Opinião

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A identidade e os desafios do PT

Ao completar 24 anos de existência, o PT, por ter se tornado partido de governo, enfrenta novos desafios. Antes de abordar alguns desses desafios é preciso dizer que, ao longo de sua história, o PT sempre fez política sem a presunção de um saber absoluto, sem a "verdade" ossificada dos dogmas que caracterizou tantos outros partidos. Trabalhando com as idéias de valores e de projeto como guias da ação, o PT evitou cair na armadilha de antecipar o futuro no presente, compreendendo que o mundo dos seres humanos e da política é constituído de possibilidades abertas e de realidades provisórias. Nestes termos, o projeto do PT é uma alternativa disputada entre entre outras, sem nenhuma certeza absoluta de sua realização. Vale a pena lembrar, como muito bem atestaram Max Weber e Hannah Arent, que a ação política se reveste de um caráter imprevisível. Isto não anula, no entanto, a necessidade de que os partidos e os indivíduos políticos tenham projetos. São esses projetos, por expressarem desejos e fins, que configuram a dimensão ética da política.

Os críticos do PT, ao sustentarem que o Partido perdeu a identidade ao assumir o governo, parecem não compreender essa natureza provisória da política. O PT mantém uma fidelidade irrenunciável aos valores humanísticos e civilizatórios que estão na sua origem. Mantém também uma fidelidade irrecorrível à condição de ser um partido de esquerda, dimensionada pela sua história e pelo seu compromisso de lutar por mais igualdade e justiça. Mas do ponto de vista político e do seu programa, o PT, se quiser perdurar como um partido relevante, precisa ser consoante com sua contemporaneidade, atualizando seus conteúdos, seus métodos, sua forma de agir e de pensar. Os críticos do PT o criticavam no passado por conta de uma suposta ortodoxia ideológica. E o criticam hoje, por conta de um suposto abandono de identidade. Estavam enganados no passado quanto o estão hoje por não perceberem que o PT se inscreve na modalidade de uma esquerda nova, democrática e pluralista, mas fiel a valores básicos.

O principal desafio do PT, neste momento, consiste em viabilizar um novo modelo de desenvolvimento sustentável, com distribuição de renda e geração de emprego. Conexo a esse objetivo e num patamar não inferior estão os objetivos do aprofundamento da democracia e da inserção soberana do Brasil no mundo globalizado. A viabilização de um novo modelo de desenvolvimento econômico e social implica numa redefinição estratégica, relacionada a uma série de fatores inerentes ao desenvolvimento. Dentre esses fatores destaca-se a necessidade de consolidar e integrar as cadeias produtivas, de apostar em setores industriais com potenciais competitivos e de inovação produtiva, de estruturar pólos econômicos regionais de desenvolvimento, de incrementar o conhecimento, a pesquisa e a tecnologia com vistas a aplicar um choque de valor agregado à produção brasileira e de exponecializar ainda mais o comércio exterior integrando-o com o crescimento do mercado interno de massas.

Este, em síntese, é o projeto inovador de desenvolvimento econômico e social do Brasil que o PT vem sustentado. Sua viabilização não se processa da noite para o dia. Exige que se constituam uma série de condições prévias como, um novo marco regulatório, uma nova institucionalidade adequada para o crescimento da micro-economia, maior oferta de crédito, recuperação da capacidade de investimento do Estado em infra-estrutura e criação de um ambiente favorável ao investimento privado. Para viabilizar esse projeto, o Brasil precisa de uma nova articulação institucional, capaz de dar conta da necessidade de coordenação das diretrizes e dos instrumentos de desenvolvimento.

Outro desafio inegociável do PT consiste em manter-se como um partido identificado com a luta pela inclusão social, pela distribuição de renda e pela constituição de cidadania. Seu enraizamento nos movimentos sociais é essencial para a manutenção dessa característica. O PT sabe que o êxito dessa tarefa dependerá de uma adequada combinação de lutas sociais com lutas institucionais. Os movimentos sociais, nesse sentido, não podem perder a perspectiva de sua autonomia e o senso de seus objetivos. Desde as primeiras administrações em prefeituras, o PT procura implementar programas sociais redistributivos com a finalidade de atenuar a exclusão social.

O terceiro grande desafio do PT visa alargar o caráter republicano e democrático do poder público. Por isso, lutamos para criar, através de reformas institucionais, mecanismos de transparência e de controle social do Estado e de participação da sociedade nas decisões do poder. Reformas como a política, do Judiciário e da gestão administrativa se inscrevem nesta perspectiva. Governar reformando as instituições deve ser a prática constitutiva do PT como um partido do reformismo radical.

Por fim, o PT tem também o dever de promover um debate sobre os rumos da esquerda, partindo da pressuposição de que os países estão mundialmente integrados e de que cresce a interdependência entre Estados, sociedades, economias e culturas. A busca de uma alternativa humanizadora e civilizatória para a humanidade, que a esquerda deve promover, se faz tanto mais urgente quando se constata a irrecuperabilidade dos parâmetros da antiga esquerda ortodoxa e da crise do ideário neoliberal. A compreensão da especificidade e da complexidade do mundo de hoje deve fazer do PT um partido que se transforma com a transformação da realidade, mas que se mantenha fiel à luta pelos Direitos Humanos, pela liberdade, pela justiça e pela igualdade.

14 de Fevereiro de 2004

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