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CÂMARA DOS DEPUTADOS

Discurso sobre a reforma política

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ
Sessão: 064.2.53.O
Hora: 16h24
Fase: GE
Orador: José Genoino
Data: 10/04/2008

Deputado Alceni Guerra - Dando continuidade ao Grande Expediente, concedo a palavra ao ilustre deputado José Genoino, do PT de São Paulo. V.Exa. tem 25 minutos.

Deputado José Genoino - Deputado Alceni Guerra que preside esta sessão, sras. e srs. deputados, nós estamos numa quinta-feira com o plenário vazio, mas é importante o debate sobre algumas questões mais estratégicas, algumas questões de fundo, para que situemos neste debate um aprofundamento que é necessário diante do corre-corre das Comissões e do plenário que acontece principalmente na terça e na quarta-feira.

Eu quero falar aqui, no Grande Expediente, sobre o tema da reforma política. Antes disso, eu quero apresentar duas preliminares neste debate. A primeira preliminar é que nós do PT, nós que apoiamos o governo Lula, estamos construindo um projeto nacional de desenvolvimento do país, calcado em alguns pilares fundamentais: a presença do Brasil no mundo de maneira soberana e interdependente; desenvolvimento econômico sustentável social, fiscal e, soberanamente, um programa social de investimento em políticas públicas — que está diminuindo a pobreza; processo de distribuição de renda; e recuperação do papel público do Estado, seja através das empresas estatais — Banco do Brasil, Petrobras, Caixa Econômica, Banco do Nordeste, Banco da Amazônia —, seja através, principalmente, da nova compreensão do papel do Estado no desenvolvimento econômico com o Programa de Aceleração.

Esse nosso projeto nacional tem uma lacuna, um problema que nós não resolvemos ao longo desse período, desde a eleição do presidente Lula em 2002: a reforma política, a reforma das instituições políticas. Essa questão tem que se incorporar na nossa agenda de prioridades. Exatamente porque não compreendemos esse problema, nós não o inserimos como prioridade em 2003, 2004, 2005 ou mesmo em 2007, na nova Legislatura.

Todos sabem que, na medida em que o PT optou pelo caminho de mudar a ordem por dentro da ordem, nós sofremos todas as conseqüências de mudar o país, como estamos mudando, com instituições que precisam de ampla uma reforma. Essa reforma das instituições tem que se libertar. É a segunda preliminar de qualquer visão casuística.

O deputado Alceni Guerra sabe que na Constituinte nós tivemos uma grande oportunidade de promover uma reforma dos Poderes. O que complicou aquela visão na discussão do sistema de governo e do papel do Congresso e do Senado? O casuísmo de discutir 4, 5 ou 6 anos. Aquilo atrapalhou, contaminou um debate mais estratégico sobre a questão da organização dos Poderes e do sistema eleitoral.

Depois, tivemos a experiência da revisão constitucional, que também fracassou porque o ponto central era diminuir o mandato presidencial de 5 para 4 anos, quando Lula estava em primeiro lugar nas pesquisas e FHC ainda não era candidato.

Terceiro, com a eleição de Fernando Henrique Cardoso, introduziu-se a reeleição. Como S.Exa. era muito forte, a reeleição acabou contaminando o debate sobre a reforma política.

Eu faço aqui uma autocrítica do meu partido por, como então presidente do PT, não termos priorizado o tema da reforma política já em 2003, logo após a posse do presidente Lula, com a força que S.Exa. tinha.

Esse problema agora está em pauta. E nós não podemos enfrentá-lo com a idéia de terceiro mandato ou de qualquer casuísmo. Eu sou radicalmente contra o terceiro mandato. Não é bom para o PT, não é bom para a democracia, não é bom para o país, que vive um bom momento econômico e social, nem para a história política vitoriosa de uma liderança que tem experiência, sensibilidade e competência. O presidente Lula não pode, ao encerrar essa trajetória de 8 anos de presidente da República, entrar numa disputa ou se envolver em qualquer especulação sobre terceiro mandato.

