1982-2002

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O salário mínimo e o Congresso

O acordo governo-Congresso para elevar o salário mínimo para R$ 180 estrutura-se em torno de quatro medidas para conseguir os recursos necessários ao aumento:1) cortar as emendas individuais dos parlamentares; 2) flexibilizar o sigilo bancário e fiscal para combater a sonegação fiscal; 3) aprovar legislação de combate à elisão fiscal (brechas legais que permitem não pagar imposto) permitindo, inclusive, que a Receita Federal cruze os dados da CPMF com as declarações de Imposto de Renda; 4) cortar alguns investimentos orçamentários.

O PT apóia o acordo por um motivo muito simples: quando se trata de uma medida de justiça social e de impacto distributivo na renda, como é a elevação do salário mínimo, os interesses paroquiais dos deputados com suas emendas orçamentárias individuais devem ficar em segundo plano. Até porque, na medida em que o Orçamento é autorizativo, cabe ao Executivo liberar ou não as verbas das emendas aprovadas.

O aspecto mais importante do acordo, no entanto, é que ele possibilita a aprovação de uma legislação mais eficaz de combate à sonegação e à elisão fiscal. O combate à sonegação e à elisão proporcionaria um substancial aumento de arrecadação. Esta é uma das raras vezes que no Brasil se procura aumentar um benefício social para os menos favorecidos buscando recursos daqueles que têm mais. Este é um princípio de bem-estar social e de política distributiva que se consagrou nos países europeus. No Brasil, porém, até agora, vem se fazendo o contrário: além dos setores de média e baixa rendas financiarem seus próprios benefícios sociais, financiam também benefícios públicos concedidos às elites econômicas.

Como já enfatizamos várias vezes, no Brasil quem tem menos paga mais imposto: taxa-se mais o consumo, depois o trabalho e por último o capital. É justamente o capital que encontra as brechas para sonegar e não pagar impostos. O próprio imposto linear sobre o consumo tem um violento efeito regressivo. Tome-se o caso de uma família de quatro pessoas que ganha R$ 1.200 por mês e de outra, também de quatro pessoas, que ganha R$ 15.000 por mês. A primeira família gastará quase toda sua renda em consumo para sobreviver. A segunda, mesmo que gaste R$ 5.000 por mês em consumo, pagará, proporcionalmente, menos imposto do que a primeira. Convém lembrar ainda que 60% do setor bancário não paga impostos e que as grandes corporações empresariais são as mais beneficiadas com as renúncias fiscais, com os benefícios e incentivos.

Sonegação, elisão e benefícios e incentivos fiscais tornaram-se algumas das principais causas de déficit orçamentário. Para enfrentar o déficit público, além da imposição das medidas anti-sociais previstas no acordo com o FMI, o governo tem procurado fórmulas que fazem incidir mais Imposto de Renda sobre os setores de baixa renda, ou instituir tributos lineares que produzem efeitos regressivos ou, ainda, tem procurado taxar diretamente setores menos favorecidos, como é o caso dos inativos.

Quando algumas lideranças do Congresso manobram para inviabilizar o acordo do mínimo, na verdade, não o fazem por causa das emendas dos parlamentares, mas porque resistem em aprovar a legislação que facilita o combate à sonegação e à elisão fiscal. De qualquer forma, o Congresso está preso numa armadilha: cabe a ele o ônus de encontrar recursos para elevar o mínimo a R$ 180. Qualquer recuo neste patamar implicará enorme desgaste da imagem do Legislativo e os responsáveis pela não manutenção do acordo teriam seus nomes expostos à condenação pública.

O Congresso já enfrenta um forte desgaste junto à opinião pública. Há uma paralisia nos trabalhos legislativos, uma intensa disputa e divisão na base governista para ver quem preside as Mesas da Câmara e do Senado e há uma guerra de dossiês com denúncias de corrupção envolvendo algumas das mais importantes lideranças do Congresso. Ante tudo isso, o resultado não poderia ser outro: inconfiabilidade, deslegitimação e desprestígio do Legislativo.

Num país com quase 35% da população vivendo em condições de pobreza, o aumento do mínimo, mesmo que ainda insatisfatório, terá um impacto positivo para mitigar os efeitos da péssima distribuição de renda. Afinal de contas, são cerca de 30 milhões de brasileiros que vivem com o salário mínimo.

Espera-se que o corporativismo paroquial dos parlamentares ou o secreto desejo de facilitar a vida dos sonegadores não sejam vontades mobilizadas para negar um pouco de decência a esses 30 milhões de brasileiros.

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