1982-2002

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Por que uma CPI

É comum ouvir-se a afirmação de que a corrupção ocorre em todas as democracias do mundo. Isto até pode ser verdade, mas em relação ao Brasil há diferenças. Enquanto que em muitos outros países os corruptos vão para a cadeia aqui se chega, no máximo, à cassação de mandatos. Em outros países os corruptores também são pegos. Aqui, os partidos governistas impediram a convocação da CPI dos corruptores. Após o impeachment e a CPI do Orçamento a corrupção, infelizmente, continua ocorrendo em larga escala. Muitas das sugestões das CPIs não foram institucionalizadas pelo Congresso. É lamentável que muitos daqueles políticos e partidos que ontem se situavam na trincheira da moralidade e da transparência, hoje adotem o acobertamento da impunidade.

É oportuno lembrar que o PSDB nasceu em 1988 rompendo com o fisiologismo do "toma-lá-dá-cá", que estaria sendo praticado pelo PMDB e pelo governo Sarney. O discurso ético, a exigência de transparência e das reformas das instituições políticas eram marcas registradas do partido nascente. Já, agora, no poder, além de não querer investigar irregularidades, acaba legitimando este tipo de política. Sem uma CPI para investigar a compra de votos na votação da emenda da reeleição desmorona um dos pilares do discurso do governo. O presidente Fernando Henrique tanto se gaba de que em seu governo não há casos significativos de corrupção e de que acabou com a prática do "toma-lá-da-cá". Os fatos, contudo, vêm sendo mais fortes que as palavras. O governo, por exemplo, impediu a CPI do sistema financeiro e não esclareceu as dúvidas do caso Sivam.

O principal argumento que os governistas usam para barrar a CPI é inaceitável. Para o governo a CPI serviria de palanque vingativo das oposições e teria como fim paralisá-lo. Pior do que isto, porém, é livrar a cara dos corruptos e dos corruptores e deixar que as instituições democráticas erodam pela imoralidade. Parece que na era tucana CPIs para investigar os governistas não valem. Mas CPIs para investigar opositores, como a dos precatórios, valem. Ou será que da mesma forma como o governo se julga o dono da verdade se julga também o dono da moralidade? E será que a infinita infalibilidade não lhe confere também um ilimitado alcance de cometer todos os tipos de atos — mesmo aqueles que, se praticados por simples mortais, seriam imorais —, porque são feitos em nome da razão?

Para um governo que se julga expressão da voz das ruas e encarnação da sociedade não há justificativa para impedir a convocação da CPI. Afinal de contas, as pesquisas indicam que a voz das ruas e a maioria absoluta da sociedade querem a CPI. É preciso deixar claro que a CPI não será um palanque da oposição e nem se destina a paralisar o governo e o Congresso. A CPI é um instituto normal da democracia para fiscalizar os poderes. As fitas divulgadas pela imprensa revelam irregularidades sérias e apontam para possíveis corruptores. Punir os parlamentares por falta de decorro é insuficiente. É preciso ir mais longe para resgatar a combalida credibilidade do Congresso. É necessário que se investigue também, a fundo, quem patrocinou a compra dos votos. Caso contrário o governo, a Câmara e o instituto da reeleição estarão marcados com a tarja da suspeição. É preciso que os políticos tenham consciência de que a denúncia envolve irregularidades relacionadas a uma emenda constitucional que mudou uma instituição política tradicional da República e que tem largo alcance sobre o futuro político do país.

Se o parlamento se omitir e se as denúncias não forem investigadas até as últimas consequências a reeleição terá nascido como filha da corrupção. Como tal, será uma prolífica mãe de muitas filhas, igualmente corruptas e corruptoras. Imagine o leitor, se para aprovar a emenda ocorreu a compra de votos, o que não ocorrerá nas prefeituras, nos estados e no governo federal durante as campanhas eleitorais para reeleger governantes que sequer se licenciarão para disputar o cargo uma segunda vez. Parece que só agora todas as advertências e a oposição que fizemos à emenda da reeleição começam a fazer sentido.

O mais espantoso de tudo é que após as graves suspeições que pesam sobre os métodos utilizados para aprovação da reeleição na Câmara os governistas tenham dado tramitação à emenda no Senado. No dia em que espocaram as primeiras denúncias a Comissão de Constituição e Justiça daquela Casa aprovou a emenda. O imperativo da responsabilidade política e o devido respeito que a sociedade merece indicam que a tramitação da emenda deveria ser paralisada até a apuração de todas as denúncias. Sem isso, o instituto da reeleição carregará o peso da ilegitimidade. A única forma de restituir legitimidade à reeleição é submete-la a um referendo popular.

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