Por isso, o tema da reforma política tem que se libertar de qualquer casuísmo. Essa tem que ser discutida como uma questão de Estado.

Nesse sentido, sr. presidente, eu fiz um debate com alguns colegas, alguns companheiros meus dos anos 70 que participaram da resistência armada comigo e outros mais recentes. Produzimos, como conseqüência desse diálogo, o caderno Democracia e Reforma Política, uma espécie de conversa de 5, 6 horas. Abordo de maneira direta esses temas.

Abordo, em primeiro lugar, a natureza do presidencialismo brasileiro. Nós temos um sistema bicameral. O presidencialismo brasileiro tem suas características próprias. Temos a necessidade de ter um chamado presidencialismo de coalizão, porque o sistema de eleição de presidente é totalmente diferente do sistema eleitoral para a Câmara dos Deputados e para o Senado.

Neste sistema, qualquer presidente eleito vai enfrentar problemas seríssimos para construir maioria e governabilidade no Congresso Nacional, em primeiro lugar, porque é eleito na base de um eleitor e um voto. Quando somos eleitos, a relação não é essa. Depois, porque temos no Brasil um bicameralismo que não funciona: ora a Câmara é revisora, ora o Senado é revisor. Isso temos de mudar.

A Câmara é o Parlamento que representa o povo, o Senado representa os estados. As leis começam na Câmara — por isso a Câmara é assim — e são revisadas no Senado — por isso o Senado é assim. Mas isso está mudado, porque ora a Câmara é revisora, ora o Senado é revisor.

Eu entendo que a iniciativa de leis tinha que começar pela Câmara, e o senador fazer a revisão. Eu entendo que algumas competências da Câmara deveriam ser diferentes do Senado. Por exemplo: questões federativas, de política externa, dos Tribunais Superiores o Senado delibera; questões da legislação que dizem respeito ao povo, a Câmara, porque somos representantes do povo pelo sistema proporcional. Poderia ser criado um sistema de recursos, com requerimento de um terço de uma das casas para apreciar uma das matérias.

Vejam bem: qual é o problema que nós estamos discutindo agora? O das medidas provisórias. A medida provisória é uma intervenção do Executivo no Legislativo, porque edita uma medida provisória que entra em vigor e com força de lei. Ela se incorpora ao processo legislativo, com uma tramitação especial — e tem que ser especial, porque é uma medida de força. A Constituição prevê, no art. 164, que o presidente pode pedir urgência constitucional para as suas leis. A medida provisória já entra em vigor. Como ela está em vigor, tem que haver um tratamento especial.

Esse debate não pode fugir da questão central. Ela deve trancar a pauta, e a maioria absoluta pode destrancar a pauta, alterando a inversão. Por quê? Porque quem fala pelo Poder Executivo é o presidente e quem fala pelo Poder Legislativo é a maioria. Nós não podemos destrancar a pauta invertendo a ordem dos trabalhos por maioria simples, porque, senão, se cria uma insegurança: edita-se uma medida provisória e ela pode cair, sem ser votada, em 120 dias.

Eu estou à vontade, porque, nesse ponto, eu faço também uma autocrítica: quando discuti a questão das medidas provisórias no governo FHC, eu não tinha uma visão de como ela é importante como uma questão de Estado, e, muitas vezes, o posicionamento sobre as MPs era enfocado ou influenciado pela disputa entre oposição e governo. Nós temos que resolver essa questão.
Seria melhor, quando se tratar de emenda constitucional, presidente Alceni Guerra, fazer como no passado: a emenda constitucional deveria ter uma Comissão Especial de Deputados e Senadores e ser votada pelo Congresso Nacional, porque, aí, não se teria o pingue-pongue interminável de uma casa revisora e outra casa revisora.

Eu acho que é necessário fazer uma mudança nesse bicameralismo e enfrentar o problema do pacto federativo. Nós temos uma deformação no nosso pacto federativo: nem o Senado representa os Estados, nem a Câmara representa o povo, e mistura Senado e Câmara, em primeiro lugar, porque o sistema proporcional de eleição de deputado é antidemocrático, porque a proporcionalidade deforma a representação do povo.

