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IMPRENSA

Carta enviada por Genoino a Ruy Mesquita, do Estadão

Leia abaixo carta enviada por José Genoino ao diretor de Opinião do jornal O Estado de S.Paulo. Na carta, o deputado apresenta provas de inverdades divulgadas em reportagens no jornal, defende a liberdade de imprensa e critica a formação dos oligopólios no setor.

"Dr. Ruy Mesquita,

Tomo a iniciativa de escrever ao jornal O Estado de S. Paulo, sob a forma de "carta aberta", embora ela não se destine, necessariamente, à publicação pela imprensa (inclusive pelo próprio Estadão). Pretendo que a divulgação de seu conteúdo seja, em princípio, restrita ao meu site.

Devo destacar de início - muito mais para informar quem acesse este texto pelo meu site do que supostamente para lhe recordar o fato - que eu e você, Ruy Mesquita, somos interlocutores e amigos de longa data. Apenas para citar, fui colaborador regular do Estado de S. Paulo durante dez anos ou mais, exatamente no auge de sua lida diária na direção desse tradicional órgão da imprensa brasileira.

Foi uma época de grande intercâmbio de idéias entre nós e outros amigos comuns.

Os anos se passaram, eu seguia em minha carreira política e, sem razão especial ou motivo específico, começou a haver um espaçamento de nossos contatos. Creio ter sido por força mesmo das agendas individuais. Entupidas e acumuladas, elas e o tempo cuidam de distanciar as pessoas sem que, às vezes, haja uma correspondente ruptura de sentimentos como admiração, respeito e amizade. Ao menos de minha parte, foi o que ocorreu.

Mas, como somos todos sujeitos às vicissitudes que a vida nos apresenta, circunstâncias inesperadas muitas vezes nos surpreendem e exigem de nós um exercício enorme de virtudes, algumas das quais nem suspeitávamos ter, para superar as conseqüentes adversidades. Comigo isso tem ocorrido.

Vamos aos fatos.

Primeiro fato. Na edição de 29-07-2005, o Estadão publicou matéria, assinada pela jornalista Rosa Costa, sob o título "Genoino, R$ 500 mil em 15 dias" e o subtítulo: "Dinheiro entrou e saiu da conta do então candidato Genoino no BB". Naquela época – não muito diferente do que é hoje –, a mídia não dava notícias, não informava. Ela denunciava. Ela julgava. Ela condenava. Ninguém tinha – ou tem – razão contra a mídia, mesmo que o tenha contra tudo o mais e contra todos.

Nesse caso, a matéria, que se referia a um fato do ano de 2002, não era apenas tendenciosa e injuriosa. Ela era inverídica e injusta. Duro para mim, além do absurdo da notícia, foi também o desdobramento que ela trouxe, pois, desde então – e em decorrência da imaginária ‘denúncia' que ela supunha conter –, sofri implacável fiscalização das autoridades fazendárias. Na realidade, não me foi difícil – embora bastante trabalhoso e cansativo – demonstrar a verdade. E a verdade era muito simples: aqueles tais R$ 500 mil eram recursos do partido, destinados à minha então campanha ao governo de São Paulo, que foram transferidos, isso sim, naqueles 15 dias, para cumprir prazo de transferência de uma conta bancária em que eu era titular com CPF para outra, na qual tive de ter respectiva inscrição no CNPJ, tudo por determinação da Justiça Eleitoral.

Nada como o encontro do tempo com a verdade. Eis que agora, a caminho de completar três anos desde a publicação pelo Estadão daquela matéria desastrosa para mim, tenho em mãos o "Termo de Encerramento de Ação Fiscal e de Devolução de Extratos Bancários", com data de lavratura de 28/02/2008. A conclusão do longo curso daquela fiscalização foi a de que

"...em relação à matéria examinada não resultou crédito tributário a ser lançado. De acordo com o art. 8º da Portaria SRF-180 de 01/02/2001, lavramos o presente termo para registrar a devolução dos extratos bancários (ano calendário 2002) ao contribuinte uma vez que não houve constituição de processo administrativo fiscal...". Assina a AFRFB-Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, Maria Isabel R. Mortensen – Matrícula 24.562". (as partes sublinhadas reproduzem o que assim consta do original).

Segundo fato. Matéria publicada ainda por esse jornal, em 12/04/2008, assinada pela jornalista Lisandra Paraguassú, sob o título "Agricultores do Araguaia devem ser indenizados", faz referência ao meu nome, igualmente de forma incorreta e injusta. Uma foto minha ocupando um espaço maior do que a matéria, era acompanhada do seguinte texto: "o valor das pensões a serem recebidas pelos agricultores ainda não está definido. Dificilmente, no entanto, chegarão aos R$100 mil da indenização recebida pelo ex-guerrilheiro mais famoso, o hoje deputado José Genoino". O que é isso? Desinformação? Discriminação? Perseguição a mim? Posteriormente, a Comissão de Anistia anunciou que provavelmente manterá para os camponeses a mesma indenização de R$100 mil. Na matéria, nenhuma citação ao meu nome.

Ora, como toda a imprensa sabe, essa questão é da competência da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. E essa Comissão fixou em R$100 mil o valor daquela indenização, prevalecente para todos os que se enquadraram na situação. No meu caso, portanto, se a referida Comissão entendeu que eu fazia jus àquela indenização, o que fiz por merecer foi exatamente o mesmo que os demais. Não solicitei pensão retroativa e nada além da indenização básica. E por que a referida matéria, então, afirma que outros, dificilmente, receberiam o mesmo que eu? De onde a jornalista tirou essa informação, ou essa conclusão?

Meu caro Ruy Mesquita, tenho a certeza de que você nem imagina que o jornal que tão brilhantemente dirige é capaz de publicar matérias, no mínimo, com tamanho grau de imprecisão, para não dizer leviandades e inverdades.

Faço desta carta aberta um instrumento de protesto e de minha defesa. Mas não posso negar que uma de minhas intenções, porém, é ter a oportunidade de, ao entregá-la pessoalmente, poder expressar de viva voz o que aqui registro sobre aqueles sentimentos a que aludi antes, muito presentes em mim, ainda que estejamos fisicamente distanciados por força de agendas distintas.

Com esta carta, não quero dar lição a ninguém. Mas, em respeito a você a ao jornal, não posso deixar de dizer que se vivi o lado da projeção, também senti na carne o da destruição. O poder da mídia é ilimitado, pois, pela sua própria natureza, não tem contra-freios.

Creia, prezado dr. Ruy Mesquita, que o seu discurso, intitulado "Em defesa da diversidade de ideais e opiniões" e pronunciado em junho de 2006, nos EUA, quando recebeu o Prêmio Woodrow Wilson de Serviço Público, representa um dos mais lúcidos e inspirados momentos da crítica (ou autocrítica) jornalística.

Quando ali tratou da questão dos efeitos do abuso do poder econômico e do seu subproduto "concentração da propriedade", você assinala que na indústria da informação esses efeitos são mais nefastos. O controle e o monitoramento da informação nas mãos de poucos órgãos de imprensa geram o que você chamou de "oligopólio" e "ameaça real às liberdades". Por outras palavras, você disse que, naquelas condições, o poder concentrado da indústria da informação ameaça a própria liberdade. E concluiu: "É preciso reverter esse processo".

O seu pensamento, ali perpetuado, é uma das mais dignas manifestações daquilo que quer significar, no verdadeiro sentido da expressão, liberdade de imprensa.

São Paulo, 30 de junho de 2008.

Atenciosamente,

José Genoino"

08 de Julho de 2008

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