Opinião

Versão para impressão  | Indicar para amigo

Entrevista

Vivi as torturas do AI-5 e da mídia

para Nélson Gonçalves do Jornal da Cidade de Bauru

O deputado federal e ex-presidente nacional do Partido dos Trabalhadores (PT) José Genoíno não quer mais exercer função de comando partidário e rejeita, inclusive, o papel de exercer liderança na Câmara dos Deputados. Em visita ao Café com Política do JC na última sexta-feira, ele reforçou a defesa contra a denúncia de participação no esquema de corrupção que levou à abertura de processo no Supremo Tribunal Federal (STF) neste mês, comentou que após o episódio decidiu retomar o envolvimento com as bases partidárias e reafirmou críticas à grande imprensa.

Ao falar sobre a depuração petista e os prejuízos do escândalo com caixa 2 do período Marcos Valério, Genoíno diz que sofreu em sua carreira política duas torturas. Uma foi do período de enfrentamento contra a ditadura militar, que inclui enfrentamento por guerrilha no Araguaia. A segunda, na visão pessoal do deputado, foi o papel da grande imprensa na cobertura do escândalo que abalou o PT e o governo. Algum tempo depois, ele aponta injustiça no processo. Leia os principais trechos da entrevista que José Genoíno concedeu ao JC antes de participar de reunião com prefeitos da região de Águas de Santa Bárbara, na sexta-feira passada, em Espírito Santo do Turvo:

Jornal da Cidade -A sociedade está ansiosa pela reforma política. E a questão não é mais de discurso, mas de saber quando os deputados vão votar este tema. Há previsão?

José Genoíno
-Para alguns pontos da reforma política eu vejo condições de ser votado, como financiamento público de campanha exclusivo para as campanhas majoritárias e não para vereador e deputado, porque não foi aprovada a lista ordenada pelos partidos. Também há condições de votar fidelidade partidária, fim das alianças na eleição proporcional, porque o eleitor tem de votar no partido e não no candidato. No meu modo de entender, essas questões devem ser votadas.


JC -Mas e se não entrarem na agenda de votação esses pontos?

Genoíno
- Se não houver maioria para se votar financiamento público, fidelidade, acabar com o suplente de senador, definir melhor a competência do Senado como Casa representante dos Estados e a Câmara como representante da população, eu defendo a tese de que na eleição congressual de 2010 se faça uma consulta à população para que os deputados e senadores eleitos em 2010 possam ter a prerrogativa de mudar a Constituição nos itens da reforma política. É preciso acabar com suplente de senador porque ele representa o Estado. Se ele sai, entra o segundo mais votado do Estado. Mas acho difícil votar este ano para as eleições de 2008. Por isso que, como no ano que vem tem eleição e em 2009 é preparação para 2010, temos de trabalhar com a idéia de que na eleição de 2010 os deputados possam desempenhar esse papel. Em seis meses em 2011, de maneira unicameral, o Congresso votaria os itens da reforma política. O tema mais provável de votar é o da fidelidade partidária. E tem de aperfeiçoar o presidencialismo e corrigir o sistema proporcional. E acho que o melhor é o eleitor votar na lista do partido.


JC -Mas isso tem muita divergência, a votação em lista?

Genoíno
-Em primeiro lugar a sociedade tem mais peso ao votar em lista. Porque ao invés de votar em um, ela vota em 10, 15 e 20 nomes. Segundo, se faz uma lista de candidatos ruins a sociedade não vai votar. E terceiro, é interessante a sociedade votar no programa, no projeto e na proposta política. A gente elege presidente mas não elege maioria na Câmara, elege prefeito, mas sem maioria. E isso distorce e aí precisa leque de alianças que criam problemas aos programas. O sistema de listas é o mais avançado no mundo inteiro e acho que seria revolução no Brasil. Tem de votar também a PEC sobre número de vereadores, porque tem cidades com poucos vereadores e outras com muitos. Tem de corrigir o sistema atual.


JC - O ministro Tarso Genro comentou sobre os casos de denúncia de corrupção, de caixa 2 e do uso irregular de recursos pelo PT no episódio Delúbio Soares, que foi levantada a falsa premissa de “legenda pura” no País que, para ele, não existe. Não foi o PT quem criou essa bandeira sob o conceito moral?
Genoíno
-Em primeiro lugar não há legenda pura em política. Sempre é um erro, que chega a ser autoritarismo na política, fazer julgamento de questões morais na relação partidária. O PT cometeu erros políticos ao chegar ao governo e já prestou conta desses erros. Eu escrevi dois livros fazendo uma avaliação da falta de critério na política de alianças e no financiamento da eleição de 2004 para vereadores e prefeitos. Agora crime, quadrilha, compra de votos, o PT não praticou. Portanto, há idéia de criminalização da política, sem separar o joio do trigo, que é um desvio autoritário, de algumas pessoas que se consideram iluministas, portadoras do bem, para julgar os outros. Isso é um problema que estamos correndo. Não ofereci vantagem para ninguém, não recebi vantagem de ninguém e minha casa é a mesma há 22 anos. Erros políticos de escolhas e opções não podem ser criminalizados. Há autoritarismo nisso.