É correto manter o Senado. O Brasil, como uma nação continental, não pode prescindir do Senado Federal, porque ele é o equilíbrio federativo. Mas não é correto o Senado ter 3 senadores por estado, independentemente do número de eleitores, e nós não corrigirmos a representação da Câmara.

Ninguém fala nesse assunto, presidente Alceni. Mas hoje há muitos estados com sub-representação. Por exemplo: Pará. Outro exemplo: Bahia e Ceará. Estados que cresceram muito em número de eleitores têm uma sub-representação. Não estou nem falando de São Paulo. Por quê? Porque não há correção em cada ano eleitoral. Se houver a correção, sem mudar a Constituição, nos não vamos ter cadeiras para os deputados.

O que seria correto? Quinhentos e treze deputados. Nenhum estado pode ter mais, nenhum estado pode ter menos do que 4 deputados. Aí, deixa fazer o equilíbrio proporcional pelo número de eleitores.

Não é só São Paulo que tem uma sub-representação. Os estados médios, que cresceram, e eu citei 3 aqui, têm uma sub-representação. Então, isso deforma a representação popular do ponto de vista do povo.

E olhem bem: na hora de eleger o presidente da República, o eleitor é um voto. O eleitor do Ceará, do Acre, do Amazonas, do Pará, é um voto para eleger o presidente da República. Mas, na hora de eleger os deputados, não é o eleitor um voto.

Isso muda a representação, na medida em que, na nossa concepção, foi uma grande conquista do Direito Constitucional brasileiro: todo o poder emana do povo e só em seu nome pode ser exercido direta ou indiretamente, pela representação política.

Deputado Zé Geraldo
- Sr. deputado, peço um aparte.

Deputado José Genoino - Pois não, deputado.

Deputado Zé Geraldo - Agradeço a V.Exa. pelo aparte. Quero parabenizá-lo pelo pronunciamento e pelo tema. Deputado José Genoino, tenho a convicção de que V.Exa. é um deputado credenciado para rodar este país, todos os estados, fazendo o debate da reforma política. Não temos mais condições de fazer uma reforma política este ano, até porque, a partir de julho, será um semestre de eleições, mas não podemos demorar muito tempo. V.Exa. citou alguns exemplos. Tenho observado alguma coisa. Por exemplo, há muitos municípios no Brasil que não têm mais do que 1.000 eleitores, e há 15, 16, 17 partidos nesses municípios. Uma reforma política pode melhorar a estruturação dos partidos. Também não acho justo o mandato ser de 4 anos.

Neste novo momento em que as coisas precisam ser cada vez mais bem planejadas e bem-feitas, às vezes o Executivo demora 4 anos entre elaborar, buscar os financiamentos e colocar na prática um projeto, seja ele presidente da República, seja governador, seja prefeito. Como não acho justo, também, o deputado federal ser eleito para 4 anos, o senador ser eleito para oito anos. É preciso mudar esse sistema. Há o privilégio de quem se elege para oito anos, na mesma eleição, sobre quem se elege para quatro. Por que o presidente tem quatro, o prefeito tem quatro, o vereador tem quatro, o deputado tem quatro, mas o senador tem oito anos?

Fica uma vida só com uma eleição. Uma reforma política poderia travar o debate dessa natureza e qualificar, para que possamos até melhorar alguns Regimentos que existem nesta Casa. Para haver uma democracia perfeita não é preciso tanta burocracia. Muitas vezes há muitas medidas provisórias porque, neste Congresso, muitas matérias ficam tramitando a vida toda. Se formos esperar pelos projetos que são apresentados na Câmara, vão ao Senado, são votados na Câmara, são sancionados, demoramos muito. No governo Lula, se não fosse o mecanismo das medidas provisórias, muitas coisas que avançaram não teriam avançado. Cito o exemplo do crédito suplementar. Se fôssemos votar todos os créditos suplementares por projeto de lei, ainda que fosse em caráter de urgência, muitos recursos, por exemplo, que deveriam chegar na Amazônia no próximo mês, só iriam chegar no final do ano, o que é inviável, porque a Amazônia é uma região que tem dois períodos, um de chuva e um de sol. Então, se o dinheiro não for aprovado em julho, agosto, setembro, não terá validade; se for aprovado em dezembro, lá já estará chovendo. Como fazer obras ou outras construções com esses recursos? Parabéns a V.Exa.

