1982-2002

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O perigo ronda o Planalto

A opinião pública está diretamente em rota de colisão com o governo Fernando Henrique a partir de duas contradições básicas. A primeira diz respeito à percepção de que, com a crise econômica, quase toda a sociedade perdeu enquanto que alguns especuladores obtiveram lucros extraordinários. A segunda está relacionada à suspeita generalizada de que o governo permitiu que se desenvolvesse uma ampla rede de vínculos formais e informais entre o setor público e setores privados conferindo uma nova face ao velho patrimonialismo - aquela ação que se vale do poder político para constituir e realizar interesses privados através de instrumento e bens públicos. A sensação de desconforto da sociedade sobre o sentido efetivo das ações do governo se aprofundou nos últimos dias a partir do conhecimento da ajuda indecorosa do Banco Central aos bancos Marka e FonteCindam. A operação de salvamento do BC torna-se ainda mais injustificável quando a própria Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) sustenta que não haveria nenhum risco ao sistema financeiro se os bancos não fossem socorridos com o dinheiro dos contribuintes.

As suspeitas se reforçaram também quando Fernando Henrique defendeu enfaticamente Francisco Lopes e quando se tornou público que o Ministro da Casa Civil, Clóvis Carvalho, e o Secretário de Relações Internacionais, Eduardo Graef, orientaram-no para adiar seu depoimento à CPI, marcado para o dia 19 último. Os dois são auxiliares diretos do presidente e atuam dentro do Planalto. Trata-se de uma interferência inaceitável do Executivo nos rumos das investigações de uma Comissão Parlamentar de Inquérito do Legislativo. Dada a gravidade das suspeitas que pesam sobre o ex-presidente do BC, a ação dos dois auxiliares de Fernando Henrique deve ser entendida como uma manobra de obstrução das investigações. O presidente precisa explicar a participação do governo nessa manobra.

A situação de Fernando Henrique já não era nada confortável por conta do desastre na condução da política econômica, das falências no setor produtivo, do desemprego, dos cortes nas verbas sociais e da inépcia de seu governo. Agora o governo corre o risco de ser carimbado com a marca corrosiva da corrupção. No primeiro mandato, denúncias de corrupção, de compra de votos etc., foram aplastadas pela ação sistemática do Planalto para impedir a instalação de CPIs. Mas a partir do grampo do BNDES formou-se a necessidade de investigar a suspeita de que membros do governo agem para favorecer grupos privados.

As investigações sobre a atuação do BC começam a revelar a estrutura de uma teia de relações promíscuas, um bunker de espertalhões, que abriga altos escalões do Banco Central e do BNDES e bancos privados, corretoras e empresas de consultorias, instituições geralmente dirigidas por ex-integrantes do governo ou por amigos destes. O fim da era Vargas que Fernando Henrique prometeu levar a cabo e a reforma gerencial do Estado que promoveu representam uma espécie de megafusão entre o BC, o BNDES e o Banco do Brasil com as empresas privatizadas, alguns bancos, corretoras e consultorias onde os últimos embolsam fabulosos lucros e os três primeiros arcam com os prejuízos.

O Brasil perdeu com a crise econômica mais de US$ 100 bilhões e o governo torrou as reservas para conter a sangria especulativa. Com a desvalorização do Real, o BC perdeu R$ 5,4 bilhões e o Banco do Brasil, mais de R$ 6 bilhões. Corretoras que surgiram do nada se tornaram poderosas da noite para o dia e algumas instituições financeiras lucraram mais de 1000% só em janeiro. O BNDES, além de financiar as privatizações com o dinheiro público, agora refinancia as dívidas externas de empresas privadas. O governo só não salva o João que quebrou a empresa, o José que fechou o boteco da esquina, a Maria que perdeu o emprego e o Manuel que teve prejuízo na safra agrícola. Também não salva a educação, a saúde, os flagelados da seca, a aposentadoria e a moradia. O governo deu as costas a toda a sociedade, que é chamada a pagar mais impostos para cobrir as transferências do setor público para os donatários das empresas privatizadas e do capital financeiro.

O discurso do Planalto perde toda credibilidade quando contrapõe a "agenda positiva" às investigações das CPIs. Paralisado, a rigor, o governo, sequer tem agenda. Nenhum país civilizado pode barganhar investigações sobre denúncias graves com temores improcedentes de fuga de investimentos. A verdade é que estamos no início de um mandato presidencial e os agentes políticos, econômicos e sociais percebem um desgoverno. O vazio político tende a aumentar. A mistura de um desastre econômico e social, com a falta de comando e com denúncias de corrupção são ingredientes que podem produzir uma crise política explosiva.

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