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Entrevista

Em Corumbá, Genoíno fala sobre política e escândalos

O deputado federal pelo PT de São Paulo e ex-presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, José Genoíno, passou quatro dias em Corumbá para apresentar o Pantanal ao genro espanhol.


O parlamentar aproveitou para conhecer a cidade e prestigiou alguns eventos da quarta edição do Festival América do Sul. Antes de voltar para São Paulo, Genoíno concedeu entrevista exclusiva ao Diário Corumbaense, na qual avaliou as conquistas do Governo Lula; os avanços em relação à administração do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso; sua relação com o ex-governador Zeca do PT e integração sul-americana. José Genoíno ainda comentou o envolvimento de seu nome no escândalo dos dólares na cueca. 



Qual o motivo da visita a Corumbá?


José Genoíno: A visita ao Pantanal foi uma visita familiar. Eu vim com minha filha que mora em Sevilha, com minha primeira neta, de oito meses, e o marido dela, que é espanhol e queria conhecer o Pantanal, mais minha mulher e meu filho. Eu tinha passado em Corumbá em 1998, na época da primeira campanha do Zeca e fiquei uma noite só e viajei de manhã. Portanto eu não conheci bem nem Corumbá e nem o Pantanal e eu tinha um interesse muito grande em conhecer, porque é uma região que a gente sabe da simbologia, conhece a fama, os mistérios, mas não conhece o concreto. Eu achei a região impressionante. Fiquei impressionado com a cidade, com essa identidade do Festival América do Sul, uma identidade cultural e política muito forte, que está no centro da América do Sul. Eu participei de duas noites, visitei as bancas, barracas, assisti show na praça, visitei alguns lugares como a Casa do Artesão. Fiquei apaixonado por Corumbá. Foram dias maravilhosos e fiquei possuído sentimentalmente por essa cidade e essa região. Vou voltar logo aqui.



Como o senhor avalia a proposta do Festival América do Sul?


José Genoíno: Eu acho uma grande iniciativa, porque quando a gente fala em integração sul-americana, ela não pode ser apenas uma integração financeira, de mercado, apenas de troca. Ela tem que ser uma integração cultural, geopolítica, territorial, e de infra-estrutura. Eu acho que essa iniciativa, em uma cidade que fica no centro da América do Sul, convergindo para uma iniciativa cultural. A cultura tem o poder de construir uma identidade, e ela revela essa identidade de uma maneira muito forte. Primeiro eu achei uma grande iniciativa. Eu acho que a acolhida, a alegria do povo, a solidariedade, a maneira como as pessoas participam de todos os eventos, eu achei impressionante. Eu vejo nisso uma grande iniciativa porque, repito, a integração sul-americana tem que se concretizar, e a cultura é o principal veio desta integração porque mexe com a imaginação, a mente e a simbologia de algo fundamental em uma região estratégica do ponto de vista econômico, político, de defesa do meio-ambiente. Corumbá é a capital de um pólo regional fundamental que não se circunscreve ao Brasil, eu acho uma grande iniciativa e vi com os próprios olhos, conversando com as pessoas, essa iniciativa. Também tive o privilégio de passear de barco durante três horas, um passeio fluvial excelente, uma coisa fantástica.


O senhor tem uma grande preocupação ambiental, como vê a questão da preservação do Pantanal?


José Genoíno: Pelo que conheci, claro que eu não fiz uma pesquisa detalhada, mas pelo que eu vi, nós estamos avançando na preservação. O Pantanal é um grande desafio para a preservação, e uma preservação racional que garanta a viabilidade econômica da região, e ao mesmo tempo o turismo ecológico e cultural. O grande problema é que, quando a gente pensa em desenvolvimento econômico, nos temos que trabalhar com critério: o desenvolvimento econômico, social, e auto-sustentável no regime do meio-ambiente. E aqui a gente vê esses três aspectos se combinarem, se articularem. Eu acho muito positivo o que eu estou vendo. 


O senhor é favorável à instalação de grandes empresas no Pantanal?


José Genoíno: Desde que se garanta, com a tecnologia e com recursos, a preservação do meio-ambiente. Porque o Pantanal é uma grande riqueza econômica, cultural, social e geopolítica e nós temos que garantir, com preservação, esses pólos de desenvolvimento socioeconômico. Eu não sou contra essas iniciativas, desde que ela tenha retaguarda, tenha ressalvas fundamentais para que a não gera um processo de destruição.


Por que o espaço do Pantanal no Congresso Nacional é pequeno?


