Opinião

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Carta-resposta ao professor Giannotti

Caro professor Giannotti,
Antes de tudo, quero agradecer-lhe pela carta pública que me dirigiu (Folha, 14/12/03), pois ela elevou o nível do debate que vinha sendo travado em torno da polêmica envolvendo a expulsão de parlamentares do PT. Reafirmo, no entanto, os termos do artigo que publiquei na Folha no último dia 12. Em sua carta, você parece concordar que nos partidos políticos deve existir uma preeminência da decisão democrática coletiva sobre a vontade individual. Mas, a partir dessa concordância, você me atribui uma inferência com a qual não compartilho: afirma que, na medida em que faço a constatação de que os chamados radicais do PT participaram do processo democrático de debate interno e mesmo assim não se submeteram às decisões das instâncias partidárias, teria eu deduzido, por um raciocínio formal, pela expulsão dos mesmos.

É preciso notar que os dissidentes do PT foram expulsos por uma combinação de razões estatutárias e de razões políticas. Ou seja, não foram expulsos simplesmente porque votaram contra a reforma da Previdência, infringindo a disciplina de voto de bancada. A infração da disciplina de bancada legitima estatutariamente a expulsão. Mas não há uma correspondência direta entre infração e pena. Recentemente, oito parlamentares descumpriram decisão do partido, não votando na reforma da Previdência, e foram punidos com uma suspensão de 60 dias. Luciana Genro, Babá e João Fontes já haviam sacramentado uma divergência estratégica com o PT e com o governo. Apenas forçaram a expulsão para provocar um desgaste ao PT e ao governo, com vistas a um acúmulo de forças para formar um novo partido.

No caso da senadora Heloísa Helena, foram feitos vários pactos com a direção partidária, sempre rompidos por ela de forma unilateral. De 25 votações no Senado, ela votou 23 vezes com o PFL e o PSDB, em oposição à bancada petista e ao governo. Então, ela já havia se colocado praticamente fora do PT. O PT vem refazendo seu projeto desde 1991, quando realizou seu 1º Congresso, abandonando as idéias de ruptura e de ditadura do proletariado. Esse processo consolidou-se com o 2º Congresso, em 1999, com a derrota do "fora FHC" e com a aprovação de uma política de alianças amplas. A atual direção e as teses majoritárias que norteiam o partido e o governo foram referendadas por eleições diretas internas, envolvendo todos os filiados. O programa que elegeu Lula presidente aponta para a necessidade das reformas e para uma mudança processual do modelo econômico.

Ao chegar ao governo, de fato, abre-se uma nova etapa no PT. Concordo com você que isso exige cautela e tempo para que cada grupo interno reprocesse seu perfil. Mas esse tempo não pode jogar o partido numa atuação anárquica e fragmentária, em que cada parlamentar possa fazer o que quiser. Isso destruiria o partido e disseminaria a irresponsabilidade para com a tarefa de garantir a governabilidade.
Acredito que a cautela e o tempo estão sendo respeitados. Tanto é que os principais grupos mais à esquerda permanecerão no PT. O próprio grupo de Heloísa Helena, a Democracia Socialista, continua no PT e exerce responsabilidades no governo, em prefeituras e no Congresso. Aliás, penso que a saída dos radicais beneficiará as correntes internas mais à esquerda: elas terão melhores condições de processar o debate estratégico que precisa ser feito, sem as interdições que os dissidentes impunham a elas e ao partido como um todo.

Esse debate já começou. Basta dizer que para os debates do Diretório Nacional dos dias 13 e 14 se inscreveram oito projetos de resoluções que foram publicados na internet pela direção do partido, mesmo antes da reunião. Pretendemos publicizar o debate interno. É esse caminho da cautela e do debate, organizado democrática e coletivamente, que vai permitir a definição dos termos de um novo contrato partidário. Esse novo pacto não abandonará, no entanto, princípios e valores fundantes do PT, tais como: defesa da democracia, da liberdade, da equidade e da integração social, prioridade para as mudanças que beneficiem os mais pobres, novo modelo econômico, defesa da paz e dos direitos humanos e da soberania etc. Em suma, o PT não deixará de ser um partido radical na luta pelo aprofundamento da democracia, ampliação da cidadania e busca da justiça social.

27 de Dezembro de 2003

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