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Controle externo discutível

As programações das TVs brasileiras estão gerando descontentamento em vários setores da sociedade. O baixo nível e a mediocridade de alguns programas, o apelo exorbitante à sexualidade e o estimulo à violência são as áreas mais sensíveis que vêm gerando criticas, protestos e até mesmo tentativas de censura. No Congresso já estão surgindo propostas para a instituição de algum tipo de controle externo sobre as programações de TV. Registre-se que o problema não está ocorrendo só no Brasil. Nos Estados Unidos, por exemplo, determinados programas de TV estão legitimando uma onda conservadora no campo da moral e dos costumes que quer uma legislação mais rígida e restritiva. Parece lógico que todo o abuso da liberdade provoca reações contrárias, que visam até mesmo suprimi-la.

É preciso rejeitar, liminarmente, qualquer tentativa de instituição de lei que vise garantir algum tipo de censura sobre a programação televisiva. A Constituição de 88, no seu artigo 5º, que trata dos Direitos e Garantias Fundamentais, não permite nenhuma forma de censura sobre a atividade de informação e sobre a produção artística, cultural e intelectual. A censura à imprensa e a limitação das liberdades básicas dos indivíduos são incompatíveis ao sistema democrático. Mas a Constituição não é omissa quanto à necessidade de algum tipo de regulação. No artigo 21, inciso XVI, estabelece que compete à União "exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de programas de rádio e televisão". Ou seja, o poder público deve garantir que os programas sejam classificados segundo uma compatibilidade de idade. Já o artigo 220 reafirma a liberdade de pensamento, expressão, criação e informação e a necessidade de classificação das programações e espetáculos segundo faixa etária e horário. Vai mais longe: faculta à legislação federal "estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no artigo 221,...". O artigo 221, em resumo, estabelece os princípios que devem reger a programação de rádio e televisão. A programação, além de dar preferência às finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, deve também observar o "respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família". Assim, a Constituição legitima a reivindicação de uma legislação que garanta às pessoas e às famílias a defesa contra o desrespeito aos "valores éticos e sociais.

Seria o caso de instituir uma lei especial ou um controle externo sobre a programação de rádio e televisão? Reconhecendo que a questão é complexa, parece-me, no entanto, que este não é o melhor caminho. Em primeiro lugar, há a enorme dificuldade de estabelecer os valores e os critérios a partir dos quais uma lei restritiva seria formulada ou um conselho de controle externo julgaria. A sociedade democrática é, por definição, uma sociedade pluralista com diversidade moral e valorativa. Um conselho externo estaria sob o risco de julgar a partir dos valores e critérios particulares de seus membros. Sabemos por experiência própria que, muitas vezes, uma produção artísticas se situa num limite muito tênue da separação da apelação ao sexismo ou à violência.

Ante esta dificuldade básica de estabelecer o controle externo e do perigo de instituir uma lei restritiva, mas reconhecendo também a existência de abusos na programação, é preciso sinalizar dois outros caminhos para salvaguardar os valores éticos e sociais. O primeiro, consiste em recomendar a instituição de um órgão auto-regulador na programação de rádio e televisão como o que existe, por exemplo, na área de publicidade. Este órgão, organizado a partir de uma associação das emissoras de rádio e TV, teria um código de ética e um conselho de avaliação, que julgaria os recursos, as reclamações e os abusos relativos à programação. A existência de um órgão auto-regulador obedece ao principio segundo o qual, o beneficiário da liberdade é também o responsável pelo seu uso correto e pela sua autolimitação.

O segundo caminho, recomendado principalmente ao cidadão, consiste no recurso ao código penal ou ao código do consumidor, se for o caso. As punições às violações dos direitos e valores básicos estão tipificadas nesses códigos. Se um programa de TV, por exemplo, incitar o racismo ou a violência os seus responsáveis tornam-se passíveis de punição, já que cometem um crime. Isto mostra que os responsáveis por programas de rádio e televisão estão submetidos à validez das mesmas leis gerais que incidem sobre a vida dos outros cidadãos. Não é necessária nenhuma legislação especial sobre a programação de rádio e TV, que normalmente se presta à censura e à limitação da liberdade.

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