Deputado José Genoino - Deputado Zé Geraldo, incorporo o seu aparte ao meu pronunciamento.

Antes de conceder o aparte ao deputado Eudes Xavier, quero falar sobre o aperfeiçoamento do sistema proporcional. Se o Senado representa a Federação, eu defendo que ele exista. O problema não é o mandato ser de 8 anos, intercalando. Esse não é o problema. O problema é definir bem as competências da Câmara e do Senado e acabar com a figura do suplente de Senador, porque o suplente nós não vemos nem na hora de apertar o botão do computador. É igual vice-governador: nem a cara aparece.

Então, se o Senador representa o estado, se ele sai, terá que vir o segundo ou o terceiro. Esse é o princípio correto da representação da Federação.

Pois não, deputado Eudes Xavier.

Deputado Eudes Xavier
- Deputado José Genoino, como deputado de primeiro mandato, fiquei até admirado porque pensei que, com a reforma política pautada, esta casa iria avançar muito mais. Entretanto, não vi essa expectativa. Gostaria de fazer uma pergunta a V.Exa. Ouvi um comentário sobre isso, mas gostaria de ter a oportunidade de ouvir a opinião de V.Exa. Eu me refiro às proporcionalidades na composição. Hoje, em cada partido, em cada aliança, muitas vezes temos facilidade de fazermos aliança na majoritária e, muitas vezes, os partidos do mesmo arco da majoritária não compõem na proporcional e vice-versa. Então, gostaria muito de ouvir a sua apreciação sobre essa questão. Muito obrigado.

Deputado José Genoino - Deputado Eudes Xavier, V.Exa. tem razão. Se nós queremos fazer uma reforma política para privilegiar partidos com programas e projetos, não tem sentido coligação na eleição proporcional. O correto seria a coligação na eleição majoritária porque vamos buscar a maioria da população no voto. Na eleição proporcional, deveria se privilegiar o partido, o programa e o projeto.

Por isso, defendo a votação em lista. Com a votação em lista, não teremos coligação na eleição proporcional. Eu acho que a coligação na eleição proporcional não é democrática. Para isso é necessário estabelecer o princípio da fidelidade, não a fidelidade como o Supremo estabeleceu. A fidelidade do Supremo, nem os países do socialismo autoritário conseguiram impor. Lá, pela decisão da fidelidade, segundo o Supremo Tribunal Federal, se um deputado sair do partido para concorrer a uma eleição, este concorre sem o mandato. Não pode existir fidelidade eterna. O correto é a fidelidade da seguinte maneira: você se inscreve no partido para concorrer a uma eleição, poderá sair desse partido, quando for se inscrever novamente para uma eleição, sem perder o mandato. Você tem uma fidelidade renovada de quatro em quatro anos. A fidelidade nasce onde? Nasce da relação do eleito com o eleitor e com o partido. Não podemos ter uma fidelidade eterna, e a fidelidade, durante quatro anos, vai da primeira inscrição até o outro momento em que ele vai se inscrever para o cargo de deputado.

Deputado Chico Lopes - Quando for possível, gostaria de um aparte.

Deputado José Genoino - Vou conceder um aparte, deputado Chico Lopes, meu companheiro, do PCdoB, representante do Ceará.

Para isso é necessário nós entrarmos no tema do financiamento público da política. Na sociedade capitalista, só há duas maneiras de financiar a política, pela via privada ou pela via do Estado. Vamos ser claros, não há outro caminho. Para fazer o financiamento privado, ou vamos para o modelo americano, que é público, em que as empresas aparecem, aparecem nos palanques e nas doações e não há criminalização; ou, então, vamos para o financiamento privado, com conta pública, limitação de gastos, proibição de financiamento privado e com observação permanente.

