1982-2002

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Temos que construir novas utopias

 

Em entrevista ao Informes, o líder da bancada do PT na Câmara,
deputado José Genoino (SP), fala do futuro do Partido dos Trabalhadores,
da relação com o governo de Fernando Henrique Cardoso, das eleições à
Presidência da República e do socialismo. Para ele, a esquerda deve mudar
a partir do resgate dos valores do socialismo para construir
"novas utopias e novos sonhos".

Informes - Qual será a cara do PT após o II Congresso Nacional? Acabou a polaridade entre moderados e ortodoxos?

José Genoino - Eu acho que a cara do PT vai ser a de um partido dialogando com toda a sociedade, a de um partido de esquerda que não perde a sua identidade, um partido que se referencia nos valores do socialismo, com liberdade, democracia e igualdade. Será um partido que tenha um nível de governabilidade, que recupere na sociedade que não vota no PT a credibilidade e influência política. Acho que o PT vai continuar tendo disputas internas, mas nós devemos pelo menos criar um procedimento de não ter apenas dois blocos. Temos que fazer um esforço muito grande para a luta interna não tomar conta das energias do partido. Acho que o PT, depois do II Congresso e com a entrada do novo milênio, deve ser um partido que gaste suas energias políticas para fora, na disputa política, na oposição ao governo, nas administrações que nós temos a responsabilidade de governar, na política eleitoral para ganhar as eleições de 2000 e na preparação do projeto para ser poder em 2002.

Informes - Da para dizer que o PT está mais moderado?

José Genoino - Eu acho que é errada essa leitura. O partido é de esquerda, não é moderado na oposição ao governo, não é moderado na oposição ao projeto neoliberal. É um partido radical no sentido correto da palavra. Não é sectário, não é estreito, não é isolacionista. É um partido de esquerda, com suas bandeiras na oposição radical a esse modelo e aberto para dialogar com segmentos econômicos e sociais, além da nossa base política. Para o PT ser uma alternativa não podemos fixar sempre como um partido que constrói a lógica ou a dinâmica de marcar posição. Temos que marcar posição, mas ao mesmo tempo sinalizar nossa alternativa para ser uma referência de governo para o país.

Informes - Qual a importância das eleições diretas para presidente do PT?

José Genoino - Primeiro o partido dialogar com o que eu chamo sociedade petista, com os filiados, com o eleitor petista. Em segundo lugar tirar a lógica que ainda domina o partido das tendências, grupos, subgrupos e campos. E oxigenar a vida do partido através de eleições diretas. Por outro lado vai ser importante porque nos congressos, nos encontros, nos debates vai ser sempre combate de teses, de programas, de propostas e não das articulações para a candidatura de A, B ou C.

Informes - Por que a bancada do PT mudou sua relação com o governo FHC? Foi o PT que mudou nesses quase cinco anos de governo FHC ou foi o presidente que mudou?

José Genoino - Primeiro nós não mudamos na oposição ao presidente FHC. Nós não mudamos na crítica, nos não mudamos nas denúncias, nem mudamos no questionamento do governo. O que aconteceu no Congresso é que o governo se enfraqueceu muito. O governo está dividido e com muito descontentamento na sua base. Com a queda de popularidade e abrindo possibilidades de discutir no Congresso Nacional alternativas que a oposição sempre apresentou e que na primeira gestão de FHC não eram consideradas, eu acho que a nossa relação de oposição é uma relação que nós fixamos não só na oposição parlamentar mas também nas mobilizações de rua.

Informes - Como o sr. analisa a atuação da bancada no Congresso este ano? Foi mais voltada para barrar propostas do governo ou mais propositiva?

José Genoino - Eu acho que nós fizemos as duas coisas. Alguns projetos nós conseguimos barrar através da nossa oposição nas comissões e no plenário. Ao mesmo tempo disputamos projetos alternativos, principalmente na comissão da reforma tributária e fiscal, na reforma do Poder Judiciário, na negociação da dívida dos agricultores. Fizemos isso na discussão do teto e do subteto e estamos enfrentando o governo na cobrança dos inativos, como estamos enfrentado a maioria governista no FEF e na reforma do Judiciário

Informes - Qual a prioridade do partido para 2000?

José Genoino - Eu acho que a prioridade do partido é ganhar as eleições de 2000, dar certo onde a gente governa e preparar o nosso projeto para 2002. Esse é o centro do nosso trabalho político, do nosso trabalho na sociedade e no parlamento. Eu acho que a bancada tem que continuar, primeiro, priorizando no trabalho legislativo as iniciativas que possam dialogar com a sociedade, como fizemos com a reforma tributária e do Judiciário. E nós temos que, no próximo ano, priorizar os temas da agenda social na agenda da bancada. Ao mesmo tempo temos que dar atenção às articulações políticas para impedir que qualquer alternativa de centro-esquerda ocupe o espaço da esquerda como se fosse protagonista desse processo de construção de alternativa para o país.

Informes - Quando e como o PT deve escolher seu candidato à Presidência em 2002?

José Genoino – Eu acho essa questão delicada. Para mim é a decisão mais delicada que o partido tem de tomar. Temos uma candidatura posta pelo consenso do partido, pelo consenso da sociedade, que é a candidatura do companheiro Lula, pela sua representatividade, pelo que ele simboliza tanto dentro como fora do partido. É claro que temos que dialogar sobre essa questão em 2000, mesmo que a gente não tire uma resolução, temos que fazer algum levantamento, fazer uma consulta. Se for o caso até uma pesquisa, trabalhar cenários do Lula sendo candidato, do Lula não sendo candidato, porque não temos ainda todos os elementos para elaborar uma tática eleitoral para 2002 que envolva candidatura, as alianças e o nosso próprio programa. As bases do programa nós temos com a aprovação das diretrizes pelo II Congresso do partido. Mas temos que elaborar com mais detalhes, com mais competência. Devemos dialogar sobre essa questão, mas acho difícil resolvê-la antes das eleições (municipais). Eu penso que a questão vai ter de ser tratada no ano de 2000, mas ter uma solução definitiva acho difícil, porque não temos todos os elementos para tomar essa decisão.

Informes - Seu nome vem sendo citado como uma das possibilidades de candidatura petista em 2002. O sr. admite essa possibilidade?

José Genoino – Prefiro submeter meu nome ao governo de São Paulo. Isso depende do partido. Depende da construção de uma unidade no partido. Depende da aceitação no partido, não de traçar uma guerra que possa inviabilizar a possibilidade de o PT ser governo em São Paulo com o resultado provável das eleições municipais de 2000. Em relação à Presidência da República acho que vai depender de uma discussão da campanha do partido e de uma avaliação da candidatura do Lula. É claro que admito essa possibilidade, mas dentro de um projeto bem pensado, um projeto coletivo, um projeto que tenha começo, meio e fim.

Informes - O sr. acha que vale à pena trocar uma carreira de sucesso no Legislativo pelo Executivo? Isso não seria arriscado?

José Genoino - Pessoalmente eu até gosto muito do Congresso Nacional. Mas o político tem que levar em conta o desejo da sociedade. As sugestões da sociedade, dos cidadãos começam a solicitar um nível de responsabilidade, um nível até de disputar cargos maiores. Eu acho que a experiência no Legislativo foi muito positiva para mim, e eu tenho que me preparar para uma disputa fora do Legislativo.

Informes - Como será a política de alianças do PT nas eleições municipais de 2000? Genoino

José Genoino - Acho que temos que fazer aliança com os partidos de esquerda, como já fizemos em 98, com quem estamos articulados. Nós podemos ampliar essa aliança a nível municipal com segmentos do PPS e do PMDB, deixando claro que é uma linha de oposição ao modelo FHC e que isso não tem uma vinculação direta com as eleições de 2002.

Informes - Isso não pode afetar a identidade do partido?

José Genoino - Eu acho que não. O PT, se ele quer governar a sociedade brasileira, tem que dialogar com o centro sem perder sua identidade, sem perder suas bandeiras, sua representação. O desafio é a gente fazer essa ampliação de alianças sem perder a nossa identidade. Se a gente quer ser uma alternativa de governo temos que dialogar com segmentos da sociedade, seja no sistema de alianças, seja no sistema de neutralização, seja no sistema de diálogo, que não pode representar interesses opostos do PT. Mas temos que ter a flexibilidade e incorporar todos os segmentos sociais numa proposta de governo.

Informes - O partido pretende estimular ainda mais as mobilizações sociais?

José Genoino - Acho que é importante nunca desprezarmos isso. O problema é que a mobilização social não depende só do partido, depende do clima, depende da opinião pública, do sentimento da população. Nós realizamos isso em 98, em 99 e principalmente na Marcha dos Cem Mil. Temos que continuar trabalhando com as mobilizações sociais e com a oposição parlamentar. É preciso coordenar três coisas: a mobilização social, a oposição institucional e a responsabilidade de governo nas prefeituras e estados. Para o partido fazer mobilização social ele tem que levar em conta quem governa e a representação institucional.

Informes - O PT resiste à globalização, ou defende outro modelo?

José Genoino - A globalização é um fato, uma realidade. O que nós temos que discutir é como entrar nela. FHC está de uma certa maneira subordinado, paciente. E nós queremos entrar e participar da economia mundial, mas mantendo a nossa soberania, a nossa autonomia e estabelecendo uma relação de disputa de interesses, que há uma guerra de interesses no meio globalizado. A globalização é uma realidade. A divergência é como participar, não de maneira passiva e paciente, mas em defesa da soberania e dos seus interesses. Encarar a globalização é aprofundar a nossa autonomia, a nossa soberania.

Informes - O sr. diz que o socialismo acabou. Qual o modelo que deve substitui-lo?

José Genoino - Primeiro não se trata discutir o fim do socialismo. Nós temos que resgatar no socialismo os valores, resgatar da luta dos socialistas o que é universal no sentido de valores como a igualdade, a liberdade, a democracia, o humanismo, e orientar o nosso programa, a nossa intervenção política não para enquadrar a sociedade em um modelo, mas ter uma sociedade que seja bem democrática. Nesse sentido a esquerda tem que reconstruir seus sonhos e suas utopias. Não significa voltar ao passado. Significa pensar este modelo que está em crise.

Informes - Então é o caso de manter a utopia, mas mudar o modelo?

José Genoino - Nós não temos que trabalhar mais com modelo econômico, nem com modelo de estado socialista. Nós temos que trabalhar com os valores. Isso não significa perder a identidade. Nós temos que atualizar a identidade diante das derrotas que o socialismo autoritário sofreu, diante da crise do projeto neoliberal, e construir novas utopias e novos sonhos. Diante dessa realidade a esquerda tem que mudar.

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