Trajetória

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Genoino diz que PT mudou, mas nem tanto assim - Sabatina da Folha de São Paulo, 2002

Com discurso à direita do defendido historicamente pelo PT, o candidato do partido ao governo de São Paulo, José Genoino, 56, defendeu o "uso da força" no combate à violência. O petista disse que cumprirá as determinações de reintegração de posse de áreas invadidas por sem-terra e se mostrou contrário ao fim da repetência no ensino público, iniciativa do educador Paulo Freire na gestão de Luiza Erundina (1989-92), então no PT. O candidato fez uma separação ao abordar as acusações de um esquema de propina e formação de caixa-dois na administração petista de Santo André. Isentou o presidente do PT, José Dirceu, de envolvimento no caso, mas não fez o mesmo com três petistas envolvidos. "Não estou aqui para defender os empresários nem para defender esse ou aquele administrador do PT", afirmou. Entrevistaram Genoino, na série "Candidatos na Folha", o secretário de Redação Fernando Canzian, o editor de Cotidiano, Nilson de Oliveira, o editor do Painel, Rogério Gentile, e o secretário de Redação da Folha Online, Vaguinaldo Marinheiro.

O candidato José Genoino abriu a sabatina afirmando por que entrou na disputa pelo governo de São Paulo. "A política, para mim, está centrada em valores. Ao longo da minha vida, três são inegociáveis. O valor da democracia, o da ética republicana e o de uma sociedade socialmente civilizada, socialmente justa, com base no princípio da igualdade e da dignidade humana. O Estado de São Paulo tem que ser protagonista de um novo modelo de crescimento. Na nossa concepção, não há crescimento sem emprego e não há emprego sem crescimento econômico", afirmou o petista.

Fernando Canzian, secretário de Redação e mediador, fez a primeira pergunta a Genoino, listando as acusações de corrupção nas administrações petistas de Santo André e do Rio Grande Sul, e questionando se o PT se tornou um partido como os outros. "O PT amadureceu, mudou, mas não mudou de lado. E o PT não está na vala comum. Quando há erros, apuramos, punimos, afastamos. O PT, quando tem problemas, investiga, é transparente. O que o PT não aceita é colocar a sua história política e o seu patrimônio ético na vala comum", respondeu o candidato.

"Onde o PT governa pode ter falhas. Somos transparentes e temos um padrão e uma história de valores que vamos preservar. Vamos defender custe o que custar." Canzian lembrou que 12 pessoas foram acusadas de corrupção em Santo André, sendo três delas petistas ligadas ao prefeito Celso Daniel, assassinado em janeiro deste ano. Perguntou se o caso viria à tona sem que tivesse ocorrido a investigação do crime. "O Celso Daniel está morto. O partido não vai deixá-lo morrer pela segunda vez. Não vai aceitar matá-lo de novo, porque ele não pode se defender. O envolvimento do presidente do PT, José Dirceu, foi sim uma manipulação política a partir do depoimento do irmão do Celso Daniel, como concordou o Supremo Tribunal Federal. O que aconteceu com a morte do Celso Daniel foi uma tentativa de um setor, não digo de todo o governo [do Estado], de fazer da morte do Celso Daniel uma maneira de criarem uma acusação contra o PT", declarou o candidato petista. "Pode haver irregularidades onde o PT governa? Pode. Mas sabe qual é a diferença? É que vamos investigá-las e puni-las. Não estou aqui para defender os empresários nem para defender esse ou aquele administrador do PT."


Vaguinaldo Marinheiro perguntou por que nenhum funcionário da Prefeitura de Santo André foi afastado, já que há cinco anos foram iniciadas as investigações de irregularidades. "Não havia nenhuma decisão formal do Ministério Público. As investigações estavam abertas e estávamos acompanhando o processo. Como não havia uma decisão judicial, como você vai tomar uma decisão de afastar esse ou aquele dirigente, esse ou aquele administrador?"

Nilson de Oliveira disse que as empreiteiras são grandes financiadoras de campanhas e perguntou a razão de os vereadores petistas de São Paulo não terem apoiado a criação de uma CPI que investigasse as grandes obras municipais, apesar de historicamente criticá-las. "Não fizemos nenhuma oposição a isso. O PT não tem maioria para instalar essa CPI na Câmara", rebateu o petista. Canzian afirmou que, no lançamento do programa de governo de Genoino, havia 16 carros oficiais de administrações regionais petistas. Perguntou se considerava eticamente defensável o uso de bens públicos em campanha. "Em relação a campanha eleitoral, a representação [que pedia a investigação do uso dos carros] foi simplesmente arquivada. Não tinha nada a ver com a campanha eleitoral. Os carros não foram usados para a campanha eleitoral. A lei permite que as autoridades se movimentem em carro oficial desde que não estejam fazendo campanha eleitoral. Estou muito à vontade porque eu nunca usei carro oficial. Nunca na minha vida como deputado federal."