José Genoíno: Eu acho que já teve menos espaço, mas isso agora está crescendo. Hoje, quando se discute uma política de preservação no Brasil, o Pantanal entra. Isso tem que ser colocado como uma questão nacional, com uma prioridade da agenda nacional. Ele tem uma importância geopolítica, de integração e uma importância social. Então nós temos que colocar no mesmo nível da agenda com sustentabilidade ambiental e social. Agora essa é uma questão fundamental porque o problema do Pantanal não pode ser tratado como uma questão regional, mas como questão geopolítica de um modelo do processo de desenvolvimento do país. O Brasil tem que se desenvolver com um modelo que garanta infra-estrutura, desenvolvimento, integração social e preservação do meio-ambiente.


A integração da América do Sul é possível?


José Genoíno: Cada país tem sua particularidade, seu tipo de governo, e eu vejo que a América do Sul vive um momento virtual. Eu estou muito otimista com este processo que vem ocorrendo no continente. Nós temos que respeitar a particularidade de cada região, mas se você olhar o mundo, vai ver que os Estados Unidos vivem numa guerra, uma crise social na África e, tirando os países emergentes da Ásia, particularmente o caso da Índia e da China, a América do Sul vive um grande momento. Momento de enfrentar os seus problemas, de resolver a crise social, e de apostar no crescimento econômico. A América Latina viveu um período de ditadura militar, de repressão. Já viveu também por um período de neoliberalismo selvagem e agora estamos construindo, cada país ao seu modo, uma experiência nova de como fazer a integração social e econômica de forma a se respeitar à identidade de cada país. Eu sou muito otimista no momento em que a gente vive na América do Sul. 


Os governos de Hugo Chavez e Evo Morales não seriam empecilhos para essa integração?


José Genoíno: São governos eleitos que temos que respeitar. Defendemos a autodeterminação dos povos e a não interferência a assuntos internos. Temos que privilegiar a integração, e o Governo Lula tem sido muito firma nesta política. Essa integração tem que se desenvolver no concreto, tem que ser na cultura, nos investimentos, na infra-estrutura. Tem que se dar algo real na vida das pessoas. Sou muito apaixonado pela América do Sul e tenho um sonho de ver esse continente integrado. O Brasil está construindo um caminho próprio e não vamos ditar como deve ser feito neste ou naquele governo. Isso é problema do povo de cada país.



A crise do Senado com o caso Renan Calheiros, presidente da Casa, não afeta o PT, afinal o PMDB é um aliado?


José Genoíno: Em primeiro lugar, a coalizão com o PMDB é fundamental e eu defendo essa política. O governo tem que ter uma maioria estável para aprovar as medidas necessárias, como agora nós temos que aprovar a CPMF e tivemos que aprovar todas as medidas provisórias do PAC. Segundo, essa questão do Senado está extremamente politizada, tem uma queda de braços extremamente politizada. Eu não participo da vida interna do Senado, estou apenas acompanhando e prefiro não emitir juízo sobre a situação específica do Renan com a imprensa e da imprensa com ele. Esse é um problema que o Senado vai avaliar e tomar as decisões que deve tomar. Do ponto de vista do Governo Lula, nós temos uma aliança política. O PMDB participa do governo, está correto de fazer isto, e devemos, inclusive, no processo político, confirmar essa coalizão. Temos uma coalizão de partidos a esquerda como o PCDB, o PSB e o PDT, e temos uma coalizão que vai ao PMDB. Isso é importante e vou defendê-la, mesmo sabendo que toda a frente tem problemas e dificuldades, mas é assim que na democracia a gente governa. Com negociação, com acordos, com os espaços políticos para os partidos participarem do governo.


O senhor é candidato à Prefeitura de São Paulo?


José Genoíno: Não sou candidato. Eu tomei uma decisão de ser apenas deputado. Não sou candidato majoritário, não quero ir para governo e nem voltar para a direção do partido. Sou apenas deputado federal e quero priorizar minha ação hoje com o contato com a militância de base do partido, que é uma coisa preciosa, e com a relação dessa militância com os movimentos sociais.




José Genoíno: Eu não posso emitir um juízo de valor de uma questão regional que eu não domino, não conheço. Prefiro não fazer nenhum juízo sobre esta disputa. Eu tenho, com relação ao Zeca, um conhecimento de longa data e acho que ele fez um grande governo no Mato Grosso do Sul. E na política, a gente tem sempre que partir da idéia de que os problemas têm que ser resolvidos na base do diálogo.


Qual o seu relacionamento com o senador Delcídio?


José Genoíno: Eu o conheço. Conheço os dois deputados federais de Mato Grosso do Sul (Antônio Biffi e Vander Loubet) e conheço o senador Delcídio do Amaral. Para mim são companheiros que estão na luta. Essas questões internas do partido, o PT deve solucionar com bom senso, com cautela e com convencimento. Uma coisa é fundamental: o PT não pode se dividir. Quando ele se divide a gente perde. A gente tem que buscar sempre a unidade do partido.


Que avaliação o senhor faz da postura do senador Delcídio na presidência da CPI Mensalão?


José Genoíno: Eu não vou avaliar porque, como eu era parte daquele processo, prefiro não comentar essa questão especificamente. 


O senhor foi investigado pela CPI pelo caso do dólar na cueca de um assessor parlamentar de seu irmão. Como o senhor se posiciona hoje?


José Genoíno: Eu fui atingido porque era presidente do PT. Eu não cometi nada de ilegal, nem de errado, nada. Os dois empréstimos que eu avalizei estão na prestação de contas do partido e o PT está pagando aos bancos, mesmo depois que eu saí da Presidência. São dois empréstimos absolutamente legais. Aquele episódio com o assessor do meu irmão não teve nada comigo. Você não pode ser acusado porque é irmão de uma pessoa. Onde é que nós estamos? Eu não tenho nada a ver com nada, agora como eu era presidente do partido, eu fui atacado. Hoje eu trabalho na Câmara levando em consideração todas essas lições que eu aprendi. Não foi a primeira vez que eu passei por momentos difíceis na minha vida e soube tirar lições desses acontecimentos. Veja bem, eu não tenho bens; moro na mesma casa, que é um sobrado popular na periferia de São Paulo; não tenho fonte de renda; não me formei porque fui expulso da universidade pelo AI-5; e fiquei dois anos na Guerrilha do Araguaia e fiquei cinco anos como preso político. Em vinte e um anos como deputado federal meu patrimônio diminuiu, meus pais moram no interior do Ceará, trabalham como lavradores e vivem do INSS, de aposentadoria. O único patrimônio que eu tenho em minha vida são meus sonhos, meu ideal de uma sociedade justa, por tudo isso tenho minha consciência tranqüila.


O PT tem nomes para a sucessão do presidente Lula, em 2010?


José Genoíno: É cedo para discutir esta questão. Nossa primeira tarefa é garantir e defender o Governo Lula. Depois fazer as reformas que o PT tem que fazer em seu terceiro congresso e discutir as eleições do ano que vem. Só em 2009 vamos discutir 2010. A política ensina que devemos colocar as coisas em seu devido tempo e lugar sem precipitação. 


Qual avaliação do Governo Lula?


José Genoíno:Eu acho que é o melhor governo da história do Brasil. Temos ainda muito o que fazer. Temos que continuar avançando na diminuição da pobreza e melhorar na distribuição de renda, consolidar a base para o crescimento econômico em torno de 4,5%, 5% ao ano, resolver emergencialmente o problema de segurança pública no país, que é um problema nacional. Articular a segurança pública com programas sociais, e trabalhar por uma reforma tributária e fiscal porque eu acho que a carga tributária está muito alta e temos que buscar uma maneira de racionalizá-la, e fazer a reforma política. Se não for possível nesta legislatura, os deputados e senadores eleitos em 2010 deveriam ter uma função constituinte para votar só os itens da reforma política por maioria absoluta.


O Governo Lula não seria continuidade do período FHC?


José Genoíno: É bem diferente. É só ver o valor do salário mínimo, o índice de crescimento, a taxa de juros, que são uma das menores da nossa história recente, o Risco Brasil também é um dos menores registrados. Portanto, não é mera continuidade da política econômica do governo Fernando Henrique Cardoso.


O senhor é a favor da CPMF?


José Genoíno: Defendo e votei na Comissão de Constituição e Justiça. A CPMF é uma necessidade e o país não pode deixar de recolher o que a CPMF produz. Ela vai para a Saúde, para a Previdência, e parte para os ajustes das contas públicas. No momento atual, não podemos tirar dinheiro da Previdência e nem da Saúde. Também não podemos brincar com o ajuste das contas públicas, considerando a boa saúde fiscal do país para enfrentar esta crise que está ai. Voto a favor da CPMF, mas considero que temos que discutir e diminuir a carga tributária numa reforma estrutural. Se simplesmente deixar de cobrar a CPMF, o país não suportaria este tipo de medida.

 

Terça-feira, dia 21 de Agosto de 2007 às 13:20hs

Diário Corumbaense - Marcelo Fernandes e Rodrigo Nascimento 

25 de Agosto de 2007

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