JC - Mas como tratar então denúncias desse porte?

Genoíno
- Se existem problemas de eleições, vamos discutir no campo da leigslação eleitoral. Se há problemas de um determinado parlamentar com a Receita Federal, como é o caso do Renan Calheiros, vamos examinar a questão da Receita. Agora você criminalizar tudo, achando que é o bem contra o mal, num maniqueísmo autoritário, isso é perigoso para a democracia. Quando o PT estava na oposição eu sempre divergi de exageros de alguns companheiros. Só que os adversários do PT estão fazendo agora com o dobro os exageros. Essa tentativa de criminalizar o PT não está dando certo. O partido foi o mais votado em 2006 e o Lula se reelegeu. Essa bateria da grande imprensa que funciona como um grande partido político, leva a um vale tudo que é ruim para a democracia.


JC - Mas então como fica o papel do STF nessa avaliação do senhor, que recebeu denúncia contra 40 agentes públicos e sob o ambiente da criminalização que o senhor combate? Se ocorreram excessos de fora, o Supremo falhou ao receber as denúncias?

Genoíno
- Na própria atitude do Supremo Tribunal Federal de receber ou não a denúncia, o STF recebeu mas disse que em relação a algumas pessoas não tinha provas, não tinha consistência e que se fosse julgar não condenaria. A mídia tratou do recebimento das denúncias como se fossem condenação e isso é um exagero. Ao retratar os votos, a grande imprensa não desceu a esses detalhes para dar a verdade ao leitor. E amanhã vem a absolvição e vão dizer que é pizza, porque é preciso prova. Tenho absoluta consciência que não vai haver nenhuma prova contra mim. Esse ambiente de pré-condenação da grande imprensa é autoritarismo.


JC - Mas como o senhor inclui as formas irregulares de financiar campanhas, situação ocorrida com o PT e outros partidos? O PT conviveu com esse processo.

Genoíno
- O financiamento de campanha eleitoral só será profundamente corrigido com a legislação e com conta pública. Enquanto tiver financiamento privado, você tem uma relação entre o poder do dinheiro e o poder político. E essa relação gera problemas e atinge a todos os partidos, e o PT foi colocado como alvo. O PT não podia ter feito o financiamento que fez da campanha de 2004. Mas não compramos votos e nem fizemos quadrilha. Mas foram feitos empréstimos não registrados e isso é um erro. Eu não participei desse erro, mas o PT tem de colocar esse erro e prestar contas. Agora, quando vem a cobertura da imprensa, mistura empréstimos legais com ilegais e isso é um vale tudo ruim para o País. Essa é a questão, não separar o que é legal e o que é ilegal. Inverteram a tese do direito, agora todos são condenados até que se prove inocência. Sou radicalmente a favor da liberdade de imprensa, mas critico o monopólio midiático no Brasil.


JC - E como atacar o monopólio midiático?

Genoíno
- A coisa mais importante é valorizar a mídia regional, porque ela é uma maneira de fazer uma espécie de reforma agrária na mídia. A TV pública é fundamental no âmbito dos parlamentos estaduais e municipais é um enorme avanço. Cria um poder no mínimo de guerrilha contra a guerra grande em favor da informação sem sobrecarga de autoritarismo, contra o vale tudo. Eu vivi duas experiências de tortura com isso. Vivi a tortura do AI-5, da ditadura, e a tortura do massacre da mídia sem ter direito de me defender, a tortura da vala comum.
JC - A crítica contra a prorrogação da CPMF não é só pela distorção de uso, por ser mais um tributo para um País que já paga tanto, mas também contra o governo Lula por não ter atuado pelo menos para a redução gradual da alíquota. Agora fica na superfície, não se pode acabar porque afunda as contas. Mas nem o PT e nem o governo atuaram e agora vem a prorrogação...

Genoíno
- Vou ser muito franco. Vou votar pela manutenção da CPMF por uma questão de Estado. O País não pode se livrar desses R$ 40 bilhões, investimento no Bolsa-Família, na Previdência e na Saúde e uma outra parte no equilíbrio fiscal do País. Sou favorável à previsão de queda da alíquota. O ideal é manter a CPMF e a partir de 2010 ir sendo compensada com a diminuição por outros tributos. Nós temos que vincular a discussão da CPMF com uma reforma tributária.

17 de Setembro de 2007

Busca no site:
Receba nossos informativos.
Preencha os dados abaixo:
Nome:
E-mail: