Opinião

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Eleições 2006

Manifesto aos Petistas

A vitória de Lula em 2002 representou uma inflexão histórica no Brasil. A questão social passou a fazer parte das prioridades e a integrar a estratégia de desenvolvimento, após anos de prioridades quase que exclusivamente restritas à estabilização da economia. Esse novo modelo pode ser sintetizado pelos seguintes pressupostos: crescimento econômico com geração de emprego, distribuição de renda e sustentabilidade ambiental; papel ativo do Estado na construção de um projeto estratégico de desenvolvimento do país; incremento dos setores produtivos intensivos em tecnologia, inovação e conhecimento; expansão e melhoria da qualidade do ensino; políticas externa e de comércio internacional ativas; investimentos nos setores estratégicos da infra-estrutura e logística; destinação de crédito para os setores produtivos, principalmente para os pequenos e médios empreendimentos e para a agricultura familiar; busca de um novo marco regulatório submetido a mecanismos de controle social; e estabilidade econômica, com a busca do equilíbrio fiscal e da redução da dependência financeira do país, especialmente da redução da relação dívida/PIB. Um modelo que implica novas relações do Estado com a sociedade e a inclusão econômica e social, com políticas e ações destinadas a atender às necessidades básicas do nosso povo e responder aos desafios da época de incertezas em que vivemos.

Nossa estratégia de viabilização do desenvolvimento sustentado visava à aplicação de uma política econômica que outorgasse um sentido econômico às políticas sociais. Isso era o nosso pressuposto para viabilizar o desenvolvimento com geração de emprego e distribuição de renda, combinando estabilidade e crescimento. E o governo Lula está alcançando esse objetivo. A estimativa é que neste ano deve-se criar 1,4 milhão de empregos formais, elevando a 5 milhões o número de vagas criadas nos quatro anos de mandato, numa média anual de 1,25 milhão – num contraste brutal com a média de 87,5 mil durante os oito anos de governo tucano-pefelista – e diminuindo consideravelmente as taxas de desemprego de 11,3%, do governo FHC, para 8,3%. O governo Lula foi eleito para combater a pobreza, diminuir as desigualdades e promover o desenvolvimento econômico. A transferência de renda teve um salto inédito: foi de 2,3 bilhões, com FHC, para 7,1 bilhões de reais no nosso governo. O salário mínimo, que dava para comprar 1,3 cestas básicas no governo passado, teve um ganho real de 25,3% e agora equivale a 2,2 cestas. A participação dos mais pobres na renda nacional foi de 14,4% para 15,2%. E um dos dados mais significativo e que elucida o caráter do governo Lula é o que ocorreu no ano de 2004, quando o crescimento da renda dos mais pobres foi de 14,1%, enquanto a renda das parcelas mais ricas da população cresceu 3,5%. Esses dados demonstram que o sentido do governo Lula é o da inclusão e da emancipação social, é o da participação e da conquista de direitos, é o da vitória da dignidade daqueles que nunca tiveram voz e vez na história do Brasil. É essa revolução pela cidadania, uma revolução social, pacífica, fundada no diálogo e na participação, que está fazendo o Brasil mais justo, o povo mais forte e feliz.

Não devemos ter dúvidas de que a escolha que faremos nas eleições de outubro será entre a possibilidade de avançar mais por esse caminho ou o retrocesso da reciclagem tucana, com suas propostas que resultaram em anos de estagnação e passividade política e que, em São Paulo – estado governado há 12 anos pela aliança PSDB-PFL - o único saldo para além de um “ajuste fiscal” foi o nascimento e a consolidação de um estado paralelo e criminoso, cuja força e impertinência ficaram demonstradas no dia 15 de maio, quando o PCC assumiu o controle de São Paulo. Será uma escolha entre um modelo econômico que supere o “apartheid” social e coesione as relações sociais ou uma concepção em que a sociedade é irremediavelmente dividida entre incluídos e excluídos: para os primeiros - que pagam impostos - a dignidade; para o resto, a barbárie e o vale-tudo.

Será uma escolha entre uma visão de que o Estado deve ser um ente ativo e definidor de prioridades e agendas ou um Estado inerte, submetido aos interesses do “mercado” e sempre disposto a exigir sacrifícios e destruir conquistas para fazer os “ajustes” necessários a fim de tranqüilizar esse “mercado”. É entre o orgulho de ter um trabalhador comandando o Brasil – sendo considerado um exemplo de governante – ou o revanchismo de uma elite que quer de volta seus privilégios.

É este o motivo da radicalidade do ataque tucano-pefelista. E é exatamente por isso que devemos enfrentá-la munidos de um programa claro que indique nossa intenção de avançar ainda mais, afirmando que se trata agora de - com ousadia e responsabilidade - aprofundar o processo de inclusão social e distribuição de renda, centrado no crescimento econômico.

