Opinião

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O PT e a taxação dos inativos

A proposta de taxação dos inativos a partir do piso de R$ 1.058, contida na reforma da Previdência encaminhada pelo governo ao Congresso, vem causando polêmica na base governista, no Congresso e na sociedade. Alguns poucos parlamentares do PT chegam a argumentar que se trata de uma imposição do FMI e que vai contra uma suposta posição histórica do partido.

Quanto à primeira imputação, trata-se de uma fantasia e de mero argumento de retórica para justificar comportamentos e interesses políticos próprios e para combater a proposta do partido e do governo. A necessidade da taxação dos inativos foi uma conclusão construída, democraticamente, no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e nas articulações entre o presidente Lula e os governadores de todos os Estados. A necessidade de taxação dos inativos transpassa a própria dinâmica situação-oposição e tem amplo apoio na sociedade, como mostram as pesquisas de opinião pública.

Mas, para além do consenso, a taxação dos inativos é um imperativo de responsabilidade e de justiça social. De responsabilidade porque, sem a taxação, o sistema previdenciário, principalmente o dos Estados, estará ameaçado de insolvência. Não existirão recursos para bancar as aposentadorias. Não serão discursos e petições corporativas insustentáveis que bancarão as aposentadorias futuras, mas recursos concretos garantidos por propostas responsáveis e exeqüíveis. As reivindicações corporativas não podem impor um peso insuportável ao Estado e aos contribuintes. Devem-se enquadrar dentro do justo e do possível.

A taxação dos inativos é uma determinação do princípio da justiça social porque o déficit previdenciário do País alcança a cifra de R$ 56 bilhões, sendo os principais responsáveis por esse elevado déficit alguns grupos especiais, relativamente pequenos, de aposentados do setor público. Basta dizer que a média dos benefícios pagos aos aposentados do setor privado, composto por 21 milhões de pessoas, é de apenas R$ 389,14. Isso significa que a grande maioria desses aposentados não será taxada porque se situa num patamar bem abaixo do limite de isenção, que é de R$ 1.058. E, tendo em vista que cerca de 85% dos apenas 952 mil aposentados do setor público recebem em torno de R$ 2 mil, pagarão a taxação de 11% sobre R$ 950, dado o limite de isenção. Assim, serão verdadeiramente taxados aqueles que recebem altos benefícios.

A taxação terá, dessa forma, um efeito distributivo, princípio muito caro a uma política reformadora de esquerda. Será uma contribuição solidária dos aposentados para com o sistema e a sociedade, já que, ao proporcionar uma diminuição do alto déficit previdenciário, permitirá que o Estado invista mais em outras áreas sociais mais carentes, no combate à pobreza e na geração de desenvolvimento e emprego. E, ao se estabelecer o piso de isenção de R$ 1.058, a taxação não incidirá nem anulará a função distributiva que a própria Previdência vem cumprindo no Brasil.

Quanto à elevação da idade mínima para a aposentadoria, outro tema polêmico, trata-se de uma medida necessária. A elevação da expectativa de vida das pessoas é um dos fatores que aumenta o déficit da Previdência. Ou seja, na medida em que as pessoas vivem mais, cria-se uma defasagem entre o tempo em que elas contribuem e o valor total de benefícios que recebem. E, na medida em que a média de vida das pessoas subiu e tende a continuar subindo, garantir aposentadorias aos 48 anos para as mulheres e aos 53 para os homens significa garantir aposentadorias para pessoas com plena capacidade produtiva. Num número crescente de países, as mulheres se aposentam aos 60 anos e os homens, aos 65. Na Europa se ventila até a possibilidade de se fixar a aposentadoria aos 70 anos. A proposta de reforma do governo preserva, para aqueles que começam trabalhar cedo, o direito à aposentadoria aos 30 anos de contribuição para as mulheres e 35 para os homens.

O argumento, levantado por alguns, de que a não-taxação dos inativos é uma posição histórica do PT não se sustenta. Em primeiro lugar, porque o partido nunca havia feito, até agora, uma discussão aprofundada sobre o tema. Em segundo lugar, porque é legitimo que, ao assumir responsabilidades diferentes, ao assumir responsabilidades de governo, o partido corrija e mude posições táticas em relação a determinados temas. Mudanças táticas são factíveis nas ações partidárias e não há incoerências nesses procedimentos.

O que a direção do PT quer é garantir a unidade de ação do partido. Não é possível tolerar um partido de governo em franca oposição às políticas do governo. Quem perde numa circunstância dessas são a sociedade e a eficácia governamental. A vontade do eleitorado determinou ao presidente Lula e ao PT, nas urnas, a responsabilidade de governar. A vontade popular reservou, também, a outros partidos o papel de oposição. Desta forma, para ser democrático e respeitar a vontade do eleitor, não é possível fazer oposição ao governo e, ao mesmo tempo, permanecer no PT.

10 de Maio de 2003

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