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As campanhas eleitorais mostram que o eleitor está olhando o poder local com outros olhos. É desse poder que a população espera soluções mais imediatas para seus problemas como nas áreas da saúde, educação, habitação e transportes. As instâncias estaduais e federal do poder público estão falidas nos seus aspectos administrativo, gerencial, executor e fiscalizador. Daí se compreende que determinados prefeitos que fizeram investimentos mínimos tenham mais legitimidade e apoio na opinião pública que os governadores e o presidente da República. Alguns atribuem esta situação à Constituição de 1988, que favoreceu os municípios nas distribuições das receitas fiscais. Isto em parte é verdade, mas há um fenômeno mais de fundo que diz respeito ao enfraquecimento relativo dos poderes centrais e à revalorização do poder local como esfera mais apropriada para a definição e execução de políticas públicas.
Os resultados das pesquisas de intenção de voto, até agora, mostram que o eleitor está interessado em dar continuidade a determinadas experiências que foram testadas na prática. Alguns analistas tentam ver nisso um apoio implícito à tese da reeleição. No entanto, o que está claro é que a continuidade não precisa necessariamente do continuísmo. Em São Paulo, por exemplo, a disputa está polarizada em torno de duas experiências: a do malufismo e a do PT. Esta situação pode ser generalizada para outras capitais, guardadas as nuances locais.
Mas onde as eleições apresentam mais novidades é no discurso propriamente dito. Dois aspectos do discurso que vinha se desenvolvendo até recentemente perderam relevância: o denuncismo e a ideologia. O que está no centro destas eleições é a discussão político-programática em torno das políticas públicas, sejam elas obras viárias, políticas de saúde, habitação etc. Os candidatos são obrigados a discutir as políticas públicas a partir de sua função social, abrangência, necessidade, custos, benefícios e assim por diante. É em torno disto que se travam as batalhas eleitorais. Os situacionistas precisam provar os méritos do que foi feito e a excelência do que pretendem fazer. Os oposicionistas precisam mostram os aspectos falhos ou insuficientes do que foi feito e precisam provar que têm alternativas melhores. Esta é uma das poucas maneiras de se diferenciar já que todos prometem investir em educação, saúde e habitação proporcionando uma certa indiferenciação programática.
A diferenciação ideológica, por seu turno, perdeu praticamente a importância na determinação das escolhas eleitorais. O eleitor perdeu as referências do que significa ser de direita ou de esquerda nessas eleições. Mas é preciso chamar a atenção para o fato de que se a ideologia tradicional está esvaziada, o debate programático, o debate em torno das políticas públicas, não está vazio de conteúdo político. Pode-se dizer que os programas e as políticas públicas estão impregnados de conteúdo político, — não se reduzem a fórmulas técnicas — pois eles indicam as prioridades que estão em jogo, quais os interesses que expressam, quem são os beneficiários e permitem julgar os governos ou os candidatos a partir dos critérios de eficácia e competência. Em suma, o eleitor começa a olhar para aquilo que significa qualidade de vida em termos pessoais e coletivos. Qualidade de vida econômica, urbana, social, na esfera da segurança e dos bens públicos que pode ter acesso. Na medida em que a democracia está incorporada na normalidade da vida política e que a corrupção não ocorre com os índices alarmantes como vinha ocorrendo, tudo indica que as tendências que começam a se firmar na campanha atual se estenderão para as próximas.
Outro aspecto do discurso que parece ter perdido totalmente a eficácia eleitoral diz respeito à referência dos posicionamentos políticos em relação ao regime militar. O período autoritário está totalmente apagado nas mentes dos eleitores comuns e fazer referência se este ou aquele político foi a favor ou lutou contra a ditadura não faz mais sentido para a maioria esmagadora dos eleitores. Isto indica que a contraposição mais democrático versus mais autoritário deve buscar outros pontos de referência.
Do ponto de vista do PT, nestas eleições, parece que as coisas estão mais facilitadas onde o partido teve oportunidade de desenvolver experiências administrativas. Elas têm influxos positivos sobre as campanhas. Mas, no geral, o grande desafio do PT consiste em apresentar alternativas diferenciadoras, mais viáveis e mais eficazes em relação às propostas e experiências apresentadas pelo campo político conservador. Sem este projeto alternativo, eficaz do ponto de vista das soluções dos problemas dos cidadãos e competitivo em termos eleitorais, a esquerda pode perder terreno para a direita e o conservadorismo, que procuram se viabilizar como alternativa para 98.