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Em defesa do Ministério Público

A ação incisiva do Ministério Público no combate à corrupção abriu um debate sobre seu papel e sobre a sua conduta. Setores do PSDB acusam alguns Procuradores de agirem orientados por interesses do PT. Esse argumento sem crédito, inclusive, já foi usado por Hildebrando Pascoal. Convém lembrar que na época da CPI que levou ao impeachment de Collor, parlamentares de vários partidos, inclusive do PSDB, se reuniam com Procuradores para checar informações e definir linhas de investigação. Não faz sentido o alarde que agora se faz em torno do fato de parlamentares da oposição terem se reunido com integrantes do Ministério Público antes do depoimento de Eduardo Jorge na Subcomissão do Senado. Aliás, o Ministério Público teve e tem uma postura atuante em todos os grandes escândalos dos últimos tempos: CPI do impeachment, escândalo dos anões do Orçamento, escândalo na Prefeitura de São Paulo, cassações de Hildebrando Pascoal e de Luís Estevão etc. Além das investigações próprias, os Procuradores municiam e são municiados por integrantes das CPIs. Ações conjuntas e troca de informações entre CPIs, Ministério Público e Tribunais de Contas não só são legítimas, mas necessárias.

Veja-se a contradição em que alguns governistas estão metidos: na operação abafa para impedir a convocação da CPI para investigar o caso Eduardo Jorge alegam que as investigações estão a cargo do Ministério Público. Mas, ao mesmo tempo, procuram calar e restringir a ação dos Procuradores. A Subcomissão do Senado, que se originou da CPI do Judiciário, foi criada com a função de acompanhar as investigações do Ministério Público.

Na verdade, os ataques ao Ministério Público fazem parte de uma investida mais geral que visa inibir as denúncias e as investigações da onda de corrupção que assola o país. Dessa mesma investida fizeram parte a tentativa de aprovar a "Lei da Mordaça", que impedia a imprensa de divulgar o andamento de processos, e a tentativa de se aprovar uma emenda na Reforma do Judiciário, proposta por um deputado do PSDB, que remetia para foro especial o julgamento de atos ilícitos e crimes incursos na Lei de Responsabilidade Fiscal.

Pretender limitar o impedir o direito de acusação de autoridades por atos de corrupção ou de outros crimes contra a ordem pública significa tentar liquidar um dos mais consagrados princípios republicanos, que se afirmou e mostrou sua excelência ainda na República da Roma antiga. Sem essa possibilidade de acusação não há res publica, imperando apenas a razão de Estado que, historicamente, foi a razão do absolutismo e hoje é a razão da corrupção e do autoritarismo. Claro que o direito de acusação deve ser acompanhado por uma lei que puna a calúnia. A democracia moderna se funda também sobre a exigência de transparência dos atos do poder público e sobre a existência de organismos, como CPIs, Ministério Público etc., que fiscalizam e investigam o governo.

A corrupção no Brasil mostra-se tão ousada, que de acusada pretende passar à condição de acusadora, de investigada pretende investigar os órgãos de investigação. No momento em que o Brasil vive uma das maiores ondas de corrupção de sua história trata-se de aperfeiçoar os mecanismos de fiscalização e controle e a legislação punitiva. A sociedade não pode aceitar a armadilha da deslegitimação e do constrangimento do Ministério Público. A opinião pública não pode deixar de se indignar com a quantidade e a amplitude dos escândalos para passar a indignar-se com quem apura a corrupção. Se esta inversão de valores acontecer, as máfias e o crime organizado se infiltrarão nas instituições públicas.

É evidente que ninguém pode se colocar acima da lei. Se o Ministério Público cometeu alguns erros pontuais, deve corrigi-los. E na medida em que suas investigações estão implicadas com direitos individuais protegidos pela Constituição, ele deve adotar uma postura mais cautelosa na relação com a imprensa e com a opinião pública. Mas é preciso dizer que, no essencial, o Ministério Público porta-se corretamente e presta um serviço inestimável à sociedade e ao bem público.

A criação de um Ministério Público autônomo, não subordinado ao Executivo, consistiu numa das principais conquistas democráticas da Constituição de 1988. Trata-se de um organismo decisivo não só para investigar as ilicitudes do Executivo e do Legislativo, mas para garantir a defesa dos direitos dos cidadãos. Pode-se até mesmo dizer que sem esse Ministério Público autônomo, a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos direitos sociais e individuais não terá plena garantia constitucional. Qualquer movimento no sentido de restringir a autonomia ou a ação do Ministério Público constituirá um atentado à democracia.'

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