1982-2002

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A desestruturação do desemprego

As últimas pesquisas sobre desemprego indicam que ele começa a bater fortemente nas portas da classe média. Até agora, ele era mais agudo na área industrial. Mas com a diminuição do poder de consumo da sociedade, ele começa a atingir também os mais diversos setores de serviços, área que vinha absorvendo parte dos desempregados da indústria. Outra forma que o desemprego atinge a classe média é através de uma espécie de cláusula de barreira que existe para a mão-de-obra inicial que quer entrar no mercado de trabalho. São milhares de jovens que se prepararam em cursos profissionalizantes e em faculdades que encontram as portas fechadas indefinidamente. O desespero da situação está jogando engenheiros, advogados, jornalistas etc. para as filas dos desempregados e para os concursos públicos que não exigem uma maior qualificação.

É a partir do episódio da demissão dos 2.800 trabalhadores da Ford que a questão do desemprego começa a ganhar as ruas e a assumir contornos de um confronto político. A reação dos desempregados e dos sindicatos através de protestos e de outras formas de luta era esperada e necessária. A politização do desemprego é determinada por dois fatores. Primeiro: na medida em que o desemprego não é fundamentalmente estrutural no Brasil - ele não decorre, na sua maior parte, na inovação tecnológica -, mas é conseqüência da conjuntura econômica e das escolhas do governo, parece evidente e lógico que a luta por emprego se tornaria uma demanda política e uma reivindicação da sociedade. Os juros altos e a política recessiva do governo são as principais causas do corte de postos de trabalho. O segundo engate da politização da questão do desemprego é determinado pela postura do governo: por duas ocasiões, em 1998, o presidente Fernando Henrique Cardoso manifestou a posição do governo sobre o assunto. O desemprego foi encarado como uma questão de mercado, das relações entre empregadores e empregados. Perguntado em uma ocasião sobre o que o governo faria quanto ao crescente desemprego nas montadoras, ele afirmou que não era empresário e nem trabalhador para intervir no assunto. Ou seja, a ação do governo quanto ao agravamento do desemprego é nenhuma. Enquanto isso, ainda no final de 1997, os principais governantes dos países europeus realizavam uma reunião de cúpula para buscar saídas para o desemprego. Ante a omissão do nosso governo, também era lógico e previsível que o tema viria a adquirir contornos políticos em termos de cobranças e de pressões sobre o governo.

Outro ângulo de abordagem que a questão do desemprego suscita diz respeito à desestruturação social, psicológica e emocional. A desestruturação atinge violentamente os desempregados, mas abate também os que conservam o emprego. Estes últimos passam a viver sob o império do medo, da insegurança e do estresse. As circunstâncias empurram a todos para um comportamento mais competitivo e agressivo.

Já os desempregados perdem aquilo que há de mais caro à uma pessoa: a dignidade. O desempregado é um ser tomado pela angústia e pela frustação. Não há nada mais devastador para um pai de família do que ver a despensa e a geladeira vazias, do que perceber que faltam as coisas básicas para as necessidades da família. Estudos de especialistas mostram que tanto o medo de desemprego quanto a condição de desempregado afetam as relações afetivas e sexuais das pessoas. Diminuem até as imunidades naturais dos mecanismos preventivos de doenças.

A sociedade, no seu conjunto, assume uma atitude funcional perante o desemprego. Através de dois dos seus principais meios de poder, o governo e a mídia, a sociedade prefere ver o desemprego não como a tragédia que ele representa, mas como um aglomerado de números estatísticos. O desemprego, no máximo, é visto como "o inferno dos outros". O medo que ele provoca em cada um é consumido na silenciosa solidão individual ou compartilhado quando muito com a família. São poucas, hoje, as atitudes e movimentos de solidariedade para com os infortúnios dos desempregados.

Garantia de emprego ou proteção ao desempregado tornam-se uma preocupação política crescente em vários países do mundo, especialmente naqueles mais desenvolvidos. Afinal de contas, não é possível falar em outros direitos sem que o direito primordial, que é o direito à vida desdobrado em direito à subsistência, seja atendido. O desemprego é a mais violenta manifestação de desrespeito aos direitos dos indivíduos.

No Brasil, com um governo ajoelhado perante a sanha insaciável do capital especulativo, os desempregados estão jogando à sua própria sorte. Os custos de uma política econômica ancorada no capital especulativo são incalculáveis: empresas quebradas, milhões de desempregados, o setor produtivo sacrificado, estatais sacrificadas, dívidas públicas bilhionárias, carências sociais de todo o tipo e falência das políticas públicas. Com a maxidesvalorização do Real toda a sociedade ficou mais pobre. Os salários perderam poder aquisitivo. Os aposentados do setor público estão sendo confiscados enquanto os do setor privado recebem migalhas. Em todas as frentes, o desastre que o governo Fernando Henrique está produzindo é superlativo. Para os mortais, sejam eles empregadores ou empregados, estudantes ou donas de casa, ambulantes ou desempregados, que sofrem na carne os efeitos de uma política econômica destinada a atender as expectativas de lucro dos especuladores, não resta outra saída: lutar.

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