Esse faz de conta que nós vivemos hoje é uma faca de dois gumes, porque, se o deputado recebe de uma empresa e amanhã ela é investigada e o nome dele aparece, mesmo que ele tenha recebido na legalidade, o nome dele aparece na contabilidade. E aí apareceu como criminoso.

Esse processo, nós temos que enfrentar. Ou bem é o financiamento público, ou bem vamos regulamentar um modelo de financiamento privado que acabe com a criminalização, o farisaísmo e a judicialização da política. Eu defendo o financiamento público da política.

Pois não, deputado Chico Lopes, meu companheiro, do PCdoB.

Deputado Chico Lopes - A contribuição que eu ia dar era exatamente na hora em que V.Exa. falou sobre financiamento. A campanha no Brasil tem a sua desonestidade pela sua forma de ser. O financiamento é privado, o Tribunal faz de conta que limita, que fiscaliza. Às vezes, cria-se uma confusão na contabilidade. Mas nós sabemos que os grandes grupos elegem os seus representantes tanto para o Senado, quanto para a Câmara, quanto para as Assembléias, inclusive os vereadores de capital. Quando V.Exa. cita o tipo americano, eu acho que tem de ser aberto. Mas aí, eu, Chico Lopes, o Genoino e alguns outros não vêm para esta casa.

Deputado José Genoino - É claro. V.Exa. tem razão.

Deputado Chico Lopes - Aí nós não vamos entrar aqui. Começa-se com os lobbies dos deputados para poder continuar o financiamento. Porque quem come do meu pirão prova do meu cinturão.

Deputado José Genoino - Está certo.

Deputado Chico Lopes - Sou parlamentarista, sou a favor da lista aberta e fechada ao mesmo tempo, mista. Eu acho que, no presidencialismo, vamos continuar com essas crises que, no sistema parlamentarista, se resolvem facilmente. Evidentemente, houve uma votação para escolher se o sistema seria parlamentarismo ou presidencialismo. Mas o Brasil também age de forma muito emocional.

Portanto, a reforma política tem que ser discutida abertamente, mas com a participação da sociedade e não só dos partidos políticos. Aí, vale quem tem mais força. Por último, devido ao pouco tempo de que V.Exa. dispõe, acho que o povo entra muito pouco no Parlamento brasileiro. Ele só entrará quando tiver financiamento público, com parlamentarismo, ou outro tipo de sistema, mas com o presidencialismo que vai aí, meu amigo, paciência. Concluo, deputado José Genoino, V.Exa. não acha que democracia nesta casa é para meia dúzia? Há ditadura da liderança, há ditadura da mesa, etc. Nós, hoje, aproveitamos a hora do pobre, que é hoje e segunda-feira. Não temos quase participação. Se quisermos dizer alguma hoje, é hoje ou segunda-feira, porque nos outros dias há os donos do palanque, há os donos do horário. É a ditadura, não é democrático. Obrigado, deputado.

Deputado José Genoino - Deputado Chico Lopes, incorporo o aparte de V.Exa. ao meu pronunciamento. V.Exa. tem total razão. Ou tem o modelo americano, que é o poder econômico escancarado, elegendo quem eles querem, e está aí a arrecadação dos candidatos que estão disputando as primárias, ou vamos para o modelo público. Eu defendo o modelo público de financiamento da campanha eleitoral. É um modelo correto, é mais democrático, porque democratiza as oportunidades.

Mas também quero dizer, deputado Chico Lopes, que fui derrotado no parlamentarismo, dentro do PT e na sociedade. Esta casa perdeu uma grande oportunidade de discutir o sistema de governo na Constituinte, mas impedida pelo casuísmo de 4, 5 ou 6 anos. Neste momento, temos que aperfeiçoar o presidencialismo. Para voltar a discutir o parlamentarismo, só com o plebiscito, porque a Constituição diz: o poder emana do povo, e só em seu nome pode ser exercido, diretamente ou através da representação. E o povo decidiu pelo presidencialismo no plebiscito.

