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Projeto de Lei

PL que inclui aluguel e despesas com medicamentos na dedução do IRPF

CÂMARA DOS DEPUTADOS

Projeto de Lei nº 514, de 2007

(Do Sr. Deputado JOSÉ GENOINO)


Acrescenta dispositivos ao art. 8º da Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, “que altera a legislação do Imposto sobre a Renda das pessoas físicas, e dá outras providências”.


O Congresso Nacional decreta:

Art. 1º O art. 8º, da Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, passa a vigorar com o seguinte acréscimo de duas alíneas ao seu inciso II e de um § 4.º ao caput:

“Art. 8º ......................................................................................................
..................................................................................................................
I -
........................................................................................................
II
........................................................................................................
h) ao total anual dos pagamentos mensais referentes a aluguel de imóvel residencial, quando, feita a comprovação mediante os correspondentes recibos, o declarante da respectiva declaração de rendimentos for a única parte locatária no respectivo contrato de locação;

i) às despesas com medicamentos de uso contínuo pelo declarante da declaração de rendimentos anual, quando comprovadamente portador de enfermidade crônica, para cujo controle esse uso seja atestado, anualmente, como indispensável a sua sobrevivência, por médico especialista na área da respectiva doença.

........................................................................................................

§ 4.º A Secretaria da Receita Federal, por ato próprio, adotará as medidas necessárias ao controle administrativo das informações econômico-fiscais relativas aos contribuintes beneficiários das deduções previstas nas alíneas h e i, do inciso II, deste artigo, visando
à maior segurança na fiscalização do tributo, especialmente quanto à dedução prevista na alínea i, para o que poderá instituir cadastro obrigatório dos contribuintes beneficiários, renovável nos três primeiros meses de cada exercício financeiro, o qual incluirá o nome da doença, o atestado atualizado do médico especialista, a relação dos medicamentos de uso contínuo e as notas fiscais de venda dos remédios” (NR).

Art. 2º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação e produzirá os efeitos financeiros que lhe são próprios a partir do primeiro dia do exercício financeiro seguinte ao ano de sua publicação oficial.

JUSTIFICAÇÃO

O presente projeto objetiva autorizar mais duas espécies de deduções dos rendimentos anuais de contribuintes sujeitos ao Imposto sobre a Renda das pessoas físicas, na modalidade de declaração anual.

A Lei nº 9.250, de 23 de dezembro de 1995, no vasto conjunto da legislação sobre esse imposto, é a vigente sobre essas deduções. Estas se encontram arroladas no seu art. 8º. Daí por que fiz a opção de propor as medidas ora formuladas como acréscimos àquela norma, e não como norma autônoma. Ou seja, preferi não contribuir ainda mais para o difícil trabalho que é o de consulta à legislação do Imposto sobre a Renda no Brasil.

As motivações e os argumentos que nos levam à presente iniciativa precisam ser explicados em relação a cada uma das duas novas deduções que estou propondo. Na realidade, são duas medidas distintas, embora articuladas num único projeto de lei tendo em vista sua pertinência e conexão temática.

Antes de tudo, cabe um comentário geral sobre o princípio de justiça e os fins sociais que inspiram a apresentação das medidas aqui propostas.

Tem-se constituído em quase exclusividade do Poder Executivo, apoiado na experiência da Secretaria da Receita Federal, a iniciativa de leis sobre matéria tributária, muito particularmente as que objetivem ampliar benefícios fiscais aos contribuintes, em geral, do referido imposto. É que, naturalmente, a visão que os governos têm da atividade de tributação os leva a enxergar apenas o lado da moeda que corresponde à preocupação fiscalista de aumento de receita, sem considerar que o contribuinte também tem direitos contra essa gula fiscal. O principal desses direitos se revela na limitação que a Constituição impõe ao ente tributante de respeitar a capacidade contributiva. Ou seja, o de considerar, no campo da política tributária, que praticar a justiça fiscal também deve ser uma preocupação dos governos. Uma das formas de fazê-lo é saber estimar, com equilíbrio, que às necessidades de aumento da receita do Erário se contrapõe a capacidade de o contribuinte suportar a (sobre)carga da oneração fiscal excessiva.

Em síntese, é isto que a Constituição impõe ao Legislador, no § 1º, de seu art. 145. Trata-se do seguinte princípio, que também se reveste da natureza de limitação constitucional ao poder de tributar


“Art. 145..........................................................
........................................................................
§ 1.º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte;
.......................................................................”
(sublinhado na transcrição).

