1982-2002

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CPIs ou jogo de cena

As pressões para instalação de CPIs no Senado tendo de um lado o senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), proponente da CPI do Judiciário e, de outro, o senador Jáder Barbalho e a bancada do PMDB, proponentes da CPI do sistema financeiro, não podem caracterizar-se por um divórcio entre o discurso e as intenções. A CPI do Judiciário surgiu a partir de uma briga política entre o senador e juízes. Só depois foram elencados alguns fatos determinados. Daí a suspeita de que se pretenderia inibir a atividade jurisdicional do Judiciário. Cabe questionar também a conveniência de um presidente do Senado e do Congresso propor uma CPI: ele é o representante do poder Legislativo junto aos outros poderes e, internamente, a sua posição é de árbitro. Posição que pode ficar comprometida se ele descer à condição de parte interessada.

Quanto à CPI do sistema financeiro, o comportamento do PMDB também gera suspeitas. Ocorre que três anos atrás, uma CPI dos bancos chegou a ser instalada no Senado, mas foi cancelada pelo plenário com anuência do PMDB. Nos meios políticos e na imprensa especula-se que Jáder Barbalho teria proposto a CPI para podar o espaço político de ACM e do PFL. Se este é o jogo que está sendo jogado no Senado, há uma clara descaracterização das CPIs e das próprias funções do Congresso. As CPIs são instrumentos técnicos do Congresso para fiscalizar e investigar os outros poderes e a si mesmo, a partir de fatos concretos, e não meios de disputa política entre partidos ou parlamentares.

Estranho é também o comportamento do PSDB. O partido, junto com o PFL, adotou posição contrária às CPIs das empreiteiras, dos bancos, da compra de votos na emenda da reeleição etc. A CPI das empreiteiras só não foi instalada porque o PSDB e o PFL não indicaram seus representantes. O próprio presidente Fernando Henrique Cardoso faz gestões para que CPIs não sejam instaladas. Trata-se de uma intromissão indevida nas prerrogativas do Legislativo. A função do Congresso de fiscalizar e de investigar o poder Executivo fica comprometida pela pressão do presidente sobre sua base parlamentar.

A CPI do sistema financeiro é necessária, pois há fatos antigos e recentes que a justificam. Basta lembrar os escândalos dos bancos Econômico e Nacional. O deputado Aloísio Mercadante (PT-SP) denunciou que um número significativo de bancos tiveram lucros extraordinários com a mudança do regime cambial. O empréstimo que o governo concedeu ao banco Marka acarretando prejuízos aos cofres públicos permanece sem explicação convincente. Após a desvalorização do real, para salvar dois bancos que se meteram em aventuras especulativas, o BC queimou R$ 1,6 bilhão. É inadmissível que a CPI do sistema financeiro não seja mista. Isto é, integrada pela Câmara e pelo Senado. A Câmara, tanto quanto o Senado, tem competência fiscalizatória e legislativa sobre o sistema financeiro.

O sistema financeiro brasileiro é uma verdadeira caixa preta. O artigo 192 da Constituição que dispõe sobre o tema, ainda não foi regulamentado. Isto cria uma zona cinzenta que permite aos bancos um elevado grau de ação arbitrária. A existência de um Banco Central sujeito a ingerências políticas tem transformado esta instituição em coadjuvante do sistema privado. Os rumores sobre vazamento de informações e o recrutamento de executivos do BC pelos bancos privados e vice-versa são práticas incomuns nos países desenvolvidos. O capitalismo brasileiro não pode continuar sendo o reino dos espertos e da permissividade, onde os amigos do poder tudo podem enquanto que a esmagadora maioria das pessoas tem suas rendas e recursos depreciados. No Brasil nem o capitalismo e nem a democracia funcionam a partir de regras claras e iguais para todos. Fato lamentável num momento em que toda a sociedade é convocada a arcar com custos do desastre econômico através de pesados impostos. Desastre provocado, em grande medida, pelos generosos juros pagos ao capital especulativo.

Com a CPI não se pretende atingir os banqueiros em geral e nem abalar o sistema financeiro do país. O sistema financeiro será abalado se continuar funcionando sem regras civilizadas, se continuar obtendo lucros astronômicos em detrimento da produção e do trabalho e se continuar com as práticas inescrupulosas que impliquem a injeção de bilhões de reais dos recursos públicos para salvar suas bandas podres como ocorreu com o Nacional, com o Econômico e agora com o Marka. Se o PMDB quiser uma CPI do sistema financeiro para valer, deve aceitar que seja mista. O PT adota como critério a defesa do interesse público e não participa do jogo de dissimulações e de barganhas de setores da base governista. O PT nunca alimentou a pretensão de ser o depositário da virtude. Mas não foi por falta de propostas de parlamentares do partido que o Judiciário não foi reformado e o sistema financeiro regulamentado. Se essas providências tivessem sido adotadas, talvez, hoje, as CPIs fossem desnecessárias.

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