Parlamento - Pronunciamentos

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CÂMARA DOS DEPUTADOS

Genoino fala sobre a polêmica dos livros didáticos

O SR. JOSÉ GENOÍNO (PT-SP. Sem revisão do orador.)
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, meu pronunciamento é sobre a polêmica causada pelos dois livros didáticos "Nova história crítica", de autoria de Mario Schmidt, e "Projeto Araribá - História, Ensino Fundamental, 8".

Faço esse pronunciamento definindo claramente o que está em jogo nesse debate, nessa polêmica, baseando-me em excelente reportagem da revista Carta Capital, que trata a matéria de maneira global, tanto do ponto de vista dos conteúdos em debate como do ponto de vista dos interesses econômicos em jogo.

Sr. Presidente, solicito a V.Exa. a transcrição nos Anais da Câmara dos Deputados desse meu pronunciamento, no qual sugiro um amplo debate na Câmara dos Deputados sobre o assunto. Na minha opinião, a Comissão de Educação tem toda autoridade para fazer, na forma de audiência pública, um debate com todas as pessoas que têm se pronunciado sobre o assunto.

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, hoje, vou abordar um assunto que tem freqüentado a mídia mais do que se poderia imaginar. Não que ele não tenha importância. Tem e muita. Mas o que tem mais chamado a atenção é a forma como ele vem sendo tratado.

Refiro-me, Sr. Presidente, à questão dos livros didáticos, no âmbito do Plano Nacional do Livro Didático, o PNLD. De repente, o foco principal de interesse pelo assunto passou a ser, em especial, a coleção Nova História Crítica, de autoria de Mario Schmidt. De acordo com matéria de capa da revista CartaCapital, edição nº464, em circulação atual desta semana, com data de hoje, 03-10-2007 - cito Sr. Presidente - : “o pote de ouro do livro didático motiva uma guerra ideológica e comercial”.

Para quem leu recente artigo na página de opinião de O Globo, de autoria do jornalista Ali Kamel, atual diretor-executivo de jornalismo da Rede Globo e colunista daquele jornal, ele opinou criticamente sobre a referida obra de História, assim como o fez ontem, no mesmo espaço de O Globo, sobre outra obra, esta intitulada “Projeto Araribá, História, Ensino Fundamental, 8”. Em ambos os casos, a crítica é feroz, no sentido de acusar as obras de terem, nas palavras dele, um “defeito gravíssimo”, isto é, o de fazerem cito – “propaganda político-eleitoral do PT”.

E o que significa propaganda político-eleitoral do PT, para o mencionado jornalista? Significa que, no livro 8, Ensino Fundamental, do tal livro de História por ele criticado, às folhas tantas, “o (Programa) Fome Zero seria o sonho de 1917 revivido”. Por outras palavras, o livro seria de propaganda da revolução bolchevique de 1917 em torno do Fome Zero. Mais ainda: “o livro, deliberadamente, confunde pobreza com fome”; “(o livro) se bate contra a globalização e o neoliberalismo”; “foi impresso na China”; lastima o jornalista pelas “pobres de nossas crianças” sobre o fato de o livro, segundo ele, conter afirmação equivocada a respeito da Arábia Saudita; “péssima qualidade do projeto”, para ele atestada no “livro de Geografia para a oitava série, da mesma coleção” e, nesse caso, com destaque para números: “1.087.059 exemplares, ao custo de R$4.859.153,73”.

A clara impressão que fica, Sr. Presidente, é a de que todo o artigo foi feito para tecer críticas, não propriamente com a finalidade de ser uma contribuição construtiva de alguém que, supostamente, entenda do assunto “livro didático” e queira colaborar com as autoridades de ensino do País para - quem sabe - uma mudança, ou uma revisão no projeto correspondente que esteja sendo executado pelo governo. Não. O que é apontado como crítica pelo jornalista é inconsistente, é mal articulado no seu texto, é confuso e, visivelmente, tendencioso. Mas os pontos que são o real objetivo do artigo, o que foi ressaltado ao limite do mínimo detalhamento de valor, foram a quantidade de exemplares da obra criticada e do custo de sua aquisição para o governo.

