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As privatizações e a farra reeleitoral

"As privatizações devem tornar-se a principal fonte de financiamento das campanhas de reeleição dos governadores neste ano. Atolados em dívidas e com problemas na arrecadação, a maioria já escolheu a venda de estatais como a melhor forma de asfaltar o caminho até o segundo mandato". É assim que começa uma reportagem publicada no jornal O Estado de S. Paulo no último dia 18 de janeiro. A reportagem não deixa dúvidas quanto à utilização de recursos oriundos das privatizações na realização de obras eleitoreiras, inaugurações e campanhas publicitárias. Instituições federais, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), também estão engajadas na militância pró-reeleição de governadores. O BNDES garante o adiantamento de verbas aos governadores para que possam gastá-las antes mesmo das privatizações.

O programa de privatizações do governo Fernando Henrique Cardoso, articulado com os programas estaduais, está trilhando as veredas da tragicomédia, tão típica da tradição política brasileira. Ou seja, por um lado, temos a comédia do discurso da modernização do Estado. A suposta modernização não passa de uma maquiagem danosa, com a queima de patrimônio e com a aplicação de recursos públicos em obras de duvidosas prioridade e utilidade pública. Por outro lado, temos a tragédia de uma sociedade carente de políticas sociais efetivas. O poder político desperdiça a chance de sanear as finanças do Estado para capacitá-lo em investir em políticas públicas. O destino, técnica e moralmente mais correto, dos recursos das privatizações federais e estaduais deveria ser o do abatimento de dívidas da União e dos estados. Com os altos juros, as dívidas públicas sofrem saltos astronômicos mês a mês debilitando a capacidade financeira do setor público.

Assim, as privatizações servem para o mesmo uso eleitoreiro a que se prestaram os bancos estadais na era anterior ao governo Fernando Henrique. Anos atrás, quebrou-se os bancos estaduais para eleger sucessores. Agora, torra-se as estatais para a própria reeleição. A herança futura desse quadro consistirá em estados endividados e sem patrimônio. As consequências serão aquelas que já estão sendo sentidas pela população da Cidade de São Paulo: fechamento de serviços públicos, como hospitais e escolas, e deterioração das infra-estrutura. A deslegitimação das instituições públicas e dos políticos parece ser outra consequência lógica da manupulação dos bens públicos e da farsa, que em nome da modernização, promove o velho uso privado do Estado. Há um claro divórcio entre Estado e sociedade.

Outro elemento tragicômico das privatizações está no fato de que elas foram efetuadas em nome da modernização e eficiência na prestação de serviços à população. No entanto, o que se vê até agora, é uma precarização ainda maior desses serviços e um aumento extraordinário dos lucros das empresas privatizadas. A Light privatizada (distribuidora de energia no Rio de Janeiro), por exemplo, distribuiu aos seus acionistas um lucro de R$ 251 milhões em 97. Não fez nenhum investimento e a população vive o drama de blecautes freqüentes. Falta de investimentos e deficiência de serviços é a regra na maior parte das empresas privatizadas.

O uso político está ocorrendo também na área dos antigos monopólios. Como se sabe, com a quebra dos antigos monopólios surgiram agências controladoras para regular a prestação de serviços. Na área energética surgiu a Aneel; nas telecomunicações, a Anatel; e no petróleo, a ANP. Estas agências deveriam ser essencialmente técnicas e imunes ao poder político. Sua composição, contudo, foi rateada entre o PFL e o PSDB. Os diretores se distribuem entre o indicados de Fernando Henrique, ACM, Inocêncio de Oliveira, Sérgio Motta etc. Parte do motim dos monopólios continua nas mãos dos velhos sócios do poder, e parte, foi entregue aos novos sócios.

Desgraçadamente para o consumidor, o Congresso não reservou para si nenhuma prerrogativa para estabelecer normas, regulamentos ou para exercer atos fiscalizadores na prestação desses serviços essenciais. Sem nenhum tipo de controle do poder representativo e do público consumidor, as agências tendem a se transformar em balcões de negócios de interesses políticos e privados. Com o modelo de privatizações do governo Fernando Henrique, o Estado deixou de ser prestador direto de serviços públicos e se transformou em regulador e em fiscalizador apenas no papel. Um modelo correto de privatizações, que quisesse preservar os interesses do cidadão-consumidor, deveria garantir a capacidade reguladora e fiscalizadora do Estado, a fiscalização do público consumidor e investimentos das concessionárias com a melhoria dos serviços. Não resta dúvida sobre a necessidade de submeter o Estado brasileiro a um choque de modernização. O problema está no modelo proposto pelo governo, que em essência, mantem os privilégios dos políticos e de determinadas elites e uma cidadania sem direitos.

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