1982-2002

Artigos | Projetos | Docs. Partidários

Versão para impressão  | Indicar para amigo

Artigos


Crise nos serviços

A crise no fornecimento de energia elétrica no Rio de Janeiro e os transtornos causados pelas chuvas na mesma cidade e em São Paulo são aspectos de um fenômeno mais geral: o colapso dos serviços públicos nas três esferas do Estado, federal, estadual e municipal. A ponta mais aguda desse colapso se manifesta na área da saúde pública, onde são cotidianas as omissões criminosas, a falta de atendimento e o abandono da população. Gestões políticas irresponsáveis, como é notório nos casos das prefeituras do Rio e São Paulo, combinadas com a ideologia do desmonte do papel social e regulador do Estado, como é o caso da maioria dos governadores dos estados e do governo federal, provocaram o sucateamento das complexas redes públicas de serviços.

Nos últimos meses, a opinião pública e os meios especializados vêm experimentando uma sensação de perplexidade ante o que está acontecendo no setor de serviços. As reformas que quebraram os monopólios estatais, as privatizações e as reformas Administrativa e da Previdência sinalizavam, segundo o discurso do governo, uma maior eficiência e qualidade na prestação de serviços e um maior acesso aos mesmos por parte dos cidadãos. Aos poucos, a sociedade descobre que vem ocorrendo o oposto do prometido. O caso das fornecedoras privadas de energia elétrica é evidente por si. Tanto as privatizações que concederam serviços como a reforma Administrativa criaram uma expectativa falsa nos governantes, a de que, de agora em diante, não seria preciso adotar muitas iniciativas na esfera governamental porque os problemas estariam mais ou menos resolvidos. No caso da reforma da Previdência, dia a dia, percebe-se que ela penaliza os trabalhadores e a classe média.

A crise na prestação de serviços, portanto, ocorre em duas frentes. Na frente que corresponde às atividades exclusivas do Estado, como saúde, educação (falta de vagas etc), assistência social, seguro desemprego, meio ambiente etc,. E na frente de bens e serviços para o mercado, que não necessariamente corresponde a atividades exclusivas do Estado, como infra-estrutura, energia, telecomunicações, transportes, mineração etc,. Mas, se no segundo caso o Estado não precisa estar diretamente envolvido, pois pode conceder a prestação desses serviços ou agir em parceria com a iniciativa privada, não pode fugir, porém, de sua função reguladora e fiscalizadora. O modelo de privatização e de concessão de serviços adotado pelo governo está desmoronando exatamente porque não preservou para o poder público esta função inalienável.

Como se sabe, nas áreas dos antigos monopólios foram constituídas agências reguladoras como a ANATEL, nas telecomunicações; a ANEEL, na energia elétrica; e a ANT no petróleo. O papel que foi reservado a essas agências e a sua estrutura enfraquecem o papel regulador e fiscalizador do Estado e as transformam numa espécie de balcão promíscuo onde se misturam interesses públicos e privados. Outro grave erro no processo de privatizações consiste em que o Congresso não reservou para si nenhuma prerrogativa de legislar de forma geral sobre a prestação de serviços transferindo todo o poder para as agências.

Todo esse quadro indica a necessidade de se apresentar uma nova legislação com o objetivo de:

1) recuperar as prerrogativas do Congresso de legislar sobre as prestações de serviços;

2) estabelecer novos parâmetros da relação entre o poder público e as concessionárias de serviços visando, a) garantia da qualidade dos serviços, b) a obrigatoriedade de investimentos das concessionárias, c) garantia de acesso universal aos bens e serviços, d) prerrogativa de interferência do poder público na definição das políticas tarifárias, e) espaço para a fiscalização e cobrança de eficiência por parte dos consumidores e, f) regras e mecanismos duros de fiscalização com a facilitação legal da caçassão das concessões em caso de quebra de contrato;

3) propor nova legislação sobre a estrutura das agências conferindo-lhes um caráter absolutamente público e dotando-as de mecanismos fiscalizadores eficazes;

4) propor uma nova legislação sobre privatizações com a exigências de contrapartidas como, por exemplo, a que determina que toda a empresa que compra um setor lucrativo dos serviços se obrigue a investir em setores não lucrativos;

5) propor uma severa legislação antimonopolista visando salvaguardar os interesses dos cidadãos-consumidores.

Na questão das privatizações, assim, não está em jogo um princípio, mas a forma e o modelo de como foram feitas, o preço implicado no repasse do patrimônio, a relação entre o poder público e o setor privado que explora serviços, as garantias e as contrapartidas constituintes das salvaguardas da sociedade. Não se trata, portanto, de defender uma reestatização das empresas privatizadas, mas de propor uma auditagem das privatizações para verificar se o poder público não foi lesado. A auditagem deve verificar também os riscos que correm os recursos públicos que financiaram as privatizações, principalmente os do BNDES. Trata-se, acima de tudo, de resgatar os direitos dos cidadãos ao acesso a bons serviços.

Busca no site:
Receba nossos informativos.
Preencha os dados abaixo:
Nome:
E-mail: