1982-2002

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O caso da Ford e o desemprego

A luta dos metalúrgicos do ABC para reverter as 2,8 mil demissões anunciadas pela Ford no final do ano proporciona uma série de lições tanto para o movimento sindical quanto para os empresários e o governo. Em primeiro lugar, é preciso enfatizar a insensibilidade da Ford em dois aspectos: o ato em si das demissões, sem antes buscar outras saídas, e a data escolhida, véspera de Natal e ano-novo. Dada a aguda crise de desmprego, as empresas precisam assumir sua responsabilidade para procurar evitá-lo. Claro que os empresários, em determinados momentos, enfrentam situações-limite. Mas não podem recorrer ao inexorável sem antes esgotar outras possibilidades. Afinal de contas, a empresa, no mundo de hoje, não pode ser vista apenas como um feudo privado. Ela tem uma dimensão social irrenunciável.

O governo federal, se tiver alguma sensibilidade, também deve estar colhendo suas lições do episódio. O presidente Fernando Henrique, a rigor, passou quatro anos alimentando uma posição esquiva em relação ao agravamento do desemprego. Ao contrário dos chefes de governo europeus, que colocaram o tema em suas agendas, o presidente jogou toda a responsabilidade nas costas dos empresários e trabalhadores. Nesta semana mesmo, o governo dos Estados Unidos cogitou a possibilidade de sobretaxar o aço brasileiro e japonês para proteger o emprego de sua gente. Aliás, registre-se que as políticas governamentais para gerar empregos, tais como o contrato temporário, trabalho aos domingos no comércio, etc., além de precarizar as relações trabalhistas, resultaram em fracasso.

O movimento sindical, comprimido pelo pesado fardo de buscar soluções para milhares de desempregados e suas famílias, teve de buscar saídas criativas tendo em vista que o que estava e está em jogo são as condições de sobrevivência das pessoas. Em vez da tradicional greve, reivindicou-se o direito de trabalhar, postulação que teve a imediata simpatia da opinião pública. A organização de um movimento de solidariedade aos demitidos, as negociações amplas envolvendo empresários, governos estaduais e federal, o Poder Legislativo e outras entidades da sociedade são passos que indicam novos caminhos para a solução de problemas na esfera do trabalho e da produção. São também sinais da disposição dos mais diversos setores da sociedade de participar na busca de soluções para o desemprego. Foram os esforços do movimento sindical e da opinião pública que impuseram à Ford e ao governo as suas respectivas parcelas de responsabilidade pelo drama da falta de trabalho. O resultado de tudo isso parece ser positivo: a Ford recuou das demissões e aceitou negociar. Dos 2,8 mil demitidos iniciais, 700 saíram da empresa negociando boas condições de demissão voluntária. Resta solucionar o problema dos outros que pretendem continuar no emprego.

A rodada decisiva de negociações deverá ocorrer na segunda-feira. Os Sindicatos dos Metalúrgicos do ABC e da capital propõem como saída de transição a redução do ICMS e transição e do IPI dos carros novos em troca da redução do preço dos automóveis. Como saída de médio prazo, estudam fórmulas para a renovação da frota.

Acreditam que a redução dos impostos proporcionará um aumento nas vendas, com aquecimento na produção e no emprego. Só para se ter uma idéia, a Ford produzia 1,1 mil veículos/dia. Hoje produz 500.

Os governos de São Paulo e do Paraná já aceitaram a redução do ICMS. A expectativa se concentra no governo de Minas Gerais, que reluta em aceitar o acordo. Quanto ao IPI, a resistência está no Ministério da Fazenda. Os técnicos da Fazenda argumentam que a redução do IPI se choca com o esforço do governo federal em promover o ajuste fiscal. O contra-argumento dos sindicalistas sustenta que a redução do IPI será compensada pelo aumento da arrecadação proporcionado pelo maior volume de vendas de carros. Desnudam, assim, o mero viés monetarista da equipe econômica, que se concentra apenas no lado financeiro da questão. Não percebem que o investimento em ativos produtivos pode gerar uma contrapartida tributária para o Estado, além de garantir empregos e produção.

Na verdade, o embate que se trava hoje em torno da produção e do emprego opõe dois exércitos. De um lado está o governo, com sua equipe econômica, seu monetarismo, sua subordinação ao FMI, sua dependência do capital especulativo, que financia o déficit público em troca de compensadores juros, etc. Do outro lado estão os trabalhadores, a opinião pública que teme o desemprego, os empresários que acreditam na produção, a CNBB, a sociedade civil, etc. O que está em jogo é a manutenção de uma política econômica que já imprimiu as digitais do seu fracasso ou um novo modelo de desenvolvimento cuja aposta está na produção, no emprego e na dignidade das pessoas.

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