1982-2002

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Reconstruir a esquerda

A idéia da reconstrução da esquerda, certamente, não tem um sentido unívoco, nem na abrangência de seus conteúdos e nem nas várias interpretações sobre o significado da idéia. A idéia da reconstrução, porém, parece, parte da constatação comum de que a esquerda fracassou nas suas experiências concretas, como no socialismo real ou no comunismo. Outro ponto de partida está no fato de que a esquerda democrática enfrentou, e em parte ainda enfrenta, uma grande defensiva nos países de capitalismo avançado e nos países em desenvolvimento.

Mas as vitórias dos trabalhistas na Grã-Bretanha, dos socialistas na França, do PRD de Cárdenas na Cidade do México etc., indicam que há um grande espaço político para o crescimento da esquerda no rastro do fracasso dos programas neoliberais e conservadores. A reconstrução comporta também a constatação de que não há mais lugar para uma esquerda única, suposta portadora da "verdade". A esquerda emergente (ou as esquerdas), será necessariamente pluralista. Com efeito, a falência do "socialismo científico" e de muitas das predições de seus cânones, desfez as condições para que o dogmatismo teórico se apresentasse como usurpador da "verdade". Norberto Bobbio tem razão quando indica que a grande matriz identitária da esquerda é o ideal da igualdade. Mas, mesmo os caminhos, o alcance, os limites e o conteúdo da realização deste valor-guia são plurais.

Diante de um mundo cindido entre os detentores de direitos, de riqueza, de bem-estar, de cidadania, de saber e de bens de consumo e os que estão à margem da estrada do progresso, os sem direitos, os sem cidadania, os sem conhecimento os sem capacidade de consumo etc., o valor da igualdade mostra-se não só atual, mas fundamental para todos os que aspiram uma humanidade justa e civilizada. Contudo, o primeiro grande ajuste de contas que a reconstrução da esquerda requer é com o valor da liberdade. Do ponto de vista dos ideais políticos, a liberdade é o valor supremo. Neste sentido, a igualdade só pode ser buscada no interior da liberdade política. Disto decorre que os caminhos, os métodos e os valores democráticos devem ser estratégicos para a esquerda. Ou seja, somente um partido reformador, que saiba combinar a luta social com a luta institucional, terá condições de liderar setores significativos da sociedade na luta por justiça, cidadania e liberdade.

Ao optar pelos métodos e valores democráticos a esquerda deve dar menos ênfase à questão do modelo de sociedade e mais importância ao modelo de Estado. A crítica teórica ao totalitarismo deixou mais ou menos evidente que toda a tentativa de formatar a sociedade está implicada com pressupostos autoritários. A sociedade democrática é, por definição, uma sociedade aberta, referenciada em métodos e valores. O Estado define os parâmetros da esfera pública da sociedade, é o principal instrumento de arbitragem dos conflitos e o espaço onde se define o sentido social e civilizatório. Por isso, é o objeto essencial da ação política. O mercado é uma dimensão irredutível de qualquer socieade. Mas ele não pode ser concebido como um espaço absolutamente autônomo. Historicamente, e mesmo no capitalismo moderno, sempre foi definido pelo poder público. Se a democracia é a sociedade de equilíbrio, o mercado deve ser socialmente regulado.

A ação estratégica de um partido se expressa no seu programa político, que deve remeter-se para a busca do poder, condição de sua realização eficaz. Por ter um alcance limitado no tempo, o programa deve ser realista definindo prioridades, metas e soluções viáveis para os problemas da sociedade. Neste sentido, o PT encontra-se diante de dois momentos importantes da sua história: tem um Encontro Nacional pela frente e prepara-se para disputar a terceira eleição presidencial. Neste processo, o partido redefinirá o seu programa e terá que dar conta de insuficiências verificadas na disputa de 94 e no decorrer dos últimos anos. Pode-se dizer que o programa deverá enfrentar quatro grandes leques de questões: 1) redefinição de um novo modelo econômico com estabilidade, desenvolvimento e eqüidade; 2) nova agenda de reformas democratizadoras em oposição ao status quo e à agenda conservadora; 3) a crise social e o financiamento das políticas públicas; e, 4) nova agenda internacional voltada para a inserção autônoma do Brasil na globalização.

Se o PT quiser ser conseqüente com compromisso que tem com as transformações sociais deve disputar as eleições para vencer, já que não há forma mais rápida e eficaz de efetuar mudanças do que a disposição do poder político. Não vencerá ou não conseguirá governar sem uma política de aliança de esquerda e com setores de centro-esquerda. Ao contrário do que se pensa, a aliança não é uma mera questão de tática eleitoral. Ninguém garantirá a governabilidade sem o respaldo de maiorias sociais e políticas.

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