1982-2002

Artigos | Projetos | Docs. Partidários

Versão para impressão  | Indicar para amigo

Artigos


O PT e a agricultura

O debate que vem sendo travado sobre a crise da agricultura revela um misto de desinformação e de preconceito moralista. A desinformação diz respeito tanto à situação da agricultura quanto ao projeto aprovado na Comissão de Agricultura da Câmara referente às dívidas dos agricultores. Quanto ao preconceito, ficou evidente que, mais uma vez, a infantaria moralista entrou em campo para atacar o PT por uma suposta "aliança com Ronaldo Caiado".

Um mínimo de conhecimento sobre as condições da agricultura convenceria qualquer um de que ela está inviabilizada. Enquanto a agricultura mundial é financiada a uma taxa média de 3% a 4% de juros anuais, a agricultura brasileira paga uma taxa de 8,75%. Assim não há como os nossos produtos agrícolas competirem no mercado internacional. Some-se a isso o fato de que nos últimos anos o preço dos produtos agrícolas caiu, contra um aumento de todos os insumos, como máquinas, equipamentos, sementes, adubos etc. O resultado dessas contas revela que o agricultor opera no vermelho. Somente no Plano Real, houve a transferência de R$ 24 bilhões do setor agrícola para outros setores da economia. Estudo de técnicos da Fundação Getúlio Vargas mostra que o Banco do Brasil errou em até 45% para mais ao renegociar as dívidas dos agricultores. Em 118 contratos reexaminados pela FGV, o saldo devedor ficaria 26,7% menor. Os bancos, especialmente o Banco do Brasil, estariam adotando critérios abusivos na renegociação dos débitos, fato reconhecido até mesmo pelo ministro da Agricultura.

O projeto aprovado por consenso na Comissão de Agricultura da Câmara em nenhum momento propôs o calote da dívida, como foi fartamente divulgado nos últimos dias. Propôs, sim, o seu refinanciamento por 20 anos a taxas de juros de 3%, num sistema de bonificações que no final do período resultaria no abatimento de 40% da dívida. Por sugestão da bancada do PT, o projeto incorporou a proposta de que mutuários classificados pelas normas do Banco do Brasil como pequenos e miniprodutores teriam um bônus adicional de 20% e 30% do valor da dívida. Ainda por sugestão do PT, o artigo 8º do projeto determina que os produtores que cometeram desvios de recursos da finalidade do crédito rural ou outros tipos de irregularidades não sejam beneficiados pela renegociação. Determina-se também atribuição de débito aos bancos, e não ao Tesouro, das parcelas das dívidas derivadas de práticas irregulares das instituições bancárias. Antes de o presidente Fernando Henrique falar em "caloteiros contumazes", o PT agia para garantir na lei que esses caloteiros não fossem beneficiados. Registre-se que o próprio projeto de renegociação do governo copiou a proposta do PT nesse aspecto, sem reconhecer o direito autoral. Aliás, foi o governo, em negociações de gabinete, que permitiu que a maior parte da dívida se concentrasse nas mãos de poucos grandes produtores.

O PT apóia o movimento dos produtores por alguns motivos: 1) porque a agricultura está inviabilizada e precisa de outro modelo de financiamento; 2) porque as dívidas existentes, na sua maior parte, são resultado dos planos econômicos, especialmente do Plano Real, que transferiu recursos dos setores produtivos, dos assalariados e da classe média para o setor financeiro; e 3) porque o projeto da Comissão de Agricultura incorporou as propostas do PT, que garantem dois princípios: a vedação dos benefícios aos que cometeram irregularidades e a diferenciação entre pequenos e miniagricultores em relação aos grandes produtores. As emendas do PT visaram salvaguardar o Tesouro, a moralidade e a justiça social no tratamento da dívida.

A posição da bancada do PT foi definida em comum acordo com a Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), com a CPT (Comissão Pastoral da Terra) e com o MST. Apoiamos os produtores porque o programa do partido quer viabilizar a agricultura brasileira, e não deixá-la atrás até mesmo da agricultura da Argentina. O que a opinião pública, alimentada pela imprensa, deveria discutir é a situação real da agricultura e o posicionamento dos partidos. O governo sabia que a Comissão de Agricultura estava discutindo soluções para as dívidas, mas em nenhum momento sugeriu alternativas. Omitiu-se, para depois vir a público apresentar-se como arauto do combate aos caloteiros, surrupiando propostas alheias. Quer mostrar moralidade depois de ter aberto todas as portas do Tesouro para bancos falidos, para Estados e municípios que gastaram mal e demais, para financiar arrematadoras de estatais e para subsidiar grandes multinacionais. É o principal responsável pelo desastre na agricultura.

Francamente, a infantaria moralista de bicos de pena e de bicos de papagaio não tem moral para acusar o PT de fazer alianças oportunistas depois de ter passado alguns anos derramando rosários de palavras douradas sobre o paraíso a que teríamos sido levados pelo governo que está aí.

Busca no site:
Receba nossos informativos.
Preencha os dados abaixo:
Nome:
E-mail: