1982-2002

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A reforma do Judiciário

Se é verdade que a Constituição de 1988 restituiu a democracia ao país, isto não significa que o Estado e a sociedade tenham alcançado graus de democratização adequados às exigências do conceito e da prática de uma democracia efetiva. O peso de uma herança histórica de conservadorismo e injustiça do colonialismo e do Império e os extravios e interrupções autoritárias que tem significado a República, determinam ainda um grande distanciamento de uma democracia satisfatória. A democracia não pode ser entendida como algo estático, mas como um contínuo processo de democratização, no sentido da ampliação dos direitos, da igualdade perante a lei, da eqüidade, da justiça e da desconstituição de privilégios.

A realização de uma reforma do Judiciário se inscreve nesse processo de democratização. Existe uma evidente crise do Judiciário, que se assenta sobre vários fatores. O mais importante diz respeito ao fato de que os órgãos administrativos superiores desse poder são antidemocráticos. Não há qualquer controle sobre os mesmos e os juízes de primeira instância não participam da escolha de suas direções. Isto sedimenta uma camada de oligarcas que sacramentam privilégios, controlam verbas e, em alguns casos, promovem um festival de nepotismo e corrupção a exemplo do juiz Niculau dos Santos Neto, no TRT de São Paulo. Democratizar a estrutura administrativa do Judiciário e estabelecer um controle externo sobre o mesmo são imperativos que se impõem não só para torná-lo mais transparente, mas também para fazer com que os recursos a ele destinados sejam usados para o aperfeiçoamento da funcionalidade do aparelho da Justiça.

A morosidade e a ineficácia do Judiciário constitui outro aspecto relevante de sua crise. Elas transformam o Brasil num país encharcado de impunidade e de uma justiça perversa: somente os pobres são punidos. A impunidade trás no seu rastro a permissividade. Já que não se pune, a lei existe para ser burlada. Essa Justiça que favorece os ricos e pune os pobres constitui-se numa das principais facetas do caráter não-democrático do Estado e da sociedade. Estabelece uma correspondência entre as profundas desigualdades sociais com as graves desigualdades perante a lei.

Depois de muita pressão da sociedade e dos partidos de oposição, finalmente o Congresso está votando uma reforma do Judiciário. Essa reforma já sofreu vários percalços. Entre eles, a substituição do primeiro relator, o deputado Aloysio Nunes Ferreira pela deputada Zulaiê Cobra Ribeiro, ambos do PSDB. Registre-se que o substitutivo da deputada é bastante diferente do primeiro aproximando-se, em alguns aspectos, das propostas apresentadas pelo PT. Por exemplo: ele propõe a Súmula Impeditiva de Recurso no lugar da Súmula Vinculante, que constava no primeiro substitutivo. Adotou também a proibição do nepotismo, a federalização dos crimes contra os direitos humanos e a abolição dos juízes classistas. Em contrapartida, propôs um Conselho de controle que é muito mais interno do que externo, avançando pouco na democratização dos órgãos administrativos do Judiciário.

O substitutivo da relatora já está sendo votado no plenário da Câmara. A proposta do PT de controle externo foi derrotada em favor daquela proposta de um controle mais interno. Outra proposta do PT derrotada no plenário instituía a Súmula Impeditiva de Recurso. Ou seja, impedia recurso a instâncias superiores para uma matéria que tivesse reiteradas decisões da mesma natureza. A Súmula Impeditiva visava agilizar as decisões da Justiça. Como queria o governo, foi aprovada a Súmula Vinculante. Mas o seu alcance foi significativamente atenuado. De início, pretendia-se que qualquer decisão dos tribunais superiores fosse válida para todo o Judiciário em matérias similares. A Câmara decidiu que apenas o STF pode sumular, com maioria de 3/5, impedindo-se essa prerrogativa ao STJ, ao STM e ao TST. Outra decisão importante adotada pelo plenário estabelece que é necessária uma lei de regulamentação para definir os procedimentos de Argüição de Relevância Constitucional, os casos que o STF é acionado para decidir sobre a constitucionalidade de uma matéria. A maior vitória do PT foi a retirada da Avocatórica no substitutivo, que aparecia com o nome de Incidente de Inconstitucionalidade. Impede-se assim que um tribunal superior avoque para si matéria em julgamento num tribunal local ou regional.

Pontos importantes que ainda estão pendentes no plenário são a federalização dos crimes contra os direitos humanos, a extinção da Justiça Militar estadual e a proibição do nepotismo. Como conclusão, pode-se dizer que a reforma que está saindo da Câmara não é a ideal, não satisfaz as exigências de democratização e modernização do Judiciário, mas é um passo adiante em relação ao Judiciário que temos hoje.

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