1982-2002

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Por uma agenda para o desenvolvimento

O Brasil passou os últimos quatro anos discutindo a agenda da especulação: juros altos, bolhas artificiais nas bolsas de valores, ingresso de capitais voláteis, câmbio sobrevalorizado que permitiu a festa ilusória dos importados etc. A primazia da agenda da especulação sobre a agenda do desenvolvimento ocorreu graças a uma opção estratégica do governo que preferiu financiar o déficit público com o capital externo e apostar na reeleição em detrimento da reforma tributária e fiscal. O resultado dessa aposta, hoje, é universalmente conhecido: recessão, desemprego, inadimplência e fechamento de empresas e fábricas.

Por outro lado, a partir do governo Collor, o Brasil ingressou numa fase de abertura comercial que pode ser classificada de irresponsável. O governo Fernando Henrique aprofundou ainda mais a desnacionalização da indústria. Esse processo contou com passos sucessivos: a modificação da Lei da Informática, a quebra dos monopólios e a indistinção conceitual entre empresa nacional e estrangeira. Com essas medidas, praticamente todas as atividades industriais se tornaram acessíveis ao capital externo. Não que o capital externo não seja desejável para o desenvolvimento do país. O problema está na forma e no grau em que esta abertura ocorreu. No início dos anos 90, por exemplo, os mecanismos reguladores de saída de capitais estrangeiros já investidos no país - que estavam definidos na Lei 4.131 de 1962 - foram revogados. Isto significou uma desregulamentação dos contratos de transferência de tecnologia e a eliminação de restrições relativas de remessa de lucro. Alguns analistas calculam que para cada US$ 100 investidos no país, no mínimo, US$ 10 saem todos os anos na forma de realização de lucros. Nos últimos quatro anos a remessa de lucro excedeu esse mínimo chegando, em muitos casos, a 20%. A falta de controle sobre a remessa de lucro termina por exceder pressões tanto sobre o câmbio quanto sobre as contas externas.

A abertura comercial irrestrita fez a desnacionalização incidir também de outras formas: várias empresas passaram a deixar de produzir componentes para importá-los; os bens finais produzidos internamente agregaram um maior número de componentes externos; os centros de tomada de decisões de empresas transnacionais foram exportados e acentuou-se o atraso relativo da indústria brasileira com a dispensa de profissionais e técnicos qualificados em muitas áreas. Por tudo isso e por outros motivos, o fato é que houve um decréscimo vertiginoso nos índices de atividade industrial afetando não só a produção e o emprego, mas a própria produtividade.

Hoje são muitos os setores sociais, produtivos e políticos que concluem que outro modelo de abertura deveria ter sido adotado. Um modelo adequado com a realidade nacional deveria levar em conta três componentes: 1) abrir aqueles setores onde a indústria e o comércio nacionais estavam aptos a suportar a concorrência; 2) incentivar os setores atrasados, definindo metas e prazos, com o objetivo de capacitá-los a serem submetidos à abertura externa; e, 3) definir aquelas áreas industriais, comerciais e de serviços que não seriam submetidas à concorrência externa. Com esse tipo de política seria possível buscar uma equação otimizadora capaz de satisfazer o consumo, forçar a modernização e proteger a produção e o emprego internos.

O fracasso do atual modelo econômico agregado à crise política e de governabilidade que lhe é inerente dificultam a transição de uma agenda monetarista e financeira para uma agenda produtivista e desenvolvimentista. Essa transição não terá êxito sem uma forte pressão política e da sociedade sobre o governo. É preciso formar uma ampla coalizão pró-mudanças capaz de aglutinar a oposição política, os movimentos sociais, os setores produtivos e outras entidades e instituições da sociedade civil.

Sob a bandeira, "pela produção e pelo emprego", essa coalizão deve definir aquilo que seria uma agenda de desenvolvimento do país. Alguns pontos dessa agenda parecem mais ou menos óbvios: definição de uma política de desenvolvimento industrial; criação de condições de financiamento e capitalização; orientação e planejamento para a regionalização do desenvolvimento industrial; e políticas de fortalecimento das pequenas e médias empresas. A política de desenvolvimento industrial deve estar voltada para dois objetivos: a) incremento das exportações e, b) fortalecimento do mercado interno. A política de desenvolvimento deve apoiar-se também em alguns setores suportes: investimento em tecnologia e pesquisa, aposta estratégica na educação básica e secundária e treinamento e qualificação dos recursos humanos. Do ponto de vista da política governamental existem alguns nós que precisam ser enfrentados: o controle do déficit público, a reforma fiscal e tributária e uma política de juros adequada a investimentos produtivos. O problema do câmbio, aparentemente, deixou de existir com a livre flutuação. Agora, o risco é a desvalorização excessiva da moeda. É preciso adotar ainda uma política de longo prazo de criação de empregos complementada com medidas compensatórias de curto prazo para atenuar os problemas do desemprego. Em suma, saídas capazes de criar as condições para um desenvolvimento sustentado existem. O problema todo está na vontade política e nas orientações dos programas governamentais. Nas atuais circunstâncias, parece que somente uma forte mobilização das forças atuantes da sociedade pode desbloquear essas saídas.

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