1982-2002

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Os mistérios das privatizações

O Brasil, por onde quer que se olhe, está longe de encontrar o caminho da seriedade. A falta dela, vem, antes de tudo, dos governantes. Se o Brasil fosse sério, o Congresso funcionaria como um poder autônomo e não se submeteria à dependência política do Planalto. E se o Congresso fosse autônomo, estaria investigando todo o processo de privatizações e, possivelmente, propondo a revisão das mesmas e do modelo levado a efeito pelo governo Fernando Henrique.

A necessidade de uma investigação e de uma revisão parlamentar das privatizações não se prende apenas ao caso das fitas do BNDES, mas aos muitos aspectos obscuros e danosos à sociedade e ao país que nelas estão embutidos. Aspectos que, aliás, confirmam o caráter de mera transferência de patrimônio implicado na venda das estatais. Desde a lei das privatizações aprovada pelo Congresso até as orquestrações e ações do governo e do BNDES, percebe-se a presença dos velhos instrumentos patrimonialistas, que constituem os privilégios de alguns e os danos de todos.

Dentre os tantos mistérios das privatizações, o maior, talvez, se localize sobre o quanto se arrecadou com elas. Ninguém sabe. Com a privatização das telecomunicações e das energéticas, o Estado, supostamente, teria arrecadado US$ 41 bilhões. Agora descobre-se que este valor pode sofrer uma queda significativa. Parte deste total voltará ao bolso das empresas compradoras na forma de reduções de pagamento de Imposto de Renda. Para se ter uma idéia de quanto isto significa, a Telesp, vendida a um consórcio liderado pela Telefónica por R$ 5,7 bilhões poderá ter uma devolução, em benefícios fiscais, de R$ 1,58 bilhão. Esses benefícios fiscais, embora legais, — num país onde o trabalho paga mais do dobro de imposto que o capital — são criminosos do ponto de vista moral e social.

Outro mecanismo que reduz os ganhos do Estado com as privatizações diz respeito ao financiamento do BNDES às empresas compradoras, a juros subsidiados. O juro subsidiado, na prática, representa um ganho para o tomador e uma perda para toda a sociedade. Em última instância, é ela quem subsidia. O simples fato de se financiar privatizações com dinheiro público já é escandaloso. O escândalo torna-se ainda maior quando são empresas estrangeiras que recebem esses subsídios públicos, num país onde milhares de pequenas e médias empresas quebram por falta de apoio, onde setores produtivos com alto potencial de empregabilidade estão estagnados e onde a pesquisa científica foi ceifada por falta de incentivos e de recursos. Há mais um agravante: o financiamento do BNDES à norte-americana AES para a compra das ações da Companhia de Geração Elétrica Tietê foi o financiamento da desnacionalização. Isto é, impediu que empresas brasileiras competissem com as empresas estrangeiras em condições de igualdade no leilão.

Uma investigação do Congresso sobre as privatizações deveria cobrar muitas explicações do governo. Deveria cobrar, por exemplo, o por que da decisão de privatizar os bancos estaduais num sistema conta-gotas, evitando uma concorrência concentrada, fato que fez com que a maior parte dos bancos fosse privatizada sem ágio. O governo deveria explicar por que as empresas que controlam rodovias obtiveram lucros extraordinários e não investiram em melhorias aquilo que estava previsto. O mesmo ocorre com as empresas energéticas e com a telefonia: em que pese a alta lucratividade desses setores, com tarifas de luz e telefone inflacionárias, nenhum deles cumpriu as metas e as melhorias previstas.

Uma investigação do Congresso deveria concluir pela revisão da lei das privatizações e pela reformulação completa das agências reguladoras — Aneel, Anatel e ANP. Estas agências são meros prolongamentos do setor privado. Não regulam e não fiscalizam a partir dos interesses da sociedade. Até mesmo ao contrário do sistema de privatizações da Inglaterra, elas não têm participação de representantes dos consumidores em seus Conselhos, proposta pelo PT, derrotada pelos governistas. A ação escandalosa dessas empresas é tão evidente que, nas últimas semanas, a Aneel gastou milhões de reais em propaganda das privatizações, em veículos de comunicação. Ora, sob nenhum aspecto de seriedade e moralidade, é papel de uma agência reguladora fazer este tipo de propaganda. Este dinheiro, espera-se que seja devolvido aos cofres públicos.

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