O nosso desafio é teórico e prático e diz respeito à necessidade de percebermos que, na democracia, a construção de um projeto de desenvolvimento é processual e implica o aperfeiçoamento continuado das instituições do país e o fortalecimento constante das instituições da sociedade civil. Reformar as instituições da política era uma necessidade que não poderíamos ter secundarizado, pois sempre tivemos a convicção que para mudar o Brasil era necessário reformar as instituições e o Estado. Em função disso, a Reforma Política deve ser encarada como nossa prioridade máxima e devemos, ao restituir o seu conteúdo estratégico, propor novos métodos para a obtenção da estabilidade política, democratizando cada vez mais as diversas dimensões da governabilidade, fortalecendo os mecanismos de diálogo com a sociedade e aprofundando as relações com os movimentos sociais organizados. Essa nova postura deve também incluir uma reforma administrativa do Estado, melhorando o diálogo com os servidores públicos dentro de uma visão profissionalizante e republicana, incorporando a idéia de que suas reivindicações devem estar submetidas ao esse projeto estratégico. A criminalização do movimento social deve ser constantemente negada, bem como a radicalização corporativista.

Devemos manter e avançar na concepção de que a política econômica e as políticas sociais são fatores interdependentes de um mesmo projeto estratégico. Se é verdade que programas distributivos como o Bolsa Família têm uma dimensão compensatória por incidirem sobre as carências imediatas das pessoas pobres, têm também uma dimensão estruturante inegável, na medida em que estimulam a atividade econômica local e estão vinculados a obrigações afirmativas de cidadania.

Além disso, integram um conjunto de políticas de inclusão social, cujos diversos programas se inter-relacionam, como o micro-crédito, a economia solidária, a desoneração da cesta básica, o fortalecimento da agricultura familiar, PRONAF, PROUNI, etc.
No entanto, a superação da dependência será certamente menos provável e muito mais difícil num ambiente de violência e insegurança. É necessário associar, aos programas sociais, políticas públicas de segurança, de educação, saúde, e ao funcionamento da justiça, garantindo a aplicação da Lei.

Os acontecimentos de maio passado, em São Paulo, expõem de forma trágica a seqüência de equívocos das políticas de segurança implantadas no Estado. Defendemos a implementação das diretrizes do Programa Nacional de Segurança Pública, a criação de um sistema integrado entre União, estados e municípios, investimentos na prevenção, inteligência e qualificação das polícias.

Da mesma forma, o Brasil deve continuar sua busca de um diálogo internacional, de negociações e de formação de forças em torno do um novo programa de reforma nas relações econômicas internacionais, com vistas a incluir, de modo mais atuante e significativo, os países em desenvolvimento no atual processo de globalização, reorientando o seu sentido. O governo Lula conseguiu alterar a agenda internacional, com propostas de instâncias e mesas de negociação mais flexíveis e realistas, em que o objetivo central é criar as bases para garantir um equilíbrio justo entre nações tão diferentes. Um exemplo desse tipo de iniciativa foi a mudança no cronograma da ALCA, que, no seu formato original, atendia quase que exclusivamente aos interesses dos Estados Unidos. Alem disso, foi a determinação do nosso governo e, em especial, do presidente Lula, que chamou a atenção do mundo e mobilizou líderes e personalidades mundiais para a urgência de um projeto global de combate à fome.

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Com 26 anos de idade, com a experiência de comandar o país por quatro anos e depois de ter sobrevivido a uma de suas maiores crises, o PT está sendo convocado a desenvolver mais intensamente suas capacidades de governar, melhorando a qualidade de sua contribuição ao país e interagindo mais com os setores que representa. Só assim estará apto para processar as mudanças que a sociedade espera. Só assim conseguirá opor-se de forma qualificada aos seus adversários políticos, que combatem o partido, agora com intensidade redobrada. A complexidade dos desafios do Brasil, da esquerda e do PT, a contundência da luta política e a necessária autocrítica em relação à crise de 2005 nos obrigam a um maior preparo e formação, a uma reflexão profunda sobre como fazer política, resgatando normas partidárias e criando mecanismos de controle coletivos, democratizando os canais internos de comunicação e revalorizando a militância partidária e social.

Por outro lado, o Parlamento deve ser visto pelo PT como uma instância privilegiada da disputa política, pois ele congrega dois movimentos: o da luta social e democrática da sociedade e o da ação política de Estado. É na dimensão parlamentar que estão sintetizadas as responsabilidades de ser governo e a capacidade de se construir uma oposição fiscalizadora e democrática. Ao buscar o poder como instrumento do bom governo e de transformação política e social, as ações do PT deveriam confluir também para aprimorar o caráter republicano e democrático do Estado. O PT deve reafirmar os seus princípios republicanos e sua luta pela ética não só como conseqüência e aprendizado da crise do ano passado, mas também porque, em vários momentos dessa crise - e em razão de diversos interesses - não foi a ética nem o espírito republicano, e sim a falta deles que comandou comportamentos da oposição e de setores da mídia.