Canzian perguntou se, ao defender a Rota (tropa de elite da PM) nas ruas, Genoino não se igualava ao candidato do PPB, Paulo Maluf. "Desta boca não saiu uma expressão de Rota na rua. No meu governo as forças especiais de segurança vão agir de maneira especial, com comando especial. Só devem agir quando você tem o alvo. Temos que trabalhar na segurança pública com duas frentes: a da prevenção social, com o enfrentamento da desagregação, da falta de esperança, da falta de alternativa, e a do aparelho policial, bem comandado e com firmeza", declarou. "O uso da força é diferente do da violência. A força é a autoridade, é coação. Violência é guerra. No meu governo, a polícia vai ser forte e enérgica, mas não vai ser violenta para fazer guerra. Ela pode combinar o uso da força com a política de prevenção."


Vaguinaldo Marinheiro perguntou se Genoino manteria o programa do governo do Estado que afasta para tratamento psicológico policial que mata alguém em confronto. "Não mantenho. O programa precisa passar por uma revisão, porque coloca todos os policiais que participam de qualquer ação violenta no mesmo patamar. Isso é errado. Tem ações que a polícia, legitimamente, pode ser obrigada a participar de conflitos violentos." Gentile perguntou sobre a proposta de redução da maioridade penal de 18 para 14 anos. "Sou contra. A juventude não pode ter como destino as penitenciárias que são escolas do crime", disse.


PT E QUÉRCIA - Canzian afirmou que o PT criticava as alianças à direita de Fernando Henrique Cardoso no passado, mas hoje as repete, ao, por exemplo, aceitarem o apoio do ex-governador Orestes Quércia. "O PMDB apóia nacionalmente a José Serra. No Estado, tem candidato a governador. Portanto não há aliança política eleitoral com o PMDB de São Paulo. Se qualquer político como o Quércia declara o voto no Lula, a declaração de voto não muda o programa do PT, os compromissos do PT, nem a identidade do PT."
LULA E GENOINO - Vaguinaldo Marinheiro afirmou que, segundo o Datafolha, entre os eleitores de Lula, o Maluf alcança 37% das intenções de voto, e Genoino, 23%. "52% da população de São Paulo ainda não tem candidato. Na hora que a gente conseguir mostrar a minha história política, a minha ligação com a candidatura do Lula, com as administrações do PT e a legenda PT, pode ter certeza, vamos subir", declarou o candidato petista.


EDUCAÇÃO - Nilson de Oliveira afirmou que foi o educador Paulo Freire, na então gestão petista de Luiza Erundina (1989-1992), que criou a chamada progressão continuada, que não reprova alunas que frequentem a escola, como forma de evitar a evasão. Indagou por que Genoino se diz contra a medida. "Sou contra naquilo que ela virou promoção automática, garantia de que o aluno vai passar, mesmo sem estudar", disse.


GESTÃO MARTA - Uma leitora perguntou se Genoino concordava que a prefeita Marta Suplicy estava querendo mais ser uma atriz global do que figura política, por sua frequência constante nas revistas de celebridades. "A Marta Suplicy trabalha para melhorar a cidade de São Paulo. Acho que as pessoas deveriam respeitar a individualidade da prefeita. Não pratica nada no governo que comprometa a maneira ativa e generosa de sua liderança em São Paulo." Outro leitor perguntou quem Genoino apoiará, se o segundo turno for entre Maluf e Alckmin. "Pode ficar tranqüilo que você vai votar em Genoino para derrotar ou Alckmin ou Maluf." O petista falou de suas relações com o MST, se eleito. "Sou contra a invasão de terras produtivas, sou contra a invasão de fazendas legalmente constituídas. Sou favorável a uma reforma agrária, em áreas devolutas e terras improdutivas. Vou negociar com o MST. O governo tem que agir no limite para fazer a negociação sem usar a violência. No limite, usa a força, sem violência."

Jornal Folha de São Paulo - 24 de agosto de 2002

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