Concluo o meu pronunciamento, sr. presidente, dizendo de certa maneira, autocriticamente, que sou contra o voto distrital e o voto facultativo. Já me posicionei nesta casa, duas vezes, sobre voto facultativo. Acho que é um equívoco. O voto é um direito, mas esse direito impõe um dever. E esse dever na democracia torna o voto uma obrigação para o exercício da cidadania, porque é um direito tão importante porque o poder nasce do povo, que implica num dever. Eu defendo o voto obrigatório. Assim como, em alguns momentos, o debate sobre o voto distrital. Algumas vezes eu opinava que o distrital misto poderia ser o caminho. O voto distrital no Brasil congela, nos distritos, a situação política oligárquica. E há mais um problema: tecnicamente, no Brasil não funciona, porque o número de cadeiras para as assembléias não coincidem com o número de cadeiras para a Câmara Federal.

Vamos ter uma multiplicidade de distritos e uma confusão.

Em relação ao sistema eleitoral, quanto mais simples para o povo escolher os seus representantes, mais democrático; quanto mais complexo, mais difícil a legitimidade da representação política.

Ao expressar essas opiniões, vou defender que o meu partido mantenha o tema da reforma política na agenda nacional. Se não tivermos condições — e acho difícil — nesta Legislatura de realizar a reforma política, defendo o seguinte caminho, fora de qualquer terceiro mandato, de plebiscito ou de casuísmo: os deputados e Senadores eleitos em 2010 teriam, como função constitucional, de se reunir unicameralmente, por maioria absoluta, e votar em 2011 os itens da reforma política e da organização dos Poderes.

Sem isso, primeiro, fazer uma reforma política com três quintos, a Câmara e o Senado sem condições de se entenderem, uma casa revisando a outra, não vamos longe com essa reforma política. Como houve a constitucionalização das coligações na eleição proporcional, a constitucionalização da cláusula de barreira e a constitucionalização da fidelidade partidária, para enfrentarmos esse problema, só com emenda constitucional, pois é difícil chegar a um consenso.

Se não for possível, vamos adotar em 2010, nas eleições — oportunidade, deputado Chico Lopes, na qual iremos discutir com o povo e cada partido apresentará a sua plataforma e quem for eleito tomará posse em 2011. Assim, teremos 6 meses, de maneira unicameral e por maioria absoluta, para votar apenas os artigos da reforma política e da organização dos poderes.

Não podemos criar uma espécie de Constituinte com soberania ilimitada, porque vamos criar uma estabilidade política para muitas conquistas da Constituição.

Acho que esse caminho é o mais adequado. Lutarei para incluir na agenda alguns itens da reforma política, como, por exemplo, essa emenda que regulamenta a medida provisória. Vamos discutir uma emenda para acabar com coligação na eleição proporcional, vamos discutir uma emenda sobre fidelidade partidária.

Estou de acordo com tudo isso, mas duvido que possamos fazer uma reforma política sem um Congresso revisor específico para 2011.

Temos de aperfeiçoar os mecanismos da democracia participativa. Foi um grande avanço o plebiscito, o referendo e a consulta, mas temos uma limitação para a iniciativa de leis. Devíamos diminuir o número de eleitores para apresentar proposições de leis.

Acho que devemos permitir ao eleitor apresentar emendas constitucionais, porque hoje é só por meio de leis ordinárias.

Temos de discutir a reforma política dentro dessa visão processual. Agora, vamos nos libertar definitivamente de qualquer interesse imediato, interesse casuístico, que inviabilizaremos.

Para nós, da esquerda, reformar e aprofundar a democracia é uma questão estratégica.

Muito obrigado, sr. presidente.

Deputado Alceni Guerra - A mesa cumprimenta V.Exa., deputado José Genoino, pelo excelente pronunciamento.

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