1982-2002

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Autoritarismo Legal

Por inacreditável que possa parecer, o atual governo enveredou nas últimas semanas pelo caminho do autoritarismo legal. Três iniciativas apontam nesta direção: a aplicação da Lei de Segurança Nacional, a censura a João Pedro Stédile na TVE e a criação de um subsistema de segurança nos moldes dos sistemas de segurança dos regimes militares. A consciência democrática desse país não pode ficar indiferente a esses fatos, principalmente num momento em que pesquisas registram um declínio do apoio da opinião pública à democracia no Brasil e num momento em que os fracassos das experiências neoliberais na América Latina são identificados, equivocadamente, com fracassos das democracias.

A Lei de Segurança Nacional (LSN) de 1983, hoje em vigor, reteve a concepção autoritária da LSN de 1969 no conceito de crimes contra o Estado e no conceito de oposição ao Estado. Na Constituinte substituiu-se o conceito de Segurança Nacional pelo conceito de Defesa, mas o entulho autoritário da LNS não foi revogado apesar de várias tentativas de projetos de lei apresentados com este fim. Torna-se até estranho observar o comportamento das atuais autoridades ante a aplicação da Lei de Segurança contra integrantes do MST. O ministro da Justiça, José Gregori, critica a Lei, mas parece esquecer-se que a Polícia Federal é subordinada ao seu Ministério. E na medida em que a aplicação da LNS é um ato de governo, o país fica diante de um teatro do absurdo ao observar o próprio governo criticar-se a si mesmo. Ou há uma esquizofrenia em curso, ou esses antigos lutadores contra o autoritarismo não têm a coragem de assumir que o cachimbo deixou-lhes a boca torta.

Tanto a existência da Lei quanto sua aplicação, partem do pressuposto de que os movimentos sociais ameaçam a segurança do Estado. Na sua essência, esta concepção é antidemocrática e antiliberal, pois democracia e liberalismo fundam-se na pressuposição de que o dissenso e o conflito são inerentes à sociedade. Enquanto o autoritarismo procura conter o conflito por medidas de força, o totalitarismo procura eliminá-lo pela violência. O Estado Democrático busca integrar os movimentos sociais à normalidade da vida política e institucional atendendo-lhes reivindicações, garantindo-lhes direitos e mediando os conflitos através de leis e instituições na busca de saídas pelo diálogo e negociação. No caso do MST, a situação se agrava porque o governo confunde a segurança do Estado com a segurança do interesse privado.

Ao imbuir-se da necessidade de derrotar o MST através da ação do Estado, o governo parece ter-se esquecido dos procedimentos compatíveis com o Estado Democrático. Não parece ser outra a intenção do governo, a derrota do movimento social pela ação do Estado, quando aplica a LSN e quando suspende os financiamentos da Reforma Agrária devido a supostas irregularidades. Se há irregularidades, devem ser investigadas e punidas. Mas daí a suspender os financiamentos, trata-se de uma atitude punitiva e vingativa. Se não, por que o governo fez o Proer e não investigou as irregularidades do sistema bancário e ainda permitiu que, de sob a sua guarda, desaparecessem processos relativos às fraudes do Banco Nacional? Por que o governo não corta os recursos da Sudene, da Sudam e de outros organismo federais que se tornaram verdadeiros nichos de corrupção e fraudes permanentes? A lista de irregularidades nunca investigadas e nunca punidas com suspensão de verbas ou medidas de outro gênero em organismos federais seria interminável. Enfatize-se aqui a velha prática de sempre: valente perante os fracos, afinado perante os fortes. O que a democracia exige é a igualdade perante a lei.

A LSN precisa ser revogada e, para tanto, reapresentei, junto com o deputado Milton Temer (PT/RJ), um projeto de lei com esse objetivo. O país necessita, de fato, de uma lei de defesa do Estado Democrático de Direito. Lei que defenda a democracia contra atos de terrorismo, de violência e contra golpes Estado. Uma lei de defesa do Estado Democrático não pode ser entendida como uma lei de defesa do poder, mas como uma lei que proteja as liberdades, os direitos dos cidadãos e as instituições e regras democráticas. O Estado Democrático não é outra coisa senão uma ordem política e jurídica onde os direitos e liberdades fundamentais são assegurados, onde o uso do poder é limitado pela lei e onde o arbítrio e a violência são impedidos.

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