1982-2002

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A crise urbana

O termo "Cidade" designa a idéia de civilização e desenvolvimento. Foi no processo de afirmação das Cidades-Estados gregas que a própria Civilização Ocidental teve origem. Em todas as épocas, a cultura da urbanização, contraposta à cultura agrária, significou a modernização. Hoje, no entanto, as grandes metrópoles dos países em desenvolvimento, e principalmente do Brasil, são palcos de um evidente mal-estar. Ao lado das luzes do progresso, do conforto e do consumo convive a miséria, o lixo, a violência e a degradação humana.

Não bastasse esse apartheid social abrupto uma outra ordem de problemas agridem as vidas dos cidadãos e os mergulham numa espécie de guerra cotidiana. E a falta de transporte coletivo, congestionamentos gigantes, ruas movimentadas entupidas de camelôs, mendigos e crianças pedindo esmolas em vários pontos, prostituição infantil, delinqüência juvenil, crime organizado, sujeira espalhada pelas ruas e praças, esgoto a céu abertura nas periferias, poluição, saúde pública falida, escolas públicas depredadas, falta de policiamento e de segurança, medo, desemprego etc. Em suma, é interminável o rosário de problemas que transforma a vida do cidadão num calvário. A falência do poder público em todas as suas esferas, municipal, estadual e federal, é mais visível nas grandes cidades.

São Paulo e Rio de Janeiro apresentam níveis insuportáveis de problemas urbanos. As batalhas dos camelôs e dos perueiros ocorridas nas últimas semanas são a síntese da crise urbana. Os dois setores devem sua existência ao desemprego. O Plano Real, com efeito, trouxe os benefícios da estabilidade monetária. Mas os seus custos sociais são elevados e os governos estão se mostrando incompetentes para gerar políticas de emprego. Nesta semana mesmo foi divulgada a taxa de desemprego medida pela Fundação Seade e pelo Dieese dando conta de que, em setembro, ela atingiu 16,3% na Grande São Paulo. São mais de um milhão e quatrocentos mil desempregados. O potencial de geração de problemas sociais que isto significa é enorme, já que é preciso levar em conta as famílias desses desempregados.

Os perueiros proliferam na brecha das péssimas condições do transporte coletivo. Nesta área, não há investimento, não há planejamento e não há inovação. Produz-se uma selvagem guerra de interesses entre categorias diversas: motoristas de ônibus contra perueiros, estes contra taxistas etc. As prefeituras jogam uns contra os outros e se esquecem dos usuários. A crise dos transportes produz uma zona de intersecção entre o lado pobre e o lado rico da cidade: uns esperam nas filas ou no interior dos ônibus; outros ficam presos em seus carros nos congestionamentos. Ambos pagam os custos emocionais e materiais desta situação. Quase todos os serviços públicos estão envolvidos numa malha de atividades clandestinas e irregulares que provocam graves riscos à população. O papel de árbitro, de regulador, de fiscalizador e de provedor de serviços do setor público é algo em desmontagem.

A crise urbana está ligada a uma escala variável de irresponsabilidades dos setor público. Em primeiro lugar, o cidadão é vitima da irresponsabilidade histórica do crescimento das cidades sem planejamento urbano. Os administradores de hoje justificam as suas omissões pelas omissões do passado. Os investimentos na infra-estrutura dos serviços públicos são precários. Algumas prefeituras estão quebradas e sem capacidade de investir. O exemplo maior, mas não o único, é o da prefeitura de São Paulo que foi levada a nocaute por Maluf para poder eleger o seu sucessor. O PAS (Programa de Assistência à Saúde), que foi um dos carros-chefes da campanha de Pitta, hoje está em estado falimentar. A ausência de uma profunda reforma fiscal, que defina claramente as responsabilidade das esferas municipal, estadual e federal e as respectivas fontes de receitas, é outro fator que intervém na crise urbana. Além do jogo de empurra entre as partes da federação, os sucessivos remendos fiscais prejudicaram os estados e os grandes municípios. Já na área federal, não resta dúvida de que o governo do presidente Fernando Henrique vem promovendo cortes nos investimentos sociais. Levantamento feito pelo senador Jefferson Peres (PSDB-AM) mostra que em 1996 o governo investiu menos 10,3% em saúde e saneamento e menos 8,6% em educação e cultura em relação a 95.

Mas diante de todo este quadro deplorável ocorrem as mesmas coisas de sempre: os governantes com suas imensas irresponsabilidades ficam impunes. Muitos até são reeleitos. Mas a sociedade é permanentemente punida pelos seus governantes e por si mesma. Não haverá saída neste circulo vicioso se a sociedade não jogar o jogo da cidadania com mais eficácia, se não cobrar os seus direitos com mais contundência e se não fizer uso mais racional de seu voto.

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