1982-2002

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Evasão fiscal e conivência

O depoimento do secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, à CPI dos bancos assumiu conotação de escândalo e causou indignação e perplexidade junto aos parlamentares e à opinião pública. O Secretário informou que mais de C$ 800 bilhões circulam no mercado sem pagar impostos e que os bancos pagam menos imposto de renda que os assalariados. A maior parte deles inclusive não paga nada. Logo depois procuradores revelaram as facilidades que o Banco Central concede aos detentores das chamadas contas CC-5, que permitem a remessa de dinheiro para o exterior e se transformam em instrumentos de sonegação fiscal e de movimentação de recursos ilícitos.

Tivesse alguém procedido uma pesquisa histórica sobre o que aconteceu no Congresso acerca do tema da evasão fiscal chegaria à conclusão que Maciel reafirmou com dados algo que já vinha tendo um tratamento ativo. Propostas e projetos de lei que visavam atacar a sonegação e a evasão, contudo, foram sistematicamente derrotados. O próprio presidente Fernando Henrique tinha pleno conhecimento do problema, pois foi relator da CPI da evasão fiscal, quando senador, em 1992. O senador Fernando Henrique não só diagnosticou os problemas, as falhas na legislação e o desaparelhamento da Receita, mas indicou também soluções para diminuir as perdas. Já o presidente Fernando Henrique nada fez para sanar as falhas. Trata-se de uma inequívoca omissão, sua e de seu governo. O senador havia chegado à conclusão de que a sonegação era desejada. Sugeriu que era até fácil encontrar métodos simples e mecanismos eficazes para combatê-la. Estava convicto de que sem o acesso da Receita aos dados sigilosos, principalmente os dados do sistema financeiro, nada poderia ser feito. A receita teve esse acesso sistematicamente negado pelo governo e por seus aliados no Congresso. É neste ponto que a omissão passa a ser conivência.

A bancada do PT, através de vários deputados, proprôs, entre 1994 e 1999, projetos de lei que incidiam sobre as seguintes questões: a) a revogação da extinção da punibilidade do crime de sonegação e fraude de impostos; b) instituição e regulamentação da incidência do imposto de renda sobre lucros e dividendos a beneficiários no exterior; c) fim das isenções fiscais das aplicações financeiras do investidor estrangeiro; d) fornecimento de informações à Secretaria da Receita Federal relativas a operações superiores a 50 mil UFIRs; e, e) determinação da cobrança de imposto de renda sobre aplicações financeiras em renda variável (bolsa de valores). Evidentemente, todos esses projetos não receberam maior atenção nem por parte do governo nem por parte de sua base majoritária no Congresso.

O mais grave no histórico de conivência do governo e de sua base para com a sonegação, contudo, circunscreve-se a outro fato. Em 1995 o Poder Executivo enviou ao Congresso Proposta de Emenda Constitucional de nº 31 que modificava o artigo 145 da Constituição no sentido de permitir que a fiscalização tributária e previdenciária tivesse acesso, nos termos da lei, a informações sobre patrimônio, rendimentos e operações financeiras e bancárias dos contribuintes. Em contrapartida, a fiscalização seria responsabilizada civil, criminal e administrativamente caso viesse a não zelar pelo sigilo desses dados. A votação sobre essa Emenda produziu no Congresso uma situação, para dizer o mínimo, curiosa. O PT, fiel à sua política de coerência e de colocar o interesse público acima do interesse partidário, apoiou e votou na proposta do governo. A maior parte da base governista, no entanto, decidiu derrotá-la. Assim torna-se algo até risível quando determinados setores governistas ficam escandalizados com os gigantescos números da evasão e da sopnegação fiscal.

Como se vê, os problemas da elisão fiscal (brechas na lei que permitem o não pagamento de impostos) e da sonegação são antigos conhecidos dos governantes e do Congresso. Soluções foram apresentadas mas não aprovadas. O senador Fernando Henrique Cardoso tinha razão quando afirmava que a solução dependia de vontade política. Na medida em que os assalariados e a classe média pagam mais impostos que os mais ricos, o sistema fiscal tornou-se um instrumento de concentração de riqueza e renda.

A sociedade não pode mais aceitar a permissividade e a injustiça fiscal. Enquanto que nos países desenvolvidos o sistema fiscal é progressivo - quem tem mais paga mais - aqui ele é altamente regressivo: Mas os sucessivos pacotes do governo, mesmo com conhecimento de causa e com os dados conhecidos, não procuraram estancar a sangria da sonegação, da evasão e da elisão. Todas essas práticas continuam sendo uma coisa desejada, aceita e até planejada em nosso país.

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