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1982-2002

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As indenizações e as Forças Armadas

Reportagens, livros e pesquisas recentes estão colocando a sociedade brasileira em contato com aspectos obscuros ou desconhecidos da história dos anos 60-70, período mais repressivo do regime militar. Muitas vezes essas informações aparecem pelo lado mais dramático revelando prisões, torturas, execuções, combates etc.. Essas revelações são salutares sob todos os aspectos. Por um lado, permitem avaliações e auto-avaliações dos que estiveram diretamente envolvidos nos acontecimentos políticos daquela época. Por outro lado, comprova-se que o País amadureceu politicamente, está fazendo seu aprendizado democrático com tranqüilidade, afirmando a necessidade de que aqueles acontecimentos traumáticos devem ser incorporados à nossa história sem medos e rancores. A sociedade está digerindo o seu passado, assimilando-o criticamente, racionalizando a sua própria experiência para que se possa tirar lições dela na construção do futuro.

A lei que criou a Comissão dos Mortos e Desaparecidos Políticos e instituiu a possibilidade de indenização dos familiares das vítimas é um aspecto importante da recuperação da nossa história. Esta lei, no entanto, é alvo de algumas incompreensões e, por isso, é oportuno debater o seu significado. É preciso ter presente que nem a lei e nem a Comissão têm por objetivo fazer um juízo de valor político ou ideológico das partes em luta naquele período. Trata-se apenas do reconhecimento de uma responsabilidade do Estado para com a vida de pessoas que morreram em determinadas circunstâncias. Ou seja, o Estado reconhece que não tinha o direito de matar pessoas por tortura ou de executá-las depois de dominadas ou presas. A lei e a Comissão estão abrindo também caminho para a responsabilização do Estado para com a vida segurança de guardas ou pessoas que simplesmente não tinham nada a ver com a guerrilha ou as forças de repressão e, contudo, foram vítimas dos confrontos.

Quando o Estado assume sua responsabilidade para com a vida e a segurança das pessoas que morreram nessas circunstâncias está restaurando uma das condições fundamentais do Estado de Direito. Ou seja, o Estado não pode usar a violência arbitrariamente e é responsável pela segurança dos cidadãos. O não reconhecimento dessa responsabilidade após a restauração da ordem democrática implicaria algum tipo de conluio com o Estado autoritário. O pagamento de indenizações aos familiares das vítimas não representa a emissão de um atestado de juízo valorativo nem à guerrilha ou à esquerda e nem às Forças Armadas. Trata-se de uma reparação de um erro da relação institucional do Estado para com cidadãos.

No momento em que se discute a indenização dos familiares dos dois casos mais famosos daquele período — Carlos Marighella e Carlos Lamarca — o problema tem que ser situado dentro da ótica da responsabilidade do Estado. O que deve se averiguar, e parece que foi isto que se averiguou, são as circunstâncias da morte desses dois guerrilheiros. Testemunhos e laudos indicam que eles foram mortos quando já estavam dominados pelas forças de segurança. A concessão de indenização aos familiares de Marighella e Lamarca não implica um juízo de valor de suas ações. O julgamento é plural segundo a ótica política de cada um, segundo como suas ações repercutem no imaginário popular e segundo a avaliação histórica que é feita e refeita a cada momento. A lei e a Comissão dos Mortos de Desaparecidos, é preciso frisar, não tratam desses julgamentos.

Assim como nas demandas de indenizações e nas suas eventuais concessões não estão em julgamento as Forças Armadas, não tem sentido que representantes institucionais das mesmas pressionem por este ou aquele resultado nas decisões da Comissão. O problema das concessões está afeto exclusivamente a uma decisão do poder civil legitimamente constituído, é um problema de Estado. Não tem por que as Forças Armadas, sob o Estado democrático, se comprometerem com possíveis erros do Estado autoritário. As Forças Armadas de hoje não estão sendo julgadas pelo Estado autoritário de ontem. A interferência das Forças Armadas nas decisões da Comissão representaria uma politização inadequada no processo de restauração plena do Estado de Direito. Sua neutralidade, nessas questões, é o melhor caminho de sua preservação. O posicionamento individual de oficiais da reserva, por outro lado, não pode ser confundido como se fosse um posicionamento de instituições militares.

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