Opinião

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Começa o Governo Lula

Luiz Inácio Lula da Silva assumiu a Presidência da República imantado por dois emblemas: o da esperança e o da mudança. Com uma festa popular sem precedentes na história das posses presidenciais e com uma expectativa positiva de 76% da população acerca do desempenho do novo governo, a responsabilidade que pesa sobre Lula, o PT e seus aliados deve ser dimensionada por essa enorme esperança.

Num país carente de líderes e heróis, a saga de Lula, que começou em Guaranhuns (PE) e terminou em São Bernardo do Campo, sua história singular de dificuldades e desafios, sua ascensão como líder sindical, sua projeção na política e, finalmente, sua vitória nas últimas eleições, são alguns dos fatores que projetam nele uma carga extraordinária de esperanças. As parcelas trabalhadoras, pobres e excluídas da sociedade brasileira identificam em Lula seu legítimo representante, depósitário da capacidade de promover as possibilidades de uma vida melhor.

Para além do carisma pessoal de Lula, o povo identifica nele o potencial de realização de promessas que os políticos oriundos das elites sempre fizeram e nunca cumpriram. Esse povo, acostumado ao trabalho duro e ao sofrimento, vê no Presidente e no PT, não só a possibilidade de uma vida melhor, mas também a última chance de acreditar na política e nos políticos. O desencanto e a descresnça com a política não é algo que nutre apenas a alma cética de intelectuais e jornalistas. O povo, com seu humor e suas tiradas, também vem alimentando uma longa história de descrenças.

Um dos méritos da vitória de Lula foi o de restaurar a crença na esperança e na mudança. É como se a sociedade estivesse sendo energizada por uma onda positiva e otimista, orientada pelo sentimento de que o Brasil pode dar certo. Agora é preciso que esse sentimento se transforme em atividade e mobilização social em torno das tarefas e dos desafios das mudanças. O governo precisa agir com competência e racionalidade para poder liderar, conduzir e coordenar todo esse manancial de expectativas e otimismo que vibra na sociedade.

A tarefa não será fácil. No discurso de posse, Lula deu ênfase à idéia de que foi eleito para promover a mudança. Mas pôs acento, também, na idéia de que as mudanças são um processo, não vêm de um golpe só, e de que precisam da participação da sociedade. É por isso que é necessário conter a ansiedade, pois, dar-lhe vasão pode frustrar as mudanças e extraviar os caminhos. É preciso dar crédito aos compromissos, aos processos e ao tempo. É verdade que as mudanças no Brasil têm e devem ter um sentido de urgência. Mas só a capacidade de liderança, os processos, a perseverança e o tempo podem produzi-las.

O presidente deixou claro que a centralidade do novo governo será a área social, o combate à fome, ao desemprego, à corrupção e à impunidade. A administração da economia, que ganhou o status de prioridade no governo anterior, agora terá que ser gerenciada com responsabilidade e competência para servir a sociedade. Desta forma, a economia deixa de ser um fim em si mesmo para tornar-se um meio a serviço da sociedade, a serviço de uma vida melhor e mais justa. Controlar a inflação, racionalizar o gasto público e promover o desenvolvimento econômico, serão medidas e meios que devem se traduzir em benefícios para as pessoas, para o trabalho e para a produção.

A formação do Ministério procurou representar, não apenas os partidos que apoiam o governo, mas o caráter pluralista da sociedade. E o apelo de Lula para que o ajudem a governar, porque a responsabilidade não é só dele, deve ser entendido como um novo método de governo. O novo governo não decidirá e nem implementará as decisões sozinho. Será um governo compartilhado com o Congresso, com os partidos e com a sociedade civil. Será um governo democrático e atento às aspirações e reclamos da opinião pública. Será um governo que coordenará processos e chamará a sociedade para debater. Será um governo da humildade, que saberá reconhecer erros e corrigir rumos, quando necessário.

O governo Lula, ao mesmo tempo que terá de operar com as noções de processos e continuidades históricas, deverá agir com uma pretensão refundacional. Sem negar avanços que foram consignados em governos anteriores, é preciso ter consciência de que nas áreas da justiça social e distribuição de renda e riqueza e nas questões relativas ao estímulo da participação democrática e cidadã, ao papel do Brasil no mundo, ao combate aos privilégios e à impunidade, ao controle da corrupção e do desperdício, à integração racial e da promoção da mulher, à qualificação educacional, cultural e profissional, à inovação produtiva e tecnológica, à facilitação de oportunidade para os jovens, entre outras, há uma nítida necessidade de imprimir uma orientação refundacional. São essas áreas e questões que traduzem, nos dias de hoje, os bloqueios históricos do desenvolvimento e da grandeza do Brasil e de seu povo. Se o governo Lula, o PT e seus aliados não cumprirem essa missão reformadora e refundadora, terão falhado no seu projeto e no seu destino.

04 de Janeiro de 2003

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