entra na ordem para mudar o País também corre riscos. Os riscos que a gente correu no enfrentamento quando defendia a luta armada - sem dizer que são iguais - foram os riscos de querer mudar uma sociedade por dentro do status quo. Você fica no fio da navalha. Por isso, eu trabalho muito com o conceito de escolhas políticas.

O presidente Lula, em defesa da CPMF, afirmou que é uma metamorfose ambulante, porque no passado foi contra a CPMF e agora a defende. O senhor também tem essa opinião?

O Lula tem uma noção exata das limitações de quando você está na oposição e dos desafios de quando se está no Governo. A questão da CPMF sempre foi polêmica dentro do PT. Eu internamente sempre defendi a CPMF, no plenário eu votava contra para seguir a orientação do partido. O PT nunca levou a luta contra a CPMF ao limite que está levando a oposição hoje. Em 2000, nós fizemos uma negociação com a CPMF, cujo presidente do Senado era Antônio Carlos Magalhães, que negociou o fundo de combate à pobreza e nós não obstruímos. Quando as pessoas dizem que estão fazendo com o PT o que o PT fazia quando era oposição, eles estão fazendo dez vezes mais que o PT fazia.

Por que o senhor acredita que estão fazendo isso?

Porque quem já foi Governo tem a responsabilidade maior do que quem não foi. O PT nunca havia sido Governo quando fazia oposição. Eles foram Governo. Um ex-presidente da República (Fernando Henrique Cardoso), que governou o País e sabe os desafios de governar, não ter a noção da responsabilidade e levar uma bancada a votar contra a CPMF é diferente de um cara que nunca governou o País. A política é um processo permanente de evolução. Nisso o Lula está certo. Você tem que mudar, sem mudar de lado. Tem que mudar mantendo os seus paradigmas. Até porque, quando se chega no poder, a paisagem é diferente de quando se está na oposição.

É mais fácil ser oposição?

Não é mais fácil ou difícil. Quando se é da oposição há vantagens e desvantagens. Quando se é governo, você tem a chance de mudar. Quando se é oposição, tem a chance de marcar posição.

O senhor é favorável a um terceiro mandato do Lula?

Não. Sou radicalmente contra.

Mas há um movimento a favor?

Não. Isso é espuma em água limpa e fumaça onde não tem fogo. Não há nada nesse sentido. Uma ou outra pessoa pensar isso não é movimento. Para a história do Lula, é ruim. Para o PT, é ruim. Para a democracia, é ruim e para o País, é ruim. A prioridade nossa tem que ser mudar o sistema eleitoral e político do País. E outra coisa: não se mudam as regras durante o jogo. O PSDB mudou as regras duas vezes durante o jogo. Em 94, quando o Lula estava com 42% (nas pesquisas eleitorais) das intenções de votos e o FHC não era nem candidato, o PSDB reduziu o tempo de mandato de cinco para quatro anos. E depois mudou para ter reeleição.

Quem é o candidato do PT para 2010?

Não sei. Ainda é cedo. Temos que completar o nosso programa do segundo mandato e, se o Governo for bem, o PT faz o sucessor. Quem vai ser, pode ser do PT ou de fora do PT, desde que tenha compromisso com o programa do Governo Lula.

E para a prefeitura de São Paulo, é a Marta?

Se ela quiser, é consenso no partido.

Qual o ponto fraco do Governo do PT?

As nossas maiores dificuldades são no campo político. Porque a gente viabilizou o crescimento econômico, os programas sociais. Estamos recompondo o papel do Estado. No campo das articulações políticas, temos debilidades porque não somos maioria. Com esse sistema político que está aí é muito difícil de eleger um presidente com maioria seja ele de que partido for. É um sistema individualista, personalista e desorganizador dos partidos.

Quem desorganiza os partidos?

O status quo. Há uma espécie de comodismo de todos os partidos, até no PT há resistência há uma reforma política. A questão da reforma política não depende só de um partido. Temos que chegar a um consenso pelo menos com os grandes partidos: PT, PMDB, PSDB, o DEM.

E nas eleições nacionais do PT, em quem o senhor vota, Jilmar Tatto ou Ricardo Berzoini?

O meu voto é do Berzoini. Não estou na chapa, respeito os dois, mas o meu voto é do Berzoini.

Quais são os seu planos políticos para os próximos anos? Ser deputado, só. Não tenho planos para direção do partido, nem eleições majoritárias.

Pegou trauma?

Não. É escolha que você tem que fazer.

E na vida pública, até quando pretende continuar?

A política para mim faz parte da minha vida. Eu não vivo sem a política. Eu não tenho nada na vida. Eu não me formei. Eu não tenho outra forma de renda fora da política. Sou professor, mas não posso dar aula profissionalmente porque não me formei. A política é a minha razão de vida.

O que o Genoíno cidadão aprendeu após todo o maremoto do mensalão?

Eu aprendi muito porque você fica no limite quando é acusado sem ter nada. A minha vida foi virada de cabeça para baixo. O que encontraram? Não tem depósito, não tem patrimônio, não recebi nada de ninguém, mas eu era o presidente do PT. Eu era atacado pelo o que eu era e não pelo que eu fiz. A minha vida é uma busca permanente de renascimento. Quando eu estava preso, achava que não iria sobreviver e sobrevivi depois de cinco anos de cadeia e tortura. A vida é um renascimento permamente e eu estou lutando ainda.

Colaborou César Miranda

17 de Dezembro de 2007

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