1982-2002

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As consequências políticas

A maxidesvalorização da moeda brasileira frente ao dólar nos últimos dias decretou o fim do Plano Real. De fato, em termos simbólicos, o real se sustentava pela sua valorização frente à moeda americana. O chamado "poder de compra "do real foi o principal ingrediente que o governo vendeu à sociedade e à comunidade internacional desde o início do Plano. Na última campanha eleitoral, o presidente Fernando Henrique Cardoso reiterou "o poder de compra" e prometeu que ele não seria desvalorizado. Nestes termos, a maxidesvalorização não só destitui o valor principal da moeda, mas, também, desacredita o governo: o processo eleitoral é uma espécie de contrato de confiança entre as promessas do governante e as expectativas do eleitorado. O descumprimento das promessas é tomado pelo cidadão como uma fraude, sentimento que estabelece como contrapartida a falta de credibilidade do governante.

Na trajetória do Plano Real é inegável que, no seu início, proporcionou conquistas importantes - como o fim da inflação, a estabilização de preços e alguns efeitos distributivos. O corre que esses objetivos corretos e desejáveis foram assentados sobre estruturas comprometedoras, as chamadas âncoras cambial e os juros altos. A função dessas âncoras consistia atrair capitais especulativos para financiar o déficit público. No período anterior ao real, o déficit público era financiado pelo próprio processo inflacionário jogando pesados custos sobre os ombros da sociedade. A nova forma de financiamento do déficit também implicou altos custos sociais, talvez mais elevados que os custos da inflação.

Os juros altos jogaram a dívida pública para a estratosfera. Em quatro anos ela saltou de R$ 60 bilhões para R$ 300 bilhões. Com a desvalorização do real projeta-se uma dívida atualizada, próxima dos R$ 400 bilhões. O governo sempre se justificou alegando que esta dívida comparada com a de países desenvolvidos e tendo como parâmetro o PIB , se situava dentro de padrões aceitáveis. Mas a verdade é que há muitas diferenças. As dívidas públicas dos países desenvolvidos foram feitas ao longo de muitos anos, a nossa, apenas em quatro anos. As dívidas públicas dos outros países serviram para financiar investimentos em infra-estrutura, serviços e em qualificação da vida humana como educação, saúde etc. Elas geraram ativos que se traduziram em ganhos para a sociedade e para o próprio Estado.

A dívida pública brasileira, na medida em que ela foi alavancada pelos altos juros, serviu apenas para pagar ganhos para os especuladores. Ao invés de gerar ativos, gerou enormes passivos. Além do passivo das contas públicas, gerou passivos sociais com desinvestimentos em saúde, educação, serviços, infra-estrutura etc. Em quatro anos o governo não fez nenhuma grande obra, não ergueu nenhuma grande estatal. Pelo contrário, desorganizou o Estado como indutor do crescimento econômico, torrou as estatais ceifou milhões de empregos, decretou a morte de milhões de empresas e lançou a economia no despenhadeiro da recessão. Pior do que isso, hipotecou algo que não lhe pertencia: o futuro das novas gerações. Os custos que a sociedade pagará nos próximos anos por essa insídia governamental são incalculáveis. Já começou a pagá-los na forma de impostos escorchantes, que não se traduzem em benefícios para os cidadãos, e na forma da despotencialização das condições do bem-estar material e cultural.

Com a locomotiva do Brasil descarrilada e com o maquinista desorientado, torna-se urgente agir para colocá-la nos trilhos e comandá-la. O governo precisa dar-se conta da necessidade de um novo programa econômico. Ou age agora, no início do mandato, para minimizar o estrago feito ou teremos quatro anos de crise e letargia. O problema do novo programa econômico, a rigor, é político, A atual equipe econômica não teria condições de propô-lo. Uma opção mais desenvolvimentista tem como piloto visível o ministro José Serra. Erguem-se duas barreiras a esta opção. A primeira é a do presidente. Colocar Serra na Fazenda representa uma confissão explícita do fracasso. Além disso, Fernando Henrique teria que entregar ao novo ministro poderes de primeiro-ministro. A outra barreira vem do PFL. Caso Serra tivesse sucesso, se tornaria um candidato natural à Presidência em 2002, antecipando a disputa de posições no interior do bloco governista. O governo precisa, ainda, muito do PFL para aprovar a CPMF e outras reformas. Se a atual equipe da Fazenda se inviabilizar em definitivo, então, cabe especular sobre qual seria a linha de recuo de Fernando Henrique: André Lara Resende? Mendonça de Barros?

Nesse quadro de crise, a oposição também precisa jogar certo. A crise, em si, não garante necessariamente dividendos à oposição. Por isso, ela precisa manter-se dura na crítica ao governo, mas apresentando alternativas para o país. A mobilização do movimento social, a pressão, a negociação, a exigência de mudanças, as pautas de reivindicação, a atuação consistente no Congresso, são instrumentos que a oposição e a sociedade dispõem para enfrentar a crise. A oposição precisa acertar a mão também nos governos estaduais e municipais mostrando uma nova forma de governar e lançando as bases positivas para um novo projeto para o Brasil.

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