1982-2002

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A responsabilidade fiscal

Na última terça-feira, a Câmara dos Deputados aprovou a Lei de Responsabilidade Fiscal que obriga a União, Estados e Municípios a estabelecerem metas fiscais e define punições para os administradores que extrapolarem os limites de gastos. A bancada do PT, coerente com a prática de investimentos e gastos responsáveis que as administrações do partido vêm implementado, dispôs-se votar favoravelmente ao projeto desde que fosse estabelecido um acordo que removesse o seu enfoque fiscalista, o priviligiamento do pagamento de juros e a proibição de negociações de dívidas entre os entes federados. Insensível à negociação, o governo manteve inalterado o projeto que tende a prejudicar os investimentos sociais.

Nós entendemos que uma Lei de Responsabilidade Fiscal deve ter como objetivo central a criação de um padrão responsável de comportamento em relação aos gastos públicos levando em conta dois critérios: 1) a qualidade dos gastos, determinada pela finalidade das destinações dos recursos; 2) a busca de um equilíbrio entre receita e despesa. Exemplificando: no primeiro critério, quando o governo federal determina o socorro com dinheiro público a bancos quebrados está procedendo com um padrão irresponsável de gastos. Mas gastos em saúde, educação, infraestrutura etc., que visam o bem estar da sociedade e a potencialização da produção, são necessários porque atendem finalidades do poder público. Quanto ao segundo critério, nós sempre consideramos que a elevada dívida pública e os juros exorbitantes estão no centro das dificuldades da economia brasileira. Tanto o crescimento econômico quanto a eficácia governamental dependem, significativamente, de orçamentos públicos equilibrados. A Lei aprovada não tem no seu cerne estas preocupações: o seu viés fiscalista privilegia a geração de superávits primários através de um corte de despesas em todas as áreas, limitando-as por metas rígidas, sem levar em conta as finalidades do poder público. Na prática, o projeto impõe aos Estados e Municípios, o ajuste fiscal que a União vem praticando por condicionamento do FMI.

O segundo problema da Lei aprovada reside no privilégio que ela estabelece no pagamento de dívidas e juros em detrimento das áreas sociais. A Lei, a rigor, não estabelece nenhum limite de gastos para o pagamento dos serviços da dívida. Toda vez que as despesas ultrapassarem as metas, as operações de crédito para financiá-las estão vetadas, exceto aquelas destinadas a pagar juros. Todos sabem que grande parte das receitas públicas são gastas hoje no pagamento de juros altos determinados pela própria política econômica do governo. Assim, para o governo, os administradores públicos precisam ser responsáveis na limitação de gastos em áreas sociais, mas podem gastar o quanto for necessário para pagar juros. Nós, ao contrário, entendemos que no caso de escolha entre fornecer merenda escolar e pagar juros, o prefeito deve optar pela merenda escolar; entre construir um posto de saúde e dar dinheiro para banqueiro, é melhor o posto de saúde.

Para se ter uma idéia de como o enfoque fiscalista opera, em 1999, a dívida pública somou cerca de R$ 500 bilhões, 80% dela, interna, de curto prazo e com juros altos. O esforço fiscal do governo, baseado em aumento de impostos e em cortes de gastos, gerou o superávit primário recorde de R$ 30 bilhões. Só com juros e encargos da dívida foram gastos R$ 140 bilhões, parte proveniente do superávit primário e outra parte de emissão de títulos públicos (nova dívida a juros altos). O déficit nominal, desta forma, foi de R$ 110 bilhões.

O artigo 35 da Lei, proíbe a negociação de operações de crédito entre União, Estados e Municípios. Trata-se de uma limitação injustificável. Se os entes federados podem negociar com todos, com instituições privadas, com organismos internacionais etc., não há razão para proibir operações e negociações entre eles. A bancada do PT procurará melhorar a Lei na votação dos destaques. O governo, por sua vez, deveria estar preocupado em aprovar uma Lei de Responsabilidade Fiscal de caráter mais permanente, capaz de mudar hábitos e condutas equivocados no uso do dinheiro público. O imediatismo do governo pode estar criando uma lei efêmera, que cairá no descrédito, sem atingir o objetivo de mudar um dos principais males da cultura política brasileira: gastar irresponsavelmente os recursos públicos.

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