1982-2002

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O Congresso do PT

O PT está em processo de realização de seu segundo congresso. O primeiro, realizado em 1991, deu-se sob a égide do colapso do socialismo. Tratou-se naquele momento de lapidar a concepção do partido, descartando alguns entulhos ideológicos e afirmando alguns valores humanistas. Hoje, do ponto de vista de uma abordagem de esquerda, o momento é outro: não se trata mais de reencetar o debate ideológico a partir de velhos dogmas já superados. Trata-se de construir positivamente os parâmetros programáticos para enfrentar os desafios postos pelo Brasil e de modernizar a estrutura do partido, capacitando-o para a luta e para a ação políticas dimensionadas pela enorme responsabilidade de produzir mudanças no sentido de uma sociedade justa, democrática e equitativa e de buscar um desenvolvimento sustentável que tenha como centro, não a realização do lucro para poucos, mas a promoção da qualidade e das oportunidades de vida para o conjunto da sociedade. Ou seja, o PT não deve reeditar um momento de ajuste interno de contas. Precisa produzir com os olhos voltados para a sociedade e para o Brasil.

Se isso é verdadeiro, precisamos perceber a efetiva realidade da situação brasileira. A conclusão não pode ser outra: não só o governo Fernando Henrique fracassou, mas também as reformas neoliberalizantes fracassaram. Iniciadas há nove anos com o governo Collor, aprofundadas pelo governo atual, não resolveram os principais problemas do País, não enfrentaram o drama social, o Brasil, juntamente com o Paraguai, mantém a pior distribuição de renda da América Latina e a economia apresenta uma curva descendente, no sentido da estagnação. O resultado é mais uma década perdida. No cenário externo, o Brasil tornou-se paciente da globalização, gerando desnacionalização da indústria e do comércio, desemprego e déficits comercial e nas contas externas.

Essas conclusões, que não são apenas da oposição, mas de economistas de renome internacional e do próprio Banco Mundial, não nos autorizam a pensar que o Brasil não precisa de reformas. Ao contrário, ao mesmo tempo em que recusa o caminho neoliberal, o PT não pode promover um retorno ao autarquismo estatal. O estatismo é filho da velha tradição patrimonialista que germinou na colônia, que se desenvolveu no Império e sobreviveu na República. Tradição que gerou aqui um capitalismo de privilégios orientado pelo Estado, no qual o poder político define os ganhadores e os perdedores, os incluídos e os excluídos, define quem são os beneficiários do dinheiro público, das políticas econômicas e das instituições públicas. Patrimonialismo que se manifesta ainda hoje na inescrupulosa ajuda aos bancos, nos benefícios concedidos a empresas como a Ford, nas privatizações, nas regulamentações do Banco Central e da Receita que favorecem setores do grande capital, isentando-os de pagamento de impostos, etc. É a partir dessa análise histórica dos privilégios e da injustiça, da concentração e da pobreza, da República sem republicanismo, da democracia debilitada e de uma tradição política autoritária e conservadora que o PT deve definir os seus fundamentos programáticos reformadores.

É a partir disso que defendemos a idéia de que o PT confira centralidade à idéia da democratização do capital e da riqueza. Não se trata apenas de incrementar uma melhor distribuição de renda, via políticas públicas de bem-estar: é a própria estrutura do capital que deve ser mudada. É preciso submetê-lo às regras da competição, permitindo o surgimento de uma economia aberta, sem privilégios definidos pelo Estado, com restrições efetivas aos monopólios e com a multiplicação das oportunidades. Uma das condições da democratização do Estado: trata-se de instituir um Banco Central realmente independente dos bancos privados; regras fiscais progressivas e justas; uma Receita Fiscal capacitada a combater a sonegação; um Judiciário ágil e eficaz e sob controle público; uma justiça acessível aos cidadãos com a garantia de fato do princípio da igualdade perante a lei; uma legislação que garanta os direitos de propriedade dos pequenos ante os confiscos financeiros e dos acionistas minoritários sistematicamente desrespeitados pelos grandes; uma limitação das funções legislativas do presidente; o restabelecimento de uma proporcionalidade correta na Câmara e um princípio de imunidade parlamentar que não proteja crimes comuns. Combater a pobreza e a exclusão social por meio de políticas de bem-estar e de distribuição de renda também é um item central de um programa de esquerda. Mas é preciso perceber que a democratização do capital, incluída a terra, e a do Estado são pressupostos para a criação de uma justiça social com caráter mais permanente.

Cabe concluir que a esquerda não tem outro caminho para produzir justiça, equidade, bem-estar e desenvolvimento a não ser o da democracia. Democracia, que tem na liberdade e no respeito aos direitos individuais e humanos os seus valores supremos. Se no Brasil temos injustiças, pobreza e violência, a culpa não é da democracia, mas da falta dela. A nossa tradição é essencialmente autoritária, por isso, não democrática nem republicana nas esferas política, social e econômica.

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