As partes sublinhadas na norma constitucional transcrita merecem os seguintes comentários: “sempre que possível”, significa que o legislador infraconstitucional deve fazer todo o possível para que os impostos (não são os tributos, mas somente os impostos) tenham “caráter pessoal”, isto é, que sejam impostos diretos (caso típico do Imposto sobre a Renda) e, na sua graduação, que se observe a proporcionalidade ditada pela “capacidade econômica” do contribuinte, o qual se concebe como um limite quantitativo à graduação dos impostos, determinando, assim, de um lado, a capacidade contributiva (vale dizer, de pagar tributos, contribuindo para o Erário) das pessoas sujeitas ao poder de tributar e, de outro, impedindo que o próprio poder tributante o ultrapasse, sob pena de configurar confisco.

Curiosamente, esse tipo de preocupação dos governos é maior com os contribuintes/empresas, isto é, com o contribuinte pessoa jurídica do Imposto de Renda, do que com o contribuinte pessoa física. De fato, este vem sendo relegado a uma constante, antiga e histórica desproteção da voracidade do “leão”.

O presente projeto perfilha, pois, o lado da parte fraquíssima nessa famélica relação “leão” e sua presa indefesa. E é uma relação que se vai tornando ainda mais famélica do lado mais fraco.

A primeira das duas novas deduções, aqui propostas, visa a permitir ao contribuinte, inquilino de imóvel residencial, deduzir o montante anual dos aluguéis da base de cálculo de seu imposto de renda.

Essa medida já foi adotada, nos idos dos anos 70 e parte dos anos 80. Posteriormente, foi revogada sem maiores explicações. Na realidade, a explicação é sempre a mesma, quando se trata de retirar um benefício fiscal que implique redução da base de cálculo do contribuinte pessoa física: a necessidade de elevação da receita da União. Só que, em relação a contribuintes do imposto de renda pessoas jurídicas, o Fisco tem certo escrúpulo em reduzir benefícios. Ao contrário, sempre e sempre os vem ampliando.

A principal razão que aconselha voltar-se a adotar a medida aqui proposta é a mesma que inspirou o legislador naquela ocasião. Em resumo, o argumento é o seguinte: o rendimento proveniente de locação de imóveis é tributado pelo imposto de renda devido pelo locador, ou seja, pelo detentor do rendimento. O gasto com o pagamento desse aluguel, pelo locatário, não é admitido como redução do rendimento tributável, pelo imposto de renda, desse locatário. Assim, a União, de um lado, tributa, positivamente, essa renda do locador e, de outro, não permitindo que ela seja deduzida dos rendimentos tributáveis do locatário, indireta, implícita e negativamente também tributa a mesma renda. É, pois, um caso de bis in idem (um único poder a tributar duas vezes o mesmo fato tributável).

Trata-se, então, de uma flagrante ilegalidade e grande injustiça. A ilegalidade decorre de que o chamado bis in idem, assim como a bitributação, são distorções da atividade tributária inadmitidas pela legislação e pelo sistema brasileiros, dado o caráter de estrita legalidade que prevalece entre nós para a fixação das competências dos entes tributantes e dos respectivos fatos geradores, de modo que um mesmo fato não pode ser tributado duas vezes pelos mesmo poder tributante (caso, repito, do bis in idem), nem tributado duas vezes por entes tributantes distintos (por exemplo, pela União e pelos Estados ou Municípios, ao mesmo tempo), caso de bitributação. A injustiça (fiscal) é que a União prefere manter a oneração excessiva do contribuinte a lhe reconhecer o direito de ter o limite de sua capacidade contributiva respeitado.

O alcance social de tal medida é óbvio. Num momento em que os estratos das classes média e as de menor poder aquisitivo lutam para manter-se com a dignidade exigida pela responsabilidade e o insuportável custo dos encargos de ordem familiar, sobretudo o custo da casa própria, uma dedução dessa natureza produziria significativo alívio nesses segmentos sociais.

Ademais, se trouxermos para o campo do Imposto sobre a Renda da pessoa física alguns conceitos aplicáveis ao da pessoa jurídica, como, por exemplo, o de custo operacional, que faz reduzir bastante o seu lucro tributável, esse “transplante”, além de ser perfeitamente aceitável, lógico e possível, representaria um enorme ganho na seara da justiça fiscal em favor do sistema e, finalmente, do próprio contribuinte, pessoa física.

Por tudo isso, a proposta da dedução ora justificada vem ao encontro do interesse público em sentido amplo, merecendo a aprovação de meus pares nesta Casa do Congresso Nacional.

A segunda das deduções que estou propondo é, no meu entender, a mais justa e a de maior alcance social.

Permitir que o custo dos remédios receitados como sendo de uso contínuo, para o controle da saúde das pessoas portadoras de doenças crônicas incuráveis (mas controláveis), contribuintes do imposto de renda, nesse quadro de baixo poder aquisitivo da população em geral e de preços elevadíssimos dos medicamentos (de produção cada vez mais concentrada nas mãos de pouquíssimos laboratórios fabricantes, que impõem seu preço ao mercado consumidor cativo), é medida que se justifica por si mesma. É auto-explicativa.

Uma possível objeção quanto à dificuldade de fiscalização sobre eventuais ações e omissões fraudulentas dos contribuintes, especialmente no caso da dedução do custo dos remédios de uso contínuo, seja no que se refere à emissão de receituário, à exibição de notas fiscais de venda dos remédios e outras, tudo pode ser contornado por medidas da Administração Tributária, autorizadas com a providência prevista no novo § 4º do mencionado art. 8º, aqui proposta. Especialmente na hipótese dos remédios, poderá criar-se obrigação acessória do contribuinte, anualmente renovável perante o Fisco, que, assim, terá sua tarefa de fiscalização bem facilitada.

Assinale-se que, face à legislação do Imposto sobre a Renda, a medida aqui proposta está imbuída do mesmo espírito de justiça fiscal, presente quando da adoção dos mecanismos compensatórios, que inspirou o legislador a permitir deduções do referido imposto relativas aos pagamentos efetuados pelo contribuinte, no ano-calendário, com aparelhos ortopédicos e próteses ortopédicas e dentárias, conforme previsto no aqui referido – e parcialmente transcrito - art. 8º, inciso II, alínea a, da Lei nº 9.250, de 1995 (conforme se pode observar na legislação citada e anexada à presente proposição).

De outra parte, a matéria objeto da proposição se insere, oportunamente, no âmbito das atuais discussões em torno da necessidade urgente de uma regulamentação da assistência farmacêutica gratuita, que é um direito que se conjuga com aqueles outros regidos pelo princípio constitucional de que todos os brasileiros têm acesso universal e integral à saúde, consoante o disposto no art. 196 da Constituição, princípio este complementado pela disposição constante do art. 197, também da Constituição, as duas normas redigidas nos seguintes termos:

“Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao poder público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.”.

Enquanto o País não desfruta de uma regulamentação da matéria de forma ampla e eficaz, de modo a dar exato cumprimento às determinações constitucionais previstas nas disposições acima transcritas, o cidadão ou, primeiro, fica sujeito à omissão circunstancial do Poder Executivo, ou, segundo, é beneficiado com decisões pontuais do Poder Judiciário, que recentemente vêm determinando o fornecimento, pelo poder público, de certos medicamentos a pessoas que dele necessitam e que não se conformando com a omissão governamental recorreram e obtiveram a tutela judicial para a obtenção desse direito, ou, final e eventualmente, aguarda a adoção de medidas normativas, propostas e aprovadas pelo Poder Legislativo, as quais, mesmo sendo de alcance parcial, venham ao encontro do atendimento de suas necessidades de combater e controlar as doenças que a adversidade o acometeu. É nessa última trincheira de luta do cidadão que se apresenta a medida que proponho com o presente projeto.

A propósito da atualidade dessa discussão em torno dos direitos à assistência farmacêutica, convém a leitura de dois artigos publicados no jornal Folha de São Paulo, edição do dia 17 de março de 2007, na seção Tendências/Debates, 1º Caderno, página de Opinião, A-3. O jornal submeteu à divergência de opiniões a seguinte questão: “É positivo que o Estado seja obrigado por decisão judicial a fornecer certos medicamentos?”. Responde “não” o médico sanitarista Luiz Roberto Barradas Barata, atual Secretário de Saúde do Estado de São Paulo, com seu artigo “Regulamentar é o melhor caminho”. Responde “sim” o Juiz de Direito Marcelo Semer, presidente do Conselho Executivo da Associação Juízes para a Democracia, com seu artigo “Garantindo o exercício dos direitos”.

Voltando ao texto do presente projeto, é bom assinalar que a cláusula de vigência da norma proposta, nos termos do art. 2º da proposição, prevê a entrada em vigor da lei na data de sua publicação. Tendo em vista, porém, a observância do princípio constitucional da anterioridade, ou anualidade, de certas normas tributarias, em conformidade com o disposto no art. 150, inciso III, alínea b, da Constituição, os efeitos financeiros da lei, uma vez aprovada, somente se produzirão a partir do início do exercício financeiro seguinte ao ano de sua publicação.

Dessa forma, contando com o apoio dos meus pares, espero ver aprovado o presente projeto de lei antes do início do exercício financeiro de 2008, a fim de que as medidas ora propostas possam vir a ser aplicadas para já beneficiarem os contribuintes do Imposto sobre a Renda, pessoa física, em suas declarações de rendimentos daquele vindouro exercício.

Sala das Sessões, em 21 de março de 2007.



Deputado JOSÉ GENOINO (PT – SP)

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