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A TV Cultura e o monopólio da Embratel

A TV Cultura foi vítima, recentemente, da prepotência da Embratel e os seus telespectadores puderam sentir na prática a virulência do exercício de um monopólio privado. Refiro-me aos sucessivos bloqueios que a Embratel fez dos sinais de satélite impedindo que a TV Cultura transmitisse suas programações nos dias 17 e 31 de dezembro e no dia 4 de janeiro. No dia 31, inclusive, a TV foi impedida de transmitir a mensagem do próprio presidente da República, Fernando Henrique Cardoso. No dia 4, milhares de estudantes ficaram sem o resultado do Vestibular na medida em que a Embratel recusou-se a abrir o sinal solicitado pela retransmissora de Ribeirão Preto. Requisições de sinal feitas pela TVE do Rio de Janeiro e pela Radiobrás, tendo a TV Cultura como destinatária, também foram negadas.

O arbítrio da Embratel tem por base uma dívida da Cultura de 7 milhões e 286 mil reais que estavam sendo negociados e, em parte, pagos pela emissora. Os atrasos nos pagamentos da dívida não justificam o corte de sinal. Em último caso, a Embratel poderia tomar medidas judiciais para a cobrança do que lhe é devido. Esta mesma Embratel, agora privatizada e controlada pelo grupo norte-americano MCA, entrou na justiça para não pagar uma dívida antiga, referente a impostos, ao governo federal. É preciso levar em conta ainda que a atitude da Embratel torna-se tão mais grave quando se sabe que a TV Cultura não é uma emissora comercial, mas de utilidade pública, voltada para programas educativos e culturais.

Ao cortar o sinal, a Embratel, inclusive, violou Lei Geral das Telecomunicações que a obriga a criar condições para o desenvolvimento social do país, prejudicou o interesse coletivo e violou os direitos dos usuários (consumidores). A Cultura teve o sinal garantido por decisão do juiz Guilherme Santini Teodoro, que lhe concedeu medida liminar. Na decisão que obriga a Embratel de restabelecer o fornecimento do sinal de satélite, o juiz lembra que ela é concessionária de serviços de telecomunicações em regime público e que a interrupção dos serviços promove irreparável dano à comunidade e é um ato ilegal. A decisão do juiz José Luiz Fonseca Tavares, que restabeleceu a liminar do juiz Santini que havia sido suspensa por um desembargador, também sustenta que a TV Cultura e a Embratel são prestadoras de serviços públicos. Isto quer dizer que os serviços de telecomunicações são públicos, o que significa que são prestados ao público e que não podem ser interrompidos injustificadamente. Em outras palavras, o arbítrio da Embratel dirigiu-se contra o público, contra os cidadãos. Se a Anatel fosse uma agência reguladora e fiscalizadora de fato das telecomunicações seria de se esperar que a Embratel sofresse uma severa punição. Mas como a Anatel não passa de uma agência burocrática e a serviço das empresas privatizadas junto ao governo, nada se deve esperar.

A ação da Embratel recoloca em discussão o modelo de privatizações. Sempre manifestamos a convicção de que foi um erro a privatização da Embratel. Não em função de uma ideologia anti-privatista. Pelo contrário, várias empresas de telefonia local poderiam ser privatizadas e novas concessões a empresas privadas poderiam ser abertas. Mas uma Embratel estatal, de capital aberto, poderia exercer a função de regulação das empresas privadas, tanto em termos de qualidade de serviços quanto de tarifas. A Embratel, por controlar a transmissão de sinais e dados, ocupa uma posição estratégica no sistema de telecomunicações. A precaução e o interesse público recomendavam que ela permanecesse estatal.

Como já enfatizamos, o modelo de privatizações adotado pelo governo é desastroso por vários motivos. Primeiro, ao invés de pulverizar as ações e democratizar o capital, concentrou as prestadoras de serviços nas mãos de poderosos grupos, quase todos estrangeiros. Em segundo lugar, o fato dos grupos controladores serem estrangeiros tira do Brasil a autonomia sobre investimentos e decisões nesse setor estratégico das telecomunicações. A rigor, hoje, os investimentos nessa área serão decididos nos Estados Unidos e na Europa. As privatizações resultaram assim numa grande desnacionalização. Em terceiro lugar, o poder público perdeu sua capacidade reguladora e fiscalizadora sobre esses serviços: o Congresso abriu mão de estabelecer normas reguladoras e fiscalizadoras entregando esta prerrogativa para a Anatel, que além de ser um órgão não funcional, não conta com a participação de representantes dos consumidores no seu conselho.

Desnacionalização, perda de autonomia, falta de fiscalização e controle e monopólio privado, esta é a síntese a que nos conduziu o processo de privatização das teles. Neste dia 23 de janeiro entre em funcionamento a Intelig, empresa destinada a concorrer com a Embratel nas chamadas de longa distância e internacionais. Ocorre que 25% das ações da Intelig pertencem à Sprint, empresa controlada pela multinacional MCA, que por sua vez controla a Embratel. Nestas circunstâncias, haverá uma concorrência de faz-de-conta e um monopólio de fato.

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