Opinião

Versão para impressão  | Indicar para amigo

O Desafio do Desenvolvimento

O ano de 2004 deverá ser, para o governo e para a sociedade, o momento de encontrar o caminho do desenvolvimento econômico e social. Frise-se aqui o termo "encontrar", conferindo-lhe dois sentidos: o sentido da retomada e o sentido de um novo modelo de desenvolvimento. No sentido da retomada, é preciso reconhecer as dificuldades que o Brasil vem encontrando para crescer nas últimas décadas. Nos anos 1990, particularmente nos dois mandatos do governo do PSDB, se acreditou que com a implantação do modelo liberal de reformas econômicas o país reencontraria o caminho do crescimento. A crença não se confirmou. O crescimento foi pífio.

Lula e o PT venceram as eleições desfraldando a bandeira do desenvolvimento e da geração de empregos. Em 2003, dadas as condições de crise macroeconômica herdadas, impuseram-se sacrifícios e o crescimento não veio. Setores políticos e sociais reivindicaram durante todo o ano a queda da taxa de juros. O que se constata hoje é que a queda dos juros é uma condição necessária para a retomada da atividade econômica, mas não suficiente para o desenvolvimento sustentado.

O debate que necessita ser intensificado diz respeito ao modelo de desenvolvimento e às condições que podem proporcioná-lo. Preliminarmente, o desenvolvimento precisa ser qualificado no seu conteúdo e na sua dimensão. Quanto ao conteúdo, ele não deve restringir- se ao crescimento quantitativo da economia. No passado, o Brasil cresceu. Mas não distribuiu renda nem promoveu a integração social. Por isso, o novo modelo, além do crescimento quantitativo, deve distribuir renda e gerar empregos.

Quanto à dimensão, cabe perguntar qual é o tamanho do crescimento que a sociedade almeja e o país precisa. Se partirmos do pressuposto de que hoje as economias nacionais estão integradas à economia global e se olharmos para o crescimento dos países emergentes, como China, Rússia, Índia e outros, e para a necessidade de buscar uma ordem econômica mundial mais simétrica, e se olharmos ainda para as necessidades internas, chegaremos facilmente à conclusão de que o Brasil deve crescer num patamar não inferior a 4% ao ano. Esta é uma questão que diz respeito ao lugar que a sociedade deseja para o Brasil no mundo. Se quisermos que o Brasil seja uma potência significativa e não perca a corrida dos países emergentes, devemos querer que o nosso crescimento seja de 5% a 6% ao ano.

É verdade que uma estratégica de desenvolvimento requer condições macroeconômicas adequadas, investimentos em infra-estrutura, marco regulatório pertinente, segurança jurídica, incidência tributária moderada na produção, no trabalho e nas exportações, estímulos à competitividade e à inovação, investimentos em ciência e tecnologia, etc. Mas na situação do Brasil e o que a experiência dos países bem-sucedidos em desenvolvimento ensina é que é insuficiente que o poder público se limite a fornecer condicionalidades positivas para o desenvolvimento.

Sem advogar uma retomada do intervencionismo estatal na economia, parece ser necessário que o Estado tenha uma inserção mais proativa na definição de um modelo de desenvolvimento, ao menos em três aspectos: na identificação dos problemas e das áreas potencialmente estratégicas do desenvolvimento; na definição de políticas públicas de estímulos; e na coordenação ativa de processos organizadores e estruturadores do desenvolvimento. Nenhum desses três aspectos pode ser implementado sem uma interação com os agentes econômicos e sociais. Localiza-se no terceiro aspecto a maior dificuldade que o Brasil encontra para uma ação governamental eficaz, orientada para o desenvolvimento.

O que se requer é uma ação de governo capaz de identificar e coordenar a organização produtiva de áreas potencialmente estratégicas, competitivas e inovadoras do desenvolvimento. Os instrumentos públicos (ministérios, BNDES, bancos públicos, agências, etc.), os estímulos e os incentivos governamentais e as diretrizes de política industrial, de ciência e tecnologia e de educação devem ser coordenados a partir de uma visão de conjunto dos objetivos estratégicos do desenvolvimento.

Para exemplificar, o Brasil apresenta um potencial significativo para se tornar um pólo competitivo na produção de software. Não há, no entanto, uma ação política integradora e estruturadora dessa área e dela com outras áreas da produção. Uma política adequada para essa área poderia reverter o resultado da balança comercial do setor de software, incrementar o mercado de trabalho interno de alto valor agregado e voltar o setor para competir no mercado externo. Na área da aviação ocorre mais ou menos a mesma coisa: a coordenação governamental deveria ser capaz de articular as necessidades da política de defesa (FAB) com a perspectiva de competitividade da produção de aeronaves para fins comerciais e de insumos tecnológicos para outras áreas como meteorologia, agricultura, medicina, indústria espacial, software e hardware, etc. Assim, o sucesso externo de empresas como a Embraer deveria estar articulado com uma política interna de desenvolvimento.

Em suma, o poder público precisa exercer uma ação catalisadora de processos tendo em vista a produção de conhecimento e tecnologia, de inovação e competitividade produtivas, de estruturação das cadeias produtivas e de identificação e estímulo a novos nichos produtivos. Articular os instrumentos públicos existentes em torno de diretrizes comuns e criar novos instrumentos necessários são medidas urgentes para que a ação governamental orientada para o desenvolvimento se torne, de fato, ativa.

03 de Janeiro de 2004

Busca no site:
Receba nossos informativos.
Preencha os dados abaixo:
Nome:
E-mail: