1982-2002

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A crise da Aeronáutica

A crise entre o governo e a Aeronáutica que proporcionou a demissão de seu comandante, o brigadeiro Walter Bräuer, embora envolva aspectos disciplinares e hierárquico não se restringe a eles. Pode-se afirmar que o pano de fundo da crise está na ausência de uma política de defesa para o País e a conseqüente redefinição do papel das Forças Armadas. A ausência de uma política de defesa e suas consequências negativas vêm-se manifestando em forma de crises circunstanciais e episódicas, como foi o caso da Aeronáutica. O problema, no entanto, não pode ser subestimado, seja pela sua importância específica, seja pelos desdobramentos político-militares que ele poderá suscitar. Mesmo que estejamos longe de qualquer ação militar, não é demais lembrar que o Brasil tem uma história pontuada por intervenções militares na política e estas intervenções geralmente começaram em torno de fatos circunstanciais.

Se é verdade que a demissão de Bräuer se tornou inevitável e algumas declarações de militares da reserva foram equivocadas ou inoportunas, é preciso, por outro lado, não restringir a análise sobre essas circunstâncias para não esquecer os pontos mais significativos do problema. O primeiro ponto consiste precisamente em que a criação do Ministério da Defesa frustrou expectativas: ele não foi capaz de produzir um projeto de política de Defesa e não foi capaz de promover uma integração entre as três Armas. A escolha de Élcio Álvares para a pasta da Defesa também se mostrou equivocada. Não porque se trata de um civil. Mas colocar na pasta um candidato ao Senado derrotado nas últimas eleições soou como um prêmio de consolação e como sinal de pouco prestígio dos militares. Equívoco ainda maior cometeu o presidente Fernando Henrique ao não solicitar o afastamento do ministro no momento em que surgiram as denúncias envolvendo seu nome e de sua secretária. O afastamento deveria ser temporário até que investigações atestassem a inocência do ministro ou confirmassem indícios. No primeiro caso, sua autoridade estaria preservada. Por ser um ministério estratégico, envolvendo a segurança do País, não pode pairar nenhuma dúvida sobre o ocupante da pasta da Defesa. A posição de Élcio, enfraquecido, hoje, na Defesa, é insustentável.

A crise da Aeronáutica imbrica-se com o problema da política de defesa do País pelo lado da autonomia tecnológica e militar. Nenhum país terá adequada política de defesa se não tiver graus significativos de autonomia tecnológica e militar. Num mundo cada vez mais interdependente, essa autonomia não será absoluta, mas precisa ser significativa, já que as guerras, as disputas e os interesses entre, e dos, Estados nacionais não cessaram. No Brasil, praticamente, em todas as áreas e incluindo a área militar, não se investe nada em pesquisa e produção tecnológica. O principal fator de dependência externa ou de autonomia de um país, hoje, é o fator tecnológico e do conhecimento.

Quando o governo permite que um consórcio aeroespacial francês compre 20% do controle acionário da Embraer em condições privilegiadas está dando mais um passo para aprofundar a perda da autonomia do País em mais um setor estratégico, como o é o da indústria aeroespacial. Esta, aliás, foi a tônica de todo o processo de privatizações: em nenhum momento se atentou para a salvaguarda dos interesses e da autonomia nacionais. O mais grave de tudo é que existem fortes suspeitas de que um acordo secreto entre os atuais controladores da Embraer e o mesmo consórcio aeroespacial francês permitiria, num prazo de cinco anos, a transferência do controle majoritário da empresa para os franceses. Se isto se confirmar, trata-se de uma ilegalidade, já que as normas de privatização da Embraer proíbem que seu controle majoritário passe para estrangeiros. O Brasil já mantém um alto grau de dependência a esse consórcio aeroespacial francês em termos de fornecimento de helicópteros, aviões, mísseis e em termos de manutenção e fornecimentos de equipamentos ao Sindacta e ao Condacta.

Outro aspecto relevante da crise, subjacente à política de defesa, consiste em que o Brasil perdeu autonomia sobre transmissão e controle de dados e informações estratégicas. Ocorre que, com a total privatização das telecomunicações, o governo federal selou um contrato por licitação com uma empresa espanhola de transmissão de sinais, que tem entre seus controladores o próprio Ministério da Defesa da Espanha. Essa empresa manipula até mesmo os dados e informações transmitidos para as Forças Armadas e para o Ministério da Defesa brasileiros. Isto significa que o Brasil não garante nenhuma segurança sobre suas informações estratégicas e de defesa.

Por fim, há ainda na crise da Aeronáutica, o problema do DAC da Infraero. É um equívoco manter a fiscalização da aviação civil e o controle administrativo dos aeroportos sob a Força Aérea. Mas acredito que seria uma medida igualmente equivocada privatizar estas áreas, como pretende o governo federal. O mais adequado parece ser repassá-las para o Ministério dos Transportes criando um departamento específico.

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