Deverá ser uma obrigação do PT negociar com as demais forças políticas um compromisso explícito de fortalecimento dos partidos e da representação parlamentar, expresso em exigências de fidelidade partidária, de financiamento público das campanhas eleitorais, de votação em lista e do fim do voto secreto no Parlamento. E ainda valorizando os compromissos com os programas e com as plataformas partidárias, buscando um verdadeiro equilíbrio republicano dos poderes.

Como partido que defende incondicionalmente a diversidade da vida social e as liberdades civis, o PT entende que a defesa incondicional da democracia, do Estado de Direito e das liberdades individuais e de seu posicionamento contra qualquer tipo de censura e discriminação dá consistência ao seu programa.

Devemos partir, portanto, do pressuposto de que o valor da liberdade deve se constituir no valor supremo de qualquer sistema político e estar inserido no nosso projeto de pais. A esquerda deve reconhecer o caráter conflitivo da natureza humana, o pluralismo de desejos, interesses, ideais e valores e a conseqüente expressão plural da vida política nas sociedades. Por isso é que reafirmamos nossas bandeiras históricas e o nosso compromisso com de temas relacionados aos direitos humanos, civis e de comportamento, como a luta das mulheres e dos negros, a liberdade de orientação sexual, o direto dos índios, contra qualquer tipo de censura, etc.

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Na Carta aos Petistas (www.genoino.org) que publiquei em maio último, exponho minha visão da crise, avalio minha participação, minhas responsabilidades e meus erros, discuto as conseqüências daquele período para o futuro do PT e alinhavo algumas conclusões de caráter propositivo. Afirmo que minha militância política só tem sentido se for por uma causa, por um ideal. Da mesma forma, só posso resgatar minha biografia de deputado combatente das causas da esquerda e de militante sonhador na medida em que possa inseri-la em um projeto de futuro.
E é essa possibilidade que me autoriza a reivindicar o voto dos eleitores paulistas, para retornar à atividade política como um de seus representantes na Câmara dos Deputados.

A minha história parlamentar foi caracterizada por mandatos com opinião acerca das principais disputas políticas e de temas da conjuntura. Foram mandatos que, num diálogo constante com a opinião pública e com a militância petista, sempre manifestavam um posicionamento político claro e, às vezes polêmico, seja em função de iniciativas de caráter parlamentar, como foi a apresentação de um projeto pela legalização do aborto ou pela proposição de uma emenda constitucional tratando da liberdade de orientação sexual; seja na defesa de idéias e concepções firmes, como foi todo envolvimento nas questões relativas ao papel das Forças Armadas, na defesa de uma Reforma do Sistema Judiciário entre outras; seja na luta por conquistas sociais importantes como foi a mobilização pela Lei do Direito Autoral. Foram cinco mandatos que interferiram na disputa política real, não só no interior do Congresso Nacional, mas também no partido e na sociedade.

Habituado com as negociações parlamentares e com um histórico de deputado de oposição, enfrentei uma campanha para governador e depois assumi a tarefa de presidir o PT. Os 30 primeiros meses do governo Lula foram marcados por muitas dificuldades políticas, determinadas por nossas novas responsabilidades. Foi um período não só inédito, mas complexo.

Foram momentos que exigiam o máximo da nossa capacidade de negociação e do nosso discernimento político. Desse intenso e dramático período restaram as lições e o aprendizado. Não restam dúvidas que o PT sairá amadurecido dessa crise. No entanto, o partido, e principalmente nós, que estivemos diretamente envolvidos e fomos protagonistas, temos a responsabilidade pública de explicitar aos petistas e à sociedade nossa análise sobre esses fatos. Não passaremos a borracha, não vamos esquecer nem virar a página. E a melhor maneira de fazer isso é, munido dos ensinamentos e do compromisso de materializar auto-criticamente uma nova postura, construir o futuro. De todas as certezas que carrego, a que me sustenta e me define é aquela que afirma que os meus sonhos e minhas causas não sucumbiram. As aspirações e os ideais de toda uma geração podem estar em curso. Por isso é que escolhi o caminho do recomeço. Por isso é que resolvi me submeter ao julgamento do povo e, mais uma vez, tentar um mandato parlamentar. Quero continuar perseguindo os objetivos expostos aqui e seguir pertencendo a esse batalhão de milhares de homens e mulheres que, nas mais diversas e distintas esferas da vida pública, disputam diariamente, palmo a palmo, a possibilidade de mudar o Brasil e o mundo. E é essa a razão que me faz um militante da continuidade do governo Lula.

Julho de 2006

22 de Julho de 2006

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