1982-2002

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Partidos em liquidação

A aproximação da data limite para filiação ou mudança de partido para efeito de concorrer às eleições do próximo ano (3 de outubro), expõe a liquidação do atual quadro partidário. A rigor, apenas dois partidos soçobram no naufrágio geral. De um lado, o PFL, como partido-Estado ou partido-poder. De outro, o PT, como partido- sociedade, como partido-movimentos sociais. Se o PFL e o PT têm méritos, cada um ao seu modo, de manter uma estrutura mais estável, não significa que tenham equacionado o principal desafio dos partidos brasileiros. Qual seja, definir um projeto para o país. No terreno dos projetos, o PFL topa qualquer coisa desde que o seu lugar como partido-poder esteja garantido. Apoiou o Plano Cruzado, o Plano Collor e apóia o Plano Real. O PT, por seu lado, sofre para libertar-se de uma tradição analítica marxista e mal engatinha na definição de um projeto político nacional, contemporâneo e realista. De qualquer forma, todos os partidos, em maior ou menor grau, sofrem o impacto das dissidências e das agregações. Uns perdem por não estarem no centro do poder, como é o caso do PMDB, do PPB etc. Outros, como o PFL e PSDB, os "partidos-ônibus", ganham por estarem exatamente no centro do poder. O PSB ganha por ser um partido fluido e pouco definido. O PT perde por exasperar a sua virtude de querer constituir-se como partido orgânico. A verdade é que sem uma reforma política institucional a instabilidade partidária e a dança da infidelidade continuarão ditando o ritmo dos políticos.

Uma das principais características da política moderna consiste em que ela expressa uma articulação de interesses. Várias experiências democráticas mostram que sem uma estrutura partidária estável não há uma definição clara de interesses, não se formam maiorias e minorias definidas e a representação política tende a ficar gelatinosa. No caso da experiência brasileira, a ausência de uma estrutura partidária satisfatória acarreta problemas de governabilidade. Os governos não têm as condições para implementar programas. Precisam negociar a todo momento, ponto a ponto do programa. Esta situação produz sucessivas crises de governabilidade. No Congresso também não se formam bancadas governistas e oposicionistas com políticas definidas. A infidelidade e a ausência de atuações por bancadas constituem o caldo de cultura onde germinam a ineficiência e o vírus do fisiologismo.

A fragilidade dos partidos suscita dois fenômenos paralelos no eleitorado. O primeiro, é a ojeriza geral aos políticos, principalmente aos parlamentares. O segundo, é o desprezo aos partidos que se manifesta na intenção de definir o voto a partir de uma avaliação individual do candidato, independentemente do partido. Não quero negar a validade do critério da definição do voto a partir das qualidades do candidato. Mas quando este critério é dissociado do partido ele expressa uma fragmentação dos interesses e dos conteúdos que estão postos em jogo numa eleição. Um candidato ou um representante político, por mais qualificado que seja, não será capaz de produzir as mudanças necessárias ou as políticas adequadas se não tiver o respaldo de maiorias partidárias. Claro que o problema não está no eleitor, mas na estrutura partidária apodrecida que não consegue produzir escolhas racionais a partir das plataformas dos partidos.

No presente momento coube a um dos intelectuais mais conscientes da importância da estabilidade partidária para a democracia desferir um duro golpe nos partidos. Estou falando do presidente Fernando Henrique Cardoso. A forma como conduziu o governo sufocou o PSDB, dividiu o PMDB e o PPB e aplastou a oposição. E a estrutura que pretende dar a sua candidatura à reeleição, subordinando profundas divergências partidárias e regionais à sua figura suprapartidária, tende a fragilizar ainda mais estes três partidos. O grande beneficiário desse processo, por ter a melhor âncora, o poder, deverá ser o PFL. Na oposição, o PT luta para manter sua vocação de afirmação partidária tentando encabeçar uma chapa presidencial. Mas existem problemas e desafiantes. A inexistência de um programa unificador da esquerda e de setores de centro-esquerda pode ser fatal à pretensão, correta, de uma candidatura única das aposições.

As instituições políticas, por definirem as condições da tomada de decisões do poder, deveriam ter sido as primeiras a serem reformadas. Infelizmente, até o final de 1998 não se vislumbra a possibilidade desta reforma. Diante disto, o primeiro ato da legislatura que começará em 1999 deverá ser a realização de uma reforma política e partidária profunda. Entre outras coisas essa reforma deve extinguir os partidos de aluguel, estabelecer a fidelidade partidária, redefinir o sistema eleitoral e corrigir a representação dos Estados na Câmara. Sem a reforma política o Brasil continuará a ser vitima de si mesmo por ser incapaz de produzir um sistema adequado e coerente de representação.

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