1982-2002

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O jogo do segundo turno

A existência do instituto do segundo turno num quadro de pluripartidarismo fragmentado como é o sistema partidário brasileiro leva os partidos a tomarem decisões quase sempre difíceis e nem sempre óbvias aos olhos do eleitorado. A definição da escolha, a rigor, não pode ser enquadrada em nenhuma teoria prefigurada. É mais correto tomar-se como base de decisão, e também de análise, cada caso concreto. Analisando cada caso, o partido definirá sua opção à luz de princípios, critérios e interesses.

Pela posição singular que o PT ocupa no espectro partidário brasileiro as suas decisões sobre apoios a outros candidatos no segundo turno têm assumido uma conotação polêmica. Parece-me que existem alguns procedimentos e critérios gerais que devem orientar o partido nas suas decisões relativas a apoios. Para evitar julgamentos equivocados é preciso entender a natureza diferente entre um mero apoio eleitoral em relação a uma aliança que envolve compromissos políticos. O PT deve evitar fazer uma composição de governo com os eventuais candidatos que venha a apoiar. Se o PT disputou o primeiro turno com candidato próprio é sinal indicativo de que não existem condições políticas de compor alianças com outros partidos que passaram para o segundo turno. Qualquer apoio do PT a outros candidatos, portanto, deve garantir a sua independência em relação a eventuais governos desses candidatos.

Para definir o apoio, o PT deveria levar em conta basicamente dois critérios: o histórico e o compromisso democrático do candidato e o comprometimento com a probidade administrativa. O partido optaria, entre dois candidatos, por aquele que atende melhor esses critérios. Por exemplo: o PT acerta, em Goiás, quando define o apoio a Marconi Perrilo (PSDB) contra Iris Resende (PMDB). Se o PSDB adotasse esse mesmo critério apoiaria Cristovam Buarque (PT) em Brasília ao invés de apoiar Joaquim Roriz (PMDB). Tanto Iris quanto Roriz representam as velhas oligarquias do Brasil Central e usam métodos políticos que devem ser banidos da política brasileira. E o que dizer do apoio que Cristovam Buarque recebe do PFL? Da mesma forma que o governador de Brasília não solicitou o apoio deste partido não tem também o poder de recusá-lo. Aliás, apoios eleitorais de partidos adversários não precisam ser recusados desde que não representem nenhum compromisso político.

Outro critério que pode ser levado em conta para definir apoio a um candidato no segundo turno diz respeito à idéia do "mal menor". Nas discussões que precedem a definição do PT de São Paulo em relação a Covas e Maluf, algumas lideranças argumentaram que a tese de "mal menor" constitui uma base equivocada de decisão. Não concordo. Seria a mesma coisa que dizer que o purgatório e o inferno são iguais. É preciso levar em conta as consequências que o ato de governar produz sobre a sociedade. Para os governados, faz diferença entre um governo menos ruim do que um ruim. E como a essência da ética política é a responsabilidade, é dever dos políticos sérios não só de lutar pelas melhores alternativas para a sociedade, mas de evitar as piores quando não há outras saídas.

É o que ocorre em São Paulo. Maluf, agora associado a Fleury e Rossi, representa a aliança do "mal". Tem um passado de comprometimento com a ditadura e com a repressão; expressa o valor do "rouba mas faz"; tem uma longa folha corrida de denúncias de improbidade administrativa como superfaturamento em licitações públicas, escândalo dos precatórios, frangogate, etc. Nos governos que exerceu mostrou-se irresponsável administrativamente comprometendo os recursos públicos e destruindo os aparatos e meios de aplicação do políticas públicas nas áreas da saúde, educação e habitação popular. Encarna uma visão autoritária de Estado e na própria campanha manifestou a intenção de aplicar uma política truculenta na área da Segurança Pública. Sua passagem pela Prefeitura deixou um rastro de destruição do poder público. Além disso, Maluf articula hoje uma alternativa de extrema-direita para o país.

Com Covas, o PT tem divergências políticas e programáticas. PT e PSDB expressam hoje projetos diferentes. Por isso, advoguei que um eventual apoio a Covas não deveria implicar nenhum compromisso com seu governo. Esta postura resguarda a dignidade do PT. Com Maluf, além das divergências políticas e programáticas, o PT tem divergências éticas e morais. Maluf não só não tem compromisso com os direitos humanos como é seu inimigo declarado. Alguns dos valores mais caros que restam à esquerda nesse final de século são justamente os valores expressos pelos direitos humanos. Disso decorre um dever imperativo para o PT de lutar contra a volta do malufismo. A decisão do PT de São Paulo de permitir que seus militantes possam manifestar publicamente seu voto é satisfatória e representa o limite possível, dadas as circunstâncias internas do partido. No meu caso, eu voto em Covas pelos critérios e princípios que procurei explicitar nesse artigo.

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