Opinião

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A reforma partidária

A imprensa deu amplo destaque ao recente troca-troca de legenda por parte de parlamentares, na Câmara dos Deputados. O fenômeno não é novo: a cada nova legislatura, que coincide também com a posse de um novo governo, ocorre um intenso movimento de troca de legendas. O índice de trocas é alto na Câmara e quase nulo no Senado. Os cientistas políticos explicam esse fenômeno pela tendência ao governismo por parte dos quadros médios das bancadas parlamentares. Ou seja, para os interesses políticos-individuais desses parlamentares é mais conveniente pertencer a uma bancada de um partido governista do que militar na oposição.

Neste ano, marcado pela posse de nova legislatura e de um novo governo, o troca-troca de legendas na Câmara ultrapassou os 20%. Há, contudo, uma surpresa: o PT, maior bancada parlamentar e principal partido da base governista – partido do presidente da República – praticamente não foi assediado por parlamentares interessados na troca de legenda. Um ou outro deputado, eleito por outro partido, poderá entrar no PT, mas isto se dará por conta de afinidades políticas e programáticas. A explicação mais provável para essa falta de interesse de ingresso no PT se localiza nas normas estatutárias mais rígidas que o Partido sustenta, relativas à disciplina de voto e à contribuição partidária dos parlamentares.

Como era de se esperar, os partidos mais afetados pelo troca-troca, são os de oposição: PSDB e PFL. No momento da redação deste artigo, um dia antes do término do prazo para a filiação ou troca de partido para efeito das eleições de 2004, encerrado dia três de outubro, o PFL acusava a perda de 19 deputados dentre os 84 eleitos pelo partido e o PSDB estava perdendo 18 deputados. Em termos absolutos, o PSD que elegeu 4 deputados, o PST que elegeu 3 e o PSDC que elegeu 1, foram os que mais perderam: todos os deputados dessas legendas migraram para outros partidos. Em termos relativos, o partido mais beneficiado foi o PTB, que de 26 deputados eleitos, até o momento, passou para 52. Trata-se de um partido da base governista, o que explica seu poder de atratividade.

A reiteração do troca-troca de legendas por parte de parlamentares, a cada nova legislatura e a cada novo governo, indica que a reforma de alguns aspectos do sistema partidário deve fazer parte de uma eventual reforma política. O objetivo da mudança desses aspectos deve ser o de fortalecer os partidos políticos. Para atacar o problema do troca-troca, o alvo central que deve ser atacado é o da infidelidade partidária.

O conceito de infidelidade se refere ao fenômeno de troca de um partido por outro. Evidentemente que qualquer filiado de um partido deve ter o direito assegurado de poder filiar-se a outro partido. Mas, em se tratando de parlamentar, a relação é diferente. A legislação partidária deveria determinar que o mandato pertence ao partido. O PT já incluiu este princípio em seu estatuto. Mas para que ele adquira validez jurídica definitiva, deveria ser incorporado à legislação partidária. Desta forma, os parlamentares que trocariam de partido, perderiam seus mandatos já que estes pertenceriam dos partidos políticos.

Outro aspecto do fortalecimento dos partidos diz respeito à disciplina partidária. Este princípio afirma a necessidade dos militantes, dirigentes e parlamentares dos partidos de implementarem as decisões das instâncias partidárias, aplicando, inclusive, a disciplina de voto das bancadas. Este princípio não pode e não deve ser inteiramente institucionalizado. Ele se refere mais à estrutura organizativa dos partidos e às normas estatutárias. Não é possível avocar a idéia de um sistema partidário forte, no qual os partidos realmente representem o eleitorado, sem sacramentar o princípio da disciplina partidária, garantindo, sempre, o direito de opinião.

Outro mecanismo que pode fortalecer o sistema de partidos se refere à definição das listas dos candidatos aos cargos legislativos. Atualmente as listas são abertas, o voto é nominal no candidato. Um sistema de lista fechada ou de lista mista favorece o fortalecimento dos partidos. O sistema de lista mista, no qual metade dos candidatos seria definida por um ordenamento hierárquico decidido pelo partido e metade dos candidatos se elegeria pelo atual sistema de lista aberta, pode agregar uma vantagem. Ao mesmo tempo em que se fortaleceria a prevalência da escolha partidária sobre a escolha individual, o eleitor teria a possibilidade de indicar o candidato de sua preferência.

O fato é que existem algumas combinações que podem ser feitas para melhorar o sistema atual. Acrescente-se a tudo isso, a necessidade da adoção do financiamento público das campanhas. Mas para que o financiamento público das campanhas adquira coerência, é necessário definir que os mandatos pertencem aos partidos.

02 de Outubro de 2003

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