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Depois do País ter sido sacudido pelo escândalo da CPI do Orçamento no final de 1993 e início de 1994, a imprensa voltou a focalizar, nas últimas semanas, denúncias de irregularidades na liberação de verbas orçamentárias. Na CPI as denúncias atingiram em cheio o próprio Congresso. Agora voltam-se contra o Executivo, que teria manipulado politicamente a distribuição de verbas favorecendo prefeitos e candidatos dos partidos governistas. As denúncias devem ser investigadas, mas trata-se de remeter também esta discussão para a solução de problemas que foram apontados pela CPI e que ainda não foram equacionados. Estes problemas dizem respeito aos critérios que devem ser adotados e à relação entre Executivo e Legislativo na elaboração do Orçamento.
Ocorre que na elaboração do Orçamento os deputados e senadores podem fazer emendas individuais propondo verbas para este ou aquele município, para esta ou aquela obra. Disto decorre um primeiro momento da relação de clientelismo político à medida em que o parlamentar procura beneficiar sua base eleitoral com as verbas públicas da União. Outra consequência é que a distribuição das verbas segue a fragmentação e a falta de critérios objetivos, que deveriam ser fixados a partir das noções de necessidade da população, de prioridades nos investimentos e de programas sociais definidos. Ou seja, a elaboração do Orçamento deveria levar em conta o nível de carência efetiva da população e o número de habitantes a ser beneficiado pelos recursos. A emenda individual do parlamentar leva em conta o seu interesse eleitoral e o critério partidário da prefeitura ser administrada por esse ou aquele partido. Para solucionar este disfunção, as emendas individuais deveriam ser proibidas permitindo apenas emendas partidárias de caráter global a partir dos critérios de necessidade, número de habitantes e consistência dos programas.
O segundo momento do clientelismo político verifica-se na liberação das verbas e é praticado pelo Executivo. A participação do Congresso na definição do Orçamento é meramente autorizativa. Cabe ao Executivo, principalmente através do Ministério do Planejamento e do Tesouro, decidir se libera ou não verbas autorizadas pelo Congresso. Com isto, abrem-se as portas para que a liberação das verbas sofra influência do interesse político e eleitoral. O governo sente-se a vontade para praticar o "toma-lá-dá-cá", seja na relação com o prefeito, com o governador ou com o setor contemplado pela verba ou seja com o parlamentar que fez a emenda.
As denúncias que constaram recentemente no noticiário da imprensa indicavam que o governo privilegiou os partidos que lhe dão sustentação na liberação das verbas. Para impedir que o Executivo manipule politicamente as verbas é preciso que a decisão do Congresso sobre o Orçamento seja determinativa. O Executivo deveria ser obrigado a executar as decisões do Congresso e informá-lo periodicamente sobre a liberação das verbas e a execução dos programas orçamentários. O Congresso resgataria, assim, a sua função de representar os cidadãos no que diz respeito à distribuição dos recursos públicos e poderia melhorar a sua performance na fiscalização dos atos do Executivo no que diz respeito à execução orçamentária. O contribuinte, por sua vez, teria mais garantia de que o dinheiro público está sendo aplicado com mais critério e com mais controle.
A partir da CPI do Orçamento o Congresso, de fato, introduziu algumas inovações que aumentaram o nível de transparência e reduziram drasticamente a promiscuidade que ocorria com o lobbie da iniciativa privada. As denúncias recentes, contudo, sinalizam que é preciso avançar ainda mais na definição de critérios técnicos e que é preciso redefinir a relação entre o Executivo e o Legislativo na feitura e na execução do Orçamento. Afinal de contas, o Orçamento trata do dinheiro do contribuinte e o seu controle público, seja através do representante ou de outros mecanismos sociais, diz respeito a um aspecto fundamental do funcionamento da sociedade democrática. Em algumas prefeituras introduziu-se a inovação do Orçamento Participativo, onde a própria comunidade define as prioridades orçamentárias. Embora seja difícil, na esfera federal também devem ser buscadas alternativas para que a sociedade tenha uma maior participação na definição e na execução do Orçamento.