Opinião

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Avanço na reforma agrária

O lançamento do Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA) pelo governo federal representa um avanço na implementação da reforma agrária no Brasil. Mesmo que a meta de assentados definida pelo governo fique aquém da expectativa alimentada pelos movimentos, particularmente pelo MST, ela representa uma conquista e uma realização sem precedentes na história de qualquer governo do passado em nosso país. A viabilização do PNRA sacramenta também o compromisso do PT e do governo Lula com a bandeira histórica da reforma agrária.

Registre-se que a realização da reforma agrária é uma exigência da maioria esmagadora da sociedade brasileira. Todas as pesquisas de opinião indicam que cerca de 76% da população apóia a reforma agrária. O povo e os movimentos sociais podem ter a certeza de que o governo Lula só não fará mais pela reforma por conta dos constrangimentos orçamentários. O PT, por sua vez, mantém-se coerente com o compromisso histórico de apoiar a reforma agrária. É por isso que estaremos sempre junto com os movimentos que empunham essa bandeira e apoiamos o direito democrático de suas reivindicações, desde que elas ocorram nos parâmetros da legalidade.

O compromisso do PT é com a realização de uma reforma agrária ampla, pacífica e negociada, por entendermos que ela é um instrumento fundamental para incluir milhões de pessoas no processo produtivo, na conquista de cidadania e direitos e na integração social. Queremos enfatizar novamente a tese de que o Brasil, pelas suas características regionais e geográficas diversificadas e pela sua extensão, comporta o convívio pacífico de vários modelos de produção agrícola. Comporta a agricultura familiar, a pequena e média agricultura, formas cooperativadas de produção, a produção em assentamentos e o agronegócio. O contexto econômico, tecnológico e cultural do mundo contemporâneo, de certa forma, sinaliza para a adoção de estratégias plurais na produção agrícola. Assim, as várias formas de produção na agricultura devem ser vistas como complementares e não como concorrentes. Se o Brasil souber explorar esse potencial de estratégias produtivas plurais pode fazer disso um trunfo, tanto para a satisfação de suas necessidades internas quanto para o incremento de sua competitividade no comércio internacional.

A pujança agrícola do país e as sucessivas conquistas nos rankings internacionais de produção em várias áreas dependem da manutenção dessa pluralidade de produção na agricultura e da paz no campo. A viabilização da reforma agrária nada mais representa do que o reforço dessa pluralidade e da construção da paz. É desta verdade que devem tomar consciência àqueles que se opõem à reforma agrária. E é em nome desse objetivo integrador e pacificador que o governo não deve permitir o uso da violência para solucionar contendas por terras.

A implementação correta da reforma agrária implica uma forte ação governamental para incrementar um conjunto de medidas, articuladas entre si, tendo em vista os assentamentos, o apoio técnico e creditício aos mesmos, estímulo à agricultura familiar e à pequena e média propriedade, aumento do crédito fundiário, política de regularização fundiária, demarcação das terras indígenas e programas adequados de seguro agrícola. Respeitando a autonomia de cada movimento específico – MST, CPT, Contag, MTL (Movimento Trabalho e Liberdade), MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores), MAB (Movimento de Atingidos por Barragens), MLTS (Movimento de Libertação dos Sem Terra) etc. –, o governo deve negociar as reivindicações singulares e gerais visando construir pactos e consensos pela produção, pela inclusão social e pela paz no campo. Mesmo que existam diferenças de metas e de objetivos, se todos os atores se comportarem democraticamente, é possível que governo e movimentos construam relações de parceria.

A construção de relações de parceria, de diálogo e de civilidade entre governo e movimentos sociais representará também a superação de um déficit histórico na construção de democracia no Brasil. Déficit que consistiu em tratar os movimentos sociais, especialmente os movimentos de luta pela terra, como caso de polícia e não como problemas de natureza política e social legítimos. Essa postura diferente do governo em relação aos movimentos sociais e seu engajamento pró-ativo na busca de uma solução integradora desses movimentos do ponto de vista social, econômico e político é uma exigência não só do Brasil, mas de toda a América Latina.

A recente deposição do governo boliviano foi um testemunho veemente de que os governos latino-americanos precisam ser pró-ativos e precisam encarar com urgência as demandas sociais de enormes contingentes populacionais. Se as democracias avançaram do ponto de vista político nesta região, o mesmo não ocorreu do ponto de vista social e do desenvolvimento econômico. O principal desafio do governo Lula, certamente, é o de integrar social e economicamente milhões de pobres e de desbravar um novo caminho de desenvolvimento econômico. A realização da reforma agrária é um dos componentes da superação desse desafio.

22 de Novembro de 2003

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