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NOTAS POLÍTICAS
por José Genoino
Esta semana foram realizadas, na Câmara de Deputados, duas reuniões da audiência pública promovida pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) para discutir o Projeto de Lei 1.135/91. Este projeto suprime o artigo 124 do Código Penal (Decreto-Lei 2.848/40) que define como crime o aborto provocado pela gestante ou com o seu consentimento. Este é um tema que, por todas as implicações filosóficas, religiosas e morais, divide os parlamentares em blocos antagônicos. No entanto, o Parlamento tem o dever de tratar dele com a maior seriedade e de forma equilibrada, com o tempo necessário para a reflexão e o convencimento e sem vinculá-lo às disputas eleitorais ou partidárias.
A minha posição sobre a legalização e a descriminalização do aborto é pública desde a Assembléia Nacional Constituinte, vindo a se consolidar, em 1995, no Projeto de Lei nº. 176, que legaliza e regulamenta a interrupção da gravidez no Brasil.
Todos os dados mostram que a criminalização do aborto não evita nem diminui a sua prática. Pelo contrário, nos países onde o aborto não é tratado como crime, onde foram adotadas políticas públicas de defesa dos direitos da mulher, os números de abortos, de internações maternas e de mortes entre as mulheres foram reduzidos drasticamente.
Estima-se que, aqui no Brasil, são realizados mais de 1 milhão de abortamentos e 250 mil internações para tratamento de complicações de aborto inseguro. A clandestinidade e a penalização são o caminho que estimula estes números trágicos. O aborto é uma situação limite para a mulher, que só o pratica numa situação extrema. Por isso, o aborto deve ser um direito da mulher. A decisão de se submeter a ele deve ser unicamente da mulher. É machismo e é patriarcalismo não reconhecer este direito.
Considerar o aborto um crime permite que as mulheres sejam penalizadas para não culpar o Estado por estas tragédias cotidianas. O aborto é um problema de saúde pública que deve ser enfrentado com prevenção, orientação e acompanhamento.
Outra questão importante é afastar deste debate qualquer vínculo a valores religiosos. O que está em pauta é uma relação entre Estado e sociedade, em particular, as mulheres. O Estado brasileiro é laico.
Finalizando, infelizmente estamos vivendo uma época ainda mais conservadora do que a do início dos anos 80. Mesmo a bancada do meu partido é hoje mais anti-aborto do que a dos anos 80/90. Por isso, vou lutar para adiar a votação, porque o assunto ainda precisa de muito debate e porque, se nada mudar, perderemos na CCJ. De qualquer forma, já estou preparando um voto em separado, contrário ao do deputado Eduardo Cunha, relator do projeto.
15 de Julho de 2008