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Escolhas Políticas

O fogo amigo dispara mais uma vez - Resenha do Jornal O Valor

Ruy Baron / Valor
Genoino: discurso de afastamento da presidência do PT remete à amizade com Lula

Por Daniel Machado 

Foi no tempo em que a estrela do PT brilhava longe da constelação de escândalos que a turvou. Corria 1989 e Lula, candidato a presidente pela primeira vez, ia para um comício, com assessores, aspones e Espinoza - o companheiro grandalhão responsável por sua proteção. Lá pelas tantas, um sujeito acerta um ovo na testa do presidenciável. Para quê. A malta petista quis trucidar o agressor - que só se safou porque Espinoza o protegeu até a chegada de um policial. Lula foi sozinho até o palanque. Quando reviu o segurança, saiu-se com esta: "Com companheiros assim, não precisamos nem de adversários. Afinal, você tem que dar segurança a quem?" A resposta veio mais branda: "Você queria o quê? Que eu deixasse matar o coitado?"


Hoje, o bate-boca pode parecer coisa à toa. Mas continua a ilustrar a relação de amor e ódio que Lula nutre com seus companheiros - e vice-versa. Está certo que ele continua a ser defendido por uma legião de correligionários fiéis, mesmo após a crise que abalou o PT e o país. Mas para alguns de seus amigos mais próximos a defesa do governo só é feita hoje acompanhada de alguma autocrítica. "Calendário do Poder", livro-diário de Frei Betto, e "Escolhas Políticas", biografia de José Genoino escrita pela socióloga Maria Francisca Pinheiro Coelho, exemplificam bem isso. À sua maneira, reconstituem passagens recentes da história do país.


Diferentemente de seu livro anterior, "A Mosca Azul", em "Calendário do Poder" Frei Betto muda o tom de suas críticas, destinadas a figuras-chave do governo. Encarregado da Mobilização Social do Fome Zero, Frei Betto pretendia com o programa fomentar o desenvolvimento social de regiões pobres e não só distribuir comida. Mas, anotou em março de 2003, poucos pensavam da mesma maneira: "Custo a engolir que a Presidência não dispõe de recursos para a mobilização social." Ele dá nome aos bois que empacaram seus planos: os ministros da Segurança Alimentar, José Graziano, da Secretaria de Comunicação, Luiz Gushiken, e da Casa Civil, José Dirceu.


Uma amizade longa dava a Frei Betto fácil acesso a Lula. Enviava-lhe cartas opinando sobre os rumos do governo. Chegou a escrever: "Lula, é hora de repensar o governo. Ministro tem que ser gestor. Demita quem não é capaz de bem administrar." Para completar: "Por favor, não peça mais paciência à Nação. Ela espera há séculos."


"Escolhas Políticas" mostra que Genoino optou por outro caminho. O livro já estava pronto quando começaram as CPIs no Congresso para investigar as denúncias de corrupção surgidas com a descoberta do mensalão. A autora, pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB), já tinha decido pôr um ponto final na obra quando Genoino, então presidente do PT, pediu afastamento do cargo, em 2005. A acusação contra ele foi a de ter autorizado dois empréstimos milionários avalizados pelo empresário Marcos Valério. Isso não foi esclarecido pela Justiça, o que impediu a autora de estender a biografia até os dias atuais.


No discurso de afastamento de Genoino está a relação que mantém com o amigo Lula. "Duas questões estão acima de minha carreira: a defesa do PT enquanto projeto estratégico de esquerda (...) e a defesa do que representa para o Brasil o presidente Lula", disse. "Nossas carreiras e nossas vidas estão abaixo desses dois valores basilares, o PT e o companheiro Lula."


Exageros à parte, a defesa de Genoino mostra uma posição distinta da de Frei Betto. Vistas de longe, porém, expressam uma vontade comum: recolocar o PT, senão junto dos ideais que nortearam sua fundação, há 26 anos, ao menos distante dos escândalos que macularam sua estrela.

15 de Junho de 2007

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