Intriga a qualquer um o porquê dessa fixação em quantidade e valor. Pois é a isso, Sr. Presidente, que a referida matéria da revista CartaCapital responde, com um título bastante sugestivo: “A História Como Ela É”.

A mencionada matéria é assinada pela Jornalista Ana Paula Souza, à qual se articulam duas outras matérias: “Dos Gabinetes para a Sala de Aula”, por Rodrigo Martins, onde se encontram depoimentos de professores, para quem “se o programa tem problemas, eles estão longe de ser ideológicos”; e “Macarthismo Nas Escolas”, por Luiz M. C. Costa, onde o autor da matéria apresenta a completa ausência de proselitismo político-ideológico nas obras criticadas por Ali Kamel, a quem o jornalista Luiz Costa acusa de ter agido de “má-fé”, quando não levou em conta, na comparação entre capitalismo e marxismo feita por Mario Schmidt, a coluna do quadro do autor, reproduzida na revista, onde Schmidt, além de capitalismo e marxismo, também distingue, criticamente, o socialismo real.

Vou fazer aqui um resumo dos principais pontos abordados na matéria a que tenho feito referência. Quem sabe, Sr. Presidente, não caberia melhor requerer a transcrição de toda essa matéria de CartaCapital, nos anais desta Casa.

Começa “a História como ela é”, referindo-se a Mario Schmidt, autor da coleção “Nova História Crítica”, como alguém que ficou famoso por ter conseguido vender 10 milhões de exemplares dessa obra, que chegou às mãos de 28 milhões de alunos no País, e passou a ser objeto de graves acusações em diversas matérias no jornal O Globo, como livro “encharcado de ideologia”, fazendo também com que o jornalista Ali Kamel se sentisse como a atriz Regina Duarte, quer dizer, “com medo”.

Esclarece CartaCapital que a coleção “Nova História Crítica é uma das 53 coleções excluídas na última avaliação do Ministério da Educação (MEC), que analisou 144 títulos submetidos ao Plano Nacional do Livro Didático (PNLD)”. Só que a obra de Mario Schmidt “tornou-se ‘best seller’ no mais rentável segmento do mercado editorial brasileiro”. O governo adquiriu 121 milhões de exemplares de livros didáticos diversos em 2007, sendo, de acordo com a citada revista, o maior programa de aquisição de livros didáticos do mundo. Para se ter uma idéia da pujança desse segmento no mercado editorial, em termos de faturamento, em 2006, os livros didáticos participaram com R$872 milhões, seguido bem abaixo pelo segmento de livros técnicos, com R$418 milhões, os religiosos, com R$242 milhões e as obras gerais com R$ 15 milhões.

O mais curioso, Sr. Presidente, é que a matéria de CartaCapital cita depoimento de uma professora de História, Margarida de Oliveira, membro da comissão técnica para o PNLD e que não é defensora da obra de Schmidt. Diz a professora à revista: “O que me chamou a atenção foi o fato de os jornalistas, geralmente tão atarefados, se ocuparem de um livro que não será mais comprado pelo governo”. E, agora, essa grande espantosa revelação da mencionada professora: “Além disso, não entendi o esforço para vincular o livro ao governo Lula, uma vez que, ao contrário do que tentou se mostrar, ele foi aprovado no governo FHC e descartado na atual administração”.

No prosseguimento dessa revelação, a revista salienta que: “tal detalhe parece ter escapado ao próprio ex-ministro Paulo Renato Souza, hoje deputado federal”. E o nosso atual colega, Sr Presidente, ainda segundo a matéria da revista e sobre esse ponto específico, teria declarado no site do PSDB o seguinte: “Quando estávamos no governo, evitávamos viés ideológico na escolha dos livros didáticos. Essas diferenças devem ser respeitadas, mas, infelizmente, estamos vendo que a prática se perdeu com o tempo”. E a revista ainda informa que a “Nova História Crítica” entrou na seleção do MEC em 2002, com o ex-ministro Paulo Renato à frente do Ministério.

Sobre a forma pela qual se faz a seleção e se adota o livro didático, a entrevistada Professora Margarida esclarece que “o livro aprovado não é sinônimo de livro perfeito” e que é apresentada uma lista e o professor escolhe a obra que mais o agrada, até de acordo com sua ideologia”. E que, no caso de História havia 19 livros para livre escolha do professor, sendo que o de Schmidt “foi o campeão de solicitações”.

O editor do questionado livro, Arnaldo Saraiva, dono da editora Nova Geração, não se conforma, nem com a eliminação daquele livro do PNLD, nem com as críticas veiculadas por O Globo. Diz ele que o jornalista Ali Kamel tem o direito de opinar sobre qualquer livro, mas não pode pretender que sua opinião prevaleça sobre as outras. Para Saraiva, o que existe atualmente é que a única editora didática que “não se vendeu ao capital externo, especialmente ao espanhol” foi a sua pequena empresa. Essa opinião tem respaldo entre especialistas, segundo CartaCapital. Cita, por exemplo, a tese de doutorado em educação de Célia Cassiano, defendida na PUC-SP. Ela afirma que o setor do livro didático, em todo o mundo atual, está dominado por um oligopólio, onde sobressaem algumas editoras mundialmente conhecidas, dentre elas a espanhola Santillana. De acordo com essa pesquisadora, as editoras pequenas agora desapareceram.

A matéria da CartaCapital vai adiante e informa o seguinte: “em 2001 a Santillana, braço editorial do maior grupo de mídia espanhol, Prisa, que faturou 4 bilhões de euros em 2005, adquiriu a (editora) Moderna, criada pelo professor de química Ricardo Feltre. E, se a alguém causou estranheza que o ‘El País’ tenha escrito, a propósito de Schimidt, que ‘el libro de texto ensalza el comunismo y la revolución cultural china’, cabe lembrar que o jornal pertence ao Grupo Prisa”.

Por seu turno, o Grupo Santillano conta com uma diretora de relações institucionais, Mônica Messenberg, que antes de se tornar executiva do Grupo, de acordo com CartaCapital, cito, Sr. Presidente, “era presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), no ministério de Paulo Renato. O expressivo crescimento da editora no segmento deixa os concorrentes com a pulga atrás da orelha, até porque a ligação com o governo anterior não se restringe à presença de Mônica.

A matéria reveladora de CartaCapital aprofunda mais ainda o exame da questão. Mas isso, porque, conforme conclui antecipadamente, “quanto mais se puxam os fios desse novelo bilionário, mais interesses difusos aparecem”.

Teria outras coisas a comentar sobre o assunto, Sr. Presidente, mas o que já disse, transcrevendo na maior parte deste pronunciamento a mencionada matéria de CartaCapital, me parece ser suficiente.

Vou concluir, Sr. Presidente, Sras. Deputadas e Srs. Deputados, dizendo que é muito bom que todos saibam que as campanhas que se fazem contra o PT e contra o governo do Presidente Lula, se limitam a essas tantas coisinhas miúdas, na verdade aparentemente miúdas, de que é exemplo essa escaramuça contra o livro didático de Mario Schmidt. São coisinhas miúdas apenas para encobrir as coisas inconfessáveis e gigantescas que estão por trás, contra o interesse público e sempre em benefício do interesse particular de ilusionistas. Espertalhões usam a mídia no serviço de manobrar as massas, especialmente televisivas, para fazer a cabeça das pessoas, com meias verdades, omissões e informações truncadas. Estaremos sempre atentos e prontos para a defesa e o contra-ataque, contra a censura e o macarthismo nas escolas e na educação do nosso País.

É a tal coisa: podem tentar, tentar e tentar, mas não adianta, porque a verdade sempre aparecerá, como neste caso já apareceu por completo. Concluo sugerindo um amplo debate sobre esse assunto na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, através de uma Audiência Pública.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

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