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Que país é este?

Na última semana, o brasilianista Stuart Schwartz concedeu uma entrevista à revista Veja chamando a atenção sobre o pessímismo crônico do povo e dos principais historiadores braslleiros. Esse pessímismo histórico radica na avaliação de que no Brasil nada dá certo: a Independencia e a República foram farsas, as reformas resultam em fracassos, os políticos são corruptos etc. O presidente Fernando Henrique Cardoso procura enfrentar o traço pessimista da nossa cultura criticando a fracassomania. Mas o seu próprio governo é uma catapulta poderosa que joga os sentimentos das pessoas para o fosso do pessimismo e da desilusão.

No decorrer da semana ocorreram dois fatos que justificam de forma dramática a perplexidade e a perda de referências e de sentido a respeito do país em que vivemos: um desempregado que furtou uma garrafa de coca-cola de um caminhão em Maceió foi preso pela polícia e torturado até a morte. Áo mesmo tempo, toda a máquina do governo era posta em movimento para abafar as investigações da CPI dos bancos. Considere-se que só para socorrer os bancos Marka e Fonte Cindam o governo torrou R$ 1,5 bilhão do dinheiro público numa operação que não tem amparo legal e moral. Considere-se que uma dezena de bancos ganharam, especulativamente, bilhões de dólares com a desvalorização cambial supostamente a partir de informações privilegiadas. Considere-se ainda que com a crise, o Brasil perdeu mais de U$ 100 bilhões, que a sociedade ficou mais pobre, que empresas quebraram, que milhares de trabalhadores perderam o emprego, que o contribuinte foi achacado com aumento de impostos e que os inativos e aposentados foram taxados.

O que fez o governo em relaçao à CPI dos bancos? Fernando Henrique veio a público dizer que não sabia o valor do auxilio do BC aos bancos quebrados, que não houve má-fé na operação e que Francisco Lopes é uma pessoa insuspeita condenando a apreensão de material na casa do mesmo levada a cabo pelo Ministério Público a partir de uma autorização judicial originada numa sollcitaçao dos deputados Arlindo Chinaglia (PT-SP) e Milton Temer (PT-RJ). O presidente chegou a comparar a açao legal do Ministério Público ao arbítrio da ditadura. Nada falou sobre o desempregado morto pela polícia por causa de uma coca-cola. O Ministro da Justiça, Renan Calheiros, através de manobras e declarações escandalosas, afastou o delegado da Polícia Federal que chefiou a diligência legal na casa de Chico Lopes. O governo como um todo agiu para impedir o depoimento à CPI dos ministros Pedro Malan e Pedro Parente e moveu os cordões nos bastidores para adiar o depoimento do ex-presidente do BC.

Esses fatos justificam que se faça até mesmo a seguinte comparação: Collor de Mello foi justamente cassado principalmente por conta dos achaques que seu sócio, PC Farias, fazia sobre empresários em nome do poder. Comentava-se na época que as contribuições compulsórias dos particulares chegaram a acumular um bilhão de dólares. No entanto, agora temos um presidente que permite, através de gestão econômica temerária, que os especuladores embolsem muitos bilhões de dólares do dinheiro públlco. A opinião pública, a sociedade civil, a imprensa que sempre representou um dos setores mais lúcidos nos momentos de crise e os parlamentares de todos os partidos que acreditam que é possível construir um sentido positivo para o Brasil precisam unir-se numa vigorosa reação ao descalabro econômico, social e moral em curso.

O Congresso precisa tornar o Banco Central independente tanto dos bancos privados quanto do uso político. O BC tornou-se um clube de amigos: muitos de seus ex-diretores fundam bancos, corretoras e empresas de consultorias. Bem informados pelos amigos que permanecem em postos-chaves do BC, passam informações a outros bancos privados. Para a direção do BC recruta-se executivos de instituições financeiras. Ministros e diretores de órgãos como o BNDES orquestram ações para favorecer amigos que são donos de bancos ou empresas no processo de privatizações. Pelo andar da carruagem, a "república do tucanato" faz o milagre de transformar jovens técnicos e acadêmicos, que recebiam sofríveis salários de burocratas e professores, numa nova oligarquia de milionários banqueiros, consultores e proprietários de empresas prestadoras de serviços. Ante uma situação como essa, por mais esforço que se faça para deixar de ser critico e pessimista, a velha perplexidade da pergunta "que país é este?" não deixa de martelar nossas consciências.

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