1982-2002

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A crise, o governo e a oposição

A crise que atingiu os mercados financeiros internacionais e o Plano Real e as medidas do governo para enfrentá-la produzem vários desdobramentos econômicos e políticos. Na economia, resumidamente, a elevação dos juros e o pacote de ajuste fiscal devem provocar um desaquecimento da economia e o aumento do desemprego. Mesmo assim, os pesados custos que as medidas jogam sobre a sociedade não livram o Real de um ataque especulativo, têm efeitos duvidosos sobre a efetiva queda do déficit público e não cobrem o rombo nas contas externas.

Do ponto de vista político, sobre o governo pesa a acusação de que foi omisso nesses três anos de mandato não priorizando a reforma tributária e fiscal, não propondo medidas preventivas de ajuste nas contas públicas, não adotando medidas adequadas nas operações de importação e exportação e mantendo juros altos e um câmbio sobrevalorizado. A sociedade vem tendo uma percepção clara da inação do governo, do seu mero proselitismo discursivo, da ausência de políticas sociais e da penalização da produção, ingredientes que estão encurralando o Plano Real num beco sem saídas. O resultado não poderia ser outro: pesquisas de opinião estão captando tanto a corrosão da credibilidade do governo como desconfianças em relação à eficácia do Plano de estabilização. Para a economia, não há nada pior que um governo sem credibilidade, principalmente em momentos de crise. Assim, a reeleição de Fernando Henrique Cardoso, que era dada como favas contadas até alguns dias atrás, hoje já não é tão certa.

Este quadro beneficia a oposição de esquerda? Pesquisas qualitativas de opinião sinalizam que não. Elas indicam que o percentual de desgaste do governo não é canalizado para a oposição e que, em último caso, parcela significativa dos descontentes prefere ainda o governo à oposição. As pesquisas são praticamente unânimes em mostrar o principal mal da oposição: trata-se de uma oposição que só critica e não apresenta alternativas. Ou seja, o eleitorado, apesar do desgaste do governo, não confia na oposição.

Esta situação mostra que não se pode apostar na tese do "quanto pior melhor". Situações conjunturais recentes e antigas já deixaram uma lição definitiva ensinando que em situações de crise e mediante uma oposição que não apresenta alternativas consistentes e confiáveis, o eleitorado prefere saídas conservadoras. Só para citar um exemplo, a reeleição de Menen, na Argentina, ocorreu num quadro de crise social e econômica. A vitória recente da oposição argentina nas eleições legislativas só ocorreu porque ela se mostrou articulada em torno de eixos programáticos mínimos e porque inspirou confiança na sua capacidade de conduzir a estabilidade econômica. A rigor, a vitória dos socialistas na França também ocorreu porque souberam apresentar soluções e inspirar confiança. Por outro lado, os trabalhistas ingleses venceram as eleições num quadro de recuperação econômica sob o governo conservador. Com isso, quero insistir numa idéia que venho enfatizando: com o desenvolvimento dos processos eleitorais e democráticos o eleitorado se torna cada vez mais racional nas suas escolhas percebendo onde se localizam os maiores riscos para a governabilidade.

Criticar e apontar erros do governo, de fato, é uma tarefa e uma das responsabilidades da oposição. Mas na democracia, a oposição tem também o dever de sugerir alternativas e soluções. Diante da presente crise e do pacote do governo, que penaliza principalmente a classe média e os assalariados, nós da oposição, não podemos deixar de apresenta contrapropostas. Penso, por exemplo, que ao invés de aumentar o Imposto de Renda sobre pessoas físicas deveria ser instituído o imposto sobre grandes fortunas. O governo cortou incentivos fiscais que representam uma economia de apenas R$ 500 milhões. No entanto, é possível atacar as renúncias fiscais através de uma emenda constitucional e cortar outros incentivos economizando bilhões de reais. Calcula-se que os incentivos e as renúncias acarretam perdas de R$ 16 bilhões. O Brasil precisa também de um pacote social que incentive a criação de empregos, proteja os atuais empregados e amplie o alcance do seguro-desemprego.

Hoje não basta apresentar propostas genéricas e boas intenções de justiça social e moralidade. É preciso sugerir programas exequíveis e apontar os meios de realizá-los. Com o desgaste do governo e a persistir a inconsistência da oposição, a crise pode gestar e fortalecer uma alternativa de direita. Por isso, é preciso que a oposição redirecione com urgência a sua avaliação, o seu discurso e os seus objetivos. O sucesso da oposição em 98 depende menos do fracasso do governo e mais de sua capacidade de mostrar que